Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : Steven Spielberg

Spielberg volta ao filme de guerra, agora com Bradley Cooper
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Ana Maria Bahiana

O verdadeiro Chris Kyle…

…e Bradley Cooper.

Steven Spielberg vai voltar a um assunto que é tão constante em sua carreira quanto os extra-terrestres: a guerra.

Depois de muitas idas e vindas, inclusive um falso começo com o projeto Robopocalypse, que acaba de ir para a geladeira, Spielberg disse sim a American Sniper, uma adaptação do best seller autobiográfico do ex-Navy Seal Chris Kyle, considerado o franco-atirador mais preciso dos Estados Unidos, assassinado este ano por um veterano de guerra, numa galeria de tiro ao alvo.

Comprovando que sua carreira está mesmo em ascensão, Bradley Cooper já está escalado para o papel principal, colhendo os frutos da opção pelos direitos do livro, que desembolsou ano passado, já de olho no personagem. O roteiro é de Jason Hall (Jogando com Prazer e Paranoia, o novo filme de Robert Luketic), a produção é da DreamWorks com a Warner  e as filmagens estão marcadas para o início de 2014.

Para se concentrar em American Sniper, Cooper teve que deixar aquele projeto que está completamente coberto de urucubaca: Jane Got a Gun. Aquele no qual a diretora sumiu no primeiro dia de filmagem, e que perdeu talentos essenciais do seu elenco.Bradley tinha entrado no lugar de Jude Law, cujo contrato era vinculado ao de Lynne Ramsey, a diretora fujona…

Ano passado, na época do lançamento de Lincoln, Spielberg refletia sobre o poder da guerra como tema cinematográfico: “A guerra é a base de toda virada crítica na história da humanidade. Não sou obcecado com guerra _ tenho uma consciência muito clara do horror de qualquer guerra, ainda mais porque sou filho de um veterano da Segunda Guerra Mundial.”


Almoço do Oscar, 2013: a festa antes da batalha final
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Ana Maria Bahiana

O Presidente da Academia, Hawk Koch, põe Steven Spielberg no devido lugar na “foto de turma” dos indicados ao Oscar 2013.

Quando a Academia inventou o Almoço dos Indicados, 32 anos atrás,  a ideia era promover um congraçamento entre rivais, à sombra do inevitável: os votos já estavam lançados, os contadores faziam seu trabalho, nada mais podia ser mudado, por que não celebrar? Nas palavras da então presidente Fay Kanin, “ é apropriado que a Academia crie um evento que possa homenagear individualmente o talento de cada um dos indicados ao Oscar.”

Isso foi nas priscas eras de março de 1982,  antes das mudanças de data, antes da queda de audiência de shows de premios e, é claro, muito antes de internet, midias socias e etc.  Em 2013, o Almoço dos Indicados  está  quatro dias ANTES do encerramento dos votos – não vou jurar, mas me parece que é a primeira vez na história do premio que isso acontece—e cumpre outras funções.

A principal delas: aquecer o interesse de midia e do público. O Oscar  alterou todo o seu calendário mas continua sendo o último prêmio a ser entregue na temporada. Em outros tempos, isso era o equivalente a ser o show principal depois que um monte de bandas tinham aquecido a plateia. Numa era de informação abundante e constante como agora, estar no fim da temporada implica em ter que estar sempre lembrando que está vivo,  que é importante e que merece mais atenção do que, digamos, o mais recente video de gatos no You Tube.

As coadjuvantes: Sally Field, Amy Adams, Jackie Weaver, Anne Hathaway e Helen Hunt no Almoço dos Indicados

Não é a toa que, este ano, a Academia só não fez streaming do almoço (e acho difícil que algum dia faça – este é um dos poucos momentos de privacidade que esta elite de indicados tem durante todo o processo). Teve twitter, instagram, posts no Facebook e live blogging, focalizando bastante na presença das estrelas, detalhes do cardápio, piadas, pequenos incidentes.

 

Altos papos: Jennifer Lawrence e Hugh Jackman…

..Bradley Cooper e Christoph Waltz.

Não é a toa também que, ao contrário do que acontecia nas duas primeiras décadas do almoço, as estrelas – 17 dos vinte indicados nas categorias dramáticas!,  a Academia divulgou, orgulhosa–  compareceram em peso: este é o momento de re-aquecer também suas campanhas, lembrar ao público que, além de todos aqueles outros premios, eles estão no olho do furacão do maior de todos. E também , é claro- por favor votantes, não se esqueçam de mim.

E este também é o momento em que, ansiosamente, a cada vez maior comunidade de prognosticadores do Oscar tenta ler as entranhas da festa para lançar seus penúltimos pronunciamentos oraculares. A verdade é que os aplausos durante o almoço – no qual os indicados se levantam, um a um, para tomarem seu lugar na “foto de turma” que celebra  os escolhidos de cada ano – representam muito mais os gostos da midia presente do que os dos 6 mil votantes que, em sua maioria, não estão no International Ballroom do Beverly Hilton (ironicamente, sede dos Globos de Ouro), onde cabem, no máximo, 1.200 pessoas.

O que minha experiência me mostrou é uma ideia plantada na cabeça de alguém na hora certa pode acabar virando fato, mais adiante. Os estrategistas de campanha sabem disso muito bem e nunca tiveram uma janela mais perfeita do que esta – semear “tendências” de votos meros cinco dias antes do começo das votações!

Outra tradição do Almoço dos Indicados é o discurso dos produtores pedindo – sempre, sempre, sempre-  que os vencedores encurtem seus agradecimentos. Este ano as coisas estão indo mais adiante: os produtores Craig Zadan e Neil Meron estão investindo firme na ideia da “descontração”, e insistindo que os oscarizados não preparem discursos, sejam espontâneos, façam dancinhas, joguem beijos, chorem, tudo menos aquela lista que em geral começa com a esposa ou esposo e o agente, mais ou menos nessa ordem.

Este ano, além de descontração, talvez tenhamos um show a toda velocidade: durante o Almoço Zadan informou que ele e Meron passaram horas vendo tapes das festas anteriores do Oscar e chegaram à conclusão de que o evento tem muito tempo morto. “O show tem pausas demais quando nada acontece”, disse Zadan. “Cortamos todas elas para dar mais tempo para homenagear os indicados e vencedores. E, é claro, para os outros grandes momentos, como a homenagem a James Bond e os números musicais de Barbra Streisand, Norah Jones e Adele.”


Em fim de semana de definições, Argo toma a dianteira
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Ana Maria Bahiana

Ben Affleck aceita premios por Argo no PGA…

… e, 24 horas depois, por conjunto de elenco, no SAG

Encerrado este fim de semana de definições, duas coisas ficaram claras: já temos algumas dianteiras firmes na corrida do ouro 2013; e já sabemos quem será o quindim independentes da corrida do ouro 2014.

Ao mais imediato, primeiro: seja qual for a urucubaca/ confusão/ momento de privação de sentidos que fez com que a Academia esquecesse de indicar Ben Affleck na categoria Melhor Diretor, Argo já é o filme da vez na disputa 2013. Confirmando a escolha nos Globos de Ouro, duas semanas atrás, a Producers Guild of America, no sábado, e Screen Actors Guild, no domingo, escolheram Argo como seu melhor filme.

Matematicamente, não há como negar que o filme de Ben Affleck tem a vantagem: nesta etapa dos Oscars, toda a Academia vota em todos os premios; com 1.178 integrantes, o departamento de atores é o mais numeroso da Academia; com 462, o de produtores é o segundo mais numeroso.  Como praticamente todos os membros deste departamentos também são votantes em suas Guilds, só aí já está uma vantagem clara.

Mas há algo além da simples soma de possíveis votos no Oscar: para alcançar esta dupla vitória, Argo teve de convencer mais de 100 mil votantes das duas Guilds. Como bem lembrou um twitter de Steve Pond, o que impressiona cem mil pessoas de gostos e lealdades tão diferentes muito mais facilmente vai impressionar os seis mil acadêmicos.

Confirmada essa vantagem, Argo seria uma exceção na escrita da Academia, onde apenas filmes cujos diretores são indicados acabam levando o prêmio maior. Nessa área de sombra os fãs de Lincoln ainda torcem pela vitória mas quanto mais escuto os sons ao redor, mais me convenço que apenas Daniel Day Lewis, que também levou SAG e Globos, é uma certeza. Tommy Lee Jones (outro vitorioso do SAG) como coadjuvante e Steven Spielberg como diretor são possibilidades. As outras vantagens: Jennifer Lawrence para melhor atriz, Anne Hathaway (Os Miseráveis) como coadjuvante.

De todo modo, a briga este ano envolve grandes estúdios – a Warner de um lado, com Argo; a dobradinha DreamWorks/Fox de outro, com Lincoln. Depois de tantas vitórias, o time Weinstein este ano tem que se contentar com Jennifer Lawrence e talvez mais alguns biscoitinhos por O Lado Bom da Vida.

Mas não chore por eles, Brasil. A outra definição deste fim de semana veio no sábado também, com o encerramento do festival de Sundance. O grande vitorioso, de público e crítica, foi Fruitvale, um drama inspirado em fatos reais – o assassinato de um jovem negro por um policial, numa estação do metrô de Oakland, California, em 2008—escrito e dirigido por um jovem (26 anos) realizador estreante, Ryan Coogler, feito em regime cooperativo por uma bagatela, e, desde o começo do festival, o título mais quente da serra de Utah. A Weinstein Company, rapidamente, já comprou Fruitvale. Alô, 2014!

 

 


Heróis, vilões e o preço de ser humano: quatro lançamentos da temporada ouro
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Ana Maria Bahiana

Tanta coisa aconteceu nas últimas semanas por aqui que fiquei em super dívida com vocês… Aqui, os filmes que mais me impressionaram nesse tempo em que corri de um lado para o outro:

O conceito do presidente como herói/anti herói é comum na filmografia norte americana, atravessando praticamente todos os gêneros, do drama e thriller político à comédia romântica, rasgada e surreal (Marte Ataca!, por exemplo). É algo que dificilmente se imaginaria na produção de outros países, mas que faz sentido numa nação que elege presidentes há  237 anos, sem interrupções, ditaduras ou golpes militares.

Lincoln (em cartaz nos EUA, dia 25 de janeiro no Brasil) encontra Steven Spielberg em seu modo Amistad, refletindo sobre a história da nação norte americana, principalmente em uma de suas falhas fundamentais – a chaga da escravidão, e seus longos, dolorosos tentáculos até hoje.  Três elementos são o destaque do filme: o roteiro de Tony Kushner (Angels in America, Munique), veloz, erudito, incorporando tanto a complexidade do momento histórico (os momentos finais da Guerra Civil, a luta, no Congresso, para aprovar a lei que abole a escravidão) quanto o ainda mais complicado mundo interior do presidente; a fotografia espetacular de Janusz Kaminski, colaborador de fé de Spielberg; e o desempenho paranormal de Daniel Day Lewis como Abraham Lincoln.

Algo muito interessante aconteceu nesta colaboração: o roteiro de Kushner, centrado nos dilemas pessoais, sociais e políticos que, através de um grupo de pessoas – Lincoln, sua familia, seu braço direito William Seward (David Stathaim), o militante abolicionista Thaddeus Stevens (Tommy Lee Jones, genial) –  acabam impulsionando toda uma sociedade adiante, trava o impulso de Spielberg pela glamourização, pelo sentimental. E o calor passional de Spielberg ilumina e torna humano o que poderia ser um árido discurso sobre trâmites políticos na jovem nação norte-americana.

A notar: os igualmente ótimos desempenhos de Sally Field como Mary , esposa de Lincoln;  uma breve aparição de Joseph Gordon Levitt como Robert, seu filho mais velho; e James Spader, quase irreconhecível, como um antepassado de todos os lobbyistas que hoje  são a fauna mais comum de qualquer capital de Estado.

 Anna Karenina começou  como algo que, hoje, chamaríamos de novela: um folhetim encartado no periódico O Mensageiro Russo, suas oito complexas e generosas partes se estendendo de 1873 a 1877. Não é a toa que o que poderia se resumir a  um conto – mulher da alta sociedade da Russia Imperial, casada com influente político, tem um caso com um homem mais jovem e cai em desgraça —  tornou-se um vasto panorama da elite imperial, com um  15 personagens principais e mais um amplo sortimento de figuras secundárias.

Continuando seu ciclo de adoração cinematográfico-literária a Keira Knightley, Joe Wright (Orgulho e Preconceito,  Desejo e Reparação, Hanna) fez uma opção radical para sua adaptação do texto de Tolstoi: colocou  a maior parte de sua Anna Karenina (em cartaz nos EUA, dia 1 de fevereiro no Brasil) no interior de um velho (e lindo) teatro.

Como artifício dramático, é um espetáculo – Wright coloca os personagens de Tolstoi como elementos de uma grande performance pública, cada um representando seu papel no drama contínuo de uma sociedade altamente estratificada, dividida em classes hermeticamente fechadas. O artifício de transformar as coxias do teatro nas ruas de Moscou, a alta estilização da composição das cenas ( o balé dos burocratas, inspirado numa frase do texto de Tolstoi – “a burocracia é a alma da Russia”- é sensacional), o tom hiper-realista das caracterizações são empolgantes como estética.

O que se perde é a conexão emocional – Anna Karenina é uma obra linda mas fria, na qual o único ser humano parece ser o Karenin de Jude Law, atormentado entre a obrigação de agir de acordo com seu posto social e algo que pode ser, no fundo do seu coração, o pulsar de um afeto. Keira tem a estutura óssea de uma prima ballerina e a câmera está eternamente apaixonada por suas maçãs do rosto. Mas é talvez a mais gelada e distante de todos os lindos marionetes deste marzipan cinematográfico.

É um  sinal dos tempos: dois filmes se debruçam sobre a figura e a obra de Alfred Hitchcock. Um, feito para a TV (The Girl, de Julian Jarrold, para a HBO), ocupa-se de Hitch na época da realização de Os Pássaros; outro, com lançamento em circuito (Hitchcock, de Sacha Gervasi, estreia hoje nos EUA, dia 8 de fevereiro no Brasil) , é focado nos bastidores de Psicose.

E sabem qual é o melhor? O da TV. Jarrold preocupa-se em desconstruir a própria estética de Hitchcock e usar seus elementos para lançar luz nos vãos mais sombrios de sua alma, e Tobby Jones cria um Hitch de dentro para fora, organicamente e não como uma “personificação”.

Anthony Hopkins tenta fazer o mesmo em Hitchcock, mas, por incrível que possa parecer, a pesada maquiagem quase não deixa que ele trabalhe. Gervasi é um diretor simpático, responsável pelo delicioso documentário Anvil! The Story of Anvil. Mas me parece muito peso-leve para atacar um assunto complexo como Hitch. Trabalhando com um orçamento reduzidíssimo e apenas 35 dias de filmagem, ele criou um pequeno filme divertido que, ironicamente, teria sido mais apropriado para a TV.

Hitchcock oscila entre drama e comédia, aproximando-se da complicada mente do diretor mas temendo aprofundar-se em seu labirinto. Seus melhores momentos são os que comentam os eternos absurdos da indústria cinematográfica, a luta de Hitch para realizar seu projeto, as bizarras negociações com executivos e censores.

É interessante ver os dois lado a lado, em ordem cronológica – Hitchcock primeiro, The Girl em seguida. Alfred, o homem e o gênio, provavelmente não é nem nem outro.  Mas quem, décadas depois de sua passagem entre nós, pode ainda despertar tantas perguntas sem resposta?

E finalmente – eu não poderia deixar de comentar Skyfall.  O primeiro filme adaptado dos livros de Ian Fleming – 007 contra o Dr. No, de 1952 – trazia um conceito revolucionário no gênero “ação”: o espião como herói.  James Bond era um efeito colateral da guerra fria – até então, espiões, quando apareciam, eram sujeitos sórdidos, traiçoeiros, nada confiáveis. Um mundo em que conflitos passavam a ser, eles mesmos, secretos e indefinidos, abria espaço para que a atividade obscura fosse, enfim, heróica.

Mais de meio século depois, o impasse era: o que fazer com um ícone que já não parecia ter utilidade num mundo de guerras via bombardeios teleguiados, vírus pela internet e satélites-espião?

Trabalhando com um roteiro a três , mas principalmente do ótimo John Logan, Sam Mendes ataca o dilema de frente. Em suas mãos, o Bond de Daniel Craig é antes de mais nada um signo, um elemento dramático a ser composto como parte de lindos, elaborados panoramas visuais, de Xangai à Escócia. Humanos mesmo são o vilão Silva de Javier Bardem, e a extraordinária mãe-coragem M, de Judi Dench, lados opostos nessa dança mortal pelo controle de um mundo, na verdade, incontrolável.

 


A batalha pelas estatuetas de metal, parte I: presidentes, ayatolás e terroristas
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Ana Maria Bahiana

 

Vocês estão ouvindo esse silêncio? É o mes de agosto. Férias aí, férias aqui. Os estúdios descarregam seus abacaxis, e até os independentes dão um tempo. A Paramount está num descanso tão grande que deu férias coletivas a vários departamentos e há três meses não lança um filme.

De certa forma é a calmaria antes da tempestade. Assim que as temperaturas baixarem (o que aqui na California demora um pouco) e as crianças voltarem às aulas vai começar uma batalha pior que a disputa pelo Trono de Ferro _ a briga pelas Estatuetas de Metal.

Até agora o ano nos deu três filmes com grande potencial para chegarem até a batalha final: os independentes Moonrise Kingdom e Beasts of the Southern Wild e, é claro, O Cavaleiro das Trevas Ressurge. Falo deles num próximo post. Vamos dar uma olhada primeiro no que nos aguarda nos próximos meses.

Posso falar primeiro do que NÃO nos aguarda? A Warner decidiu relocar O Grande Gatsby para meados do ano que vem. Há quem diga que isto faz parte de uma estratégia maior para não dividir as atenções e recursos do estúdio em sua quixotesca missão de emplacar O Cavaleiro das Trevas ressurge pelo menos entre os indicados – e além das categorias técnicas, onde o filme de Christopher Nolan já é o favorito. Mas também pode ser porque Baz Luhrmann é famoso por se atrasar em pós-produção… A Fox até agora não esqueceu dos custos e demoras de Australia, que estourou todos os prazos e obrigou o estúdio a contratar um pequeno exército de montadores para que o filme conseguisse chegar às telas.

Descontado Gatsby—que tem pelo menos pedigree para entrar nas listas de candidatos a candidatos de 2013—o que temos?

Para começar, dois presidentes norte-americanos: o Lincoln de Steven Spielberg e o Roosevelt de Hyde Park on Hudson, de Roger Michell. Ambos  tem todo o pedigree de “isca de prêmio”. Daniel Day Lewis em mais uma transmutação paranormal para encarnar um dos presidentes mais adorados e carismáticos dos Estados Unidos, com Spielberg na direção. (Eco do passado: Amistad.) Bill Murray arriscando-se em mais uma nova direção, interpretando  Franklin Roosevelt, outro presidente querido, carismático e – votantes adoram isso!—deficiente físico, dirigido por Roger “Um Lugar Chamado Notting Hill” Michell. (Eco do passado: O Discurso do Rei.) O que esperar: indicações a melhor ator para os dois, no mínimo.

Continuando no tema azul-vermelho-e-branco, temos duas incursões pelas intervenções no Oriente Médio, ambas baseadas em casos reais: Argo, de Ben Affleck e Zero Dark Thirty, de Kathryn Bigelow.

Argo, de Ben Affleck

Affleck, vocês se lembram, teve aquela estreia bombástica com Gênio Indomável em 1997, emplacando supreendentes prêmios pelo roteiro. Ele vem se revelando um diretor seguro, que compreende o trabalho dos atores e tem uma visão propria. Argo tem produção de outro que votantes de prêmios amam, George Clooney, e se baseia numa dessas histórias tão incriveis que só podem ser verdadeiras – o plano mirabolante inventado por um agente da CIA (o próprio Affleck) para resgatar seis americanos refugiados na residencia do embaixador canadense, em plena revolução islâmica no Irã, em 1979. Bryan Cranston também está no elenco. Repetição do melhor coadjuvante Jeremy Renner de Atração Perigosa?

Zero Dark Thirty, de Kathryn Bigelow

Atravessando território muito parecido Bigelow tirou os Oscars de debaixo do nariz de James Cameron, três anos atrás. Zero Dark Thirty é, de muitos modos, Guerra ao Terror 2.0: a narrativa de como a tropa de elite Navy Seal Team 6 localizou e assassinou Osama Bin Laden em maio de 2011. É o tipo de filme arrancado das manchetes de jornais que se encontra mais facilmente nas TVs do que nos cinemas, e isso pode funcionar contra e a favor de Zero Dark Thirty, que por enquanto ninguém viu mas que já está criando zum zum.

Existe uma outra questão, também: filmes com essa temática não vão muito adiante no interesse das plateias – nem mesmo o ótimo Zona Verde, nem mesmo o premiado Guerra ao Terror quebraram essa barreira. Estou muito curiosa para saber o que vai acontecer com esses dois, tanto entre as elites que premiam quanto entre as massas que compram ingresso.

E isto é apenas o começo. Na segunda parte de nossa trilogia (é a moda, não é?), cantorias, fantasia e um mestre. Fiquem ligadas e ligados.

 


Almoço com as estrelas: palmômetro indica os favoritos?
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Ana Maria Bahiana

 

Glenn Close, Kenneth Branagh, Michelle Williams e Janet McTeer no almoço dos indicados.

Com menos de 20 dias até a grande noite do Oscar, e apenas duas semanas até a data fatal de entrega dos votos finais – 21 de fevereiro às 17h, horário de Los Angeles – 150 indicados lotaram o International Ballroom do Beverly Hilton ( o mesmo dos Globos de Ouro), nesta segunda feira, para seu tradicional almoço de confraternização.

Brad Pitt e George Clooney continuaram o papo iniciado nos Globos,  Rooney Mara confirmou que realmente fez piercing no seio para viver Lisbeth Salander, Tom Hanks deu instruções (via video) de como fazer discursos curtos e o presidente Tom Sherak anunciou que o Governors  Ball não terá cadeiras ou poltronas para “todo mundo poder cicular, em clima de festa e não de jantar formal” Felizmente Sherak anunciou que haveria “muita comida” disponível. É uma tradição, todos os anos, a fila de gente chique, de longo e smoking, na porta da hamburgueria In and Out, a algumas quadras do Kodak, depois de quatro horas de fome durante a cerimônia ….

Sergio Mendes, indicado para melhor canção por “Real in Rio”, não parecia preocupado com a possibilidade de apresentá-la no palco do Kodak (os produtores  Bria Grazer e Don Mischer estão planejando cortar todos os números musicais da evento). Sérgio pipocava de felicidade em voltar ao Oscar. Com seu grupo Brasil ’66, Sérgio interpretou indicada “The Look of Love”, de Burt Bacharah e Hal David no Oscar de 1968, e a  apresentação que catapultou-o para o topo das paradas e para o grande público norte americano. Agora, ele era todo sorrisos enquanto conversava com a turma de O Artista e saía atrás de seu ídolo, Steven Spielberg.

Close da turma de "formandos": Glenn Close, Jean Dujardin, George Clooney, Chris Columbus e Damian Bechir

Depois , como estudantes em dia de formatura, um a um os indicados foram chamados – em ordem alfabética do sobrenome – para receber seu certificado de indicação e juntar-se ao grupo da foto oficial da “turma de 2012”. Não se sabe se cansada de esperar pela letra “S” ou entediada com os outros muitos certificados que já tem, Meryl Streep deitou-se no topo da arquibancada do cenário da foto oficial esperando sua hora.

Martin Scorsese e Max Von Sydow em papo durante a sessão de fotos oficiais

E, num ritual que ganha popularidade a cada ano, os jornalistas presentes anotaram cuidosamente o nível de aplausos dos convidados para cada nome chamado. Constam as escritas que quem é mais aplaudido tem mais chances de levar a estatueta para casa…. O palmômetro 2012 deu picos para Max von Sydow. George Clooney, Brad Pitt, Gary Oldman, Jean Dujardin, Meryl Streep, Michelle Williams, Kenneth Branagh, Octavia Spencer , Glenn Close ,Viola Davis e, inesperadamente, Demian Bichir (Christopher Plummer não foi ao almoço).

Arrisque-se quem quiser…

A turma de 2012


Indicações ao Oscar, 2012: as gratas e ingratas surpresas
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Ana Maria Bahiana

E as indicações ao Oscar 2012, hein?

Antes de comentá-las é bom refrescar a memória explicando como elas são escolhidas.

Na etapa de indicações, apenas a categoria “melhor filme” é votada por todos os 6 mil acadêmicos. Todas as demais são escolhidas  ou pelos respectivos departamentos ou “branches” da Academia ou, no caso de  filmes estrangeiros, por um comitê de voluntários.

Portanto, se é verdade que o Oscar toma o pulso de Hollywood a cada ano (e eu estou entre os que acham que sim), os “melhores filmes” são os que mais claramente indicam isso. Os demais revelam o que atores, diretores, roteiristas, etc pensam de seus colegas.

É importante saber outra coisa sobre esses votantes: todos fazem ou fizeram cinema em suas vidas. Todos já trabalharam, trabalham ou querem trabalhar com quem está concorrendo. Muitos tem filmes concorrendo – e não apenas votam neles, mas por eles fazem campanha. Muitos tem admiração, inveja, amizade, rancor por quem está concorrendo. Todos trazem imensa bagagem pessoal e profissional para cada escolha.

E embora a Academia reúna grandes realizadores, atores, técnicos e executivos, a maior parte de seu corpo votante é de profissionais que ou nunca tiveram ou já passaram por sua fase áurea. Como exemplo eu lembro sempre de uma pitoresca festa de fim de ano, aqui em Los Angeles, onde absolutamente todos os convivas votavam em algum prêmio, e quase todos no Oscar. E onde ouvi de pessoas que não dirigiam ou produziam um filme há mais de 10 anos que Steven Spielberg e Martin Scorsese não sabiam contar bem uma história em imagens…

Enfim, somos todos humanos. Os deuses do cinema estão naqueles pulsos de luz que hipnotizam nossas retinas na sala escura, não entre os que preenchem cédulas de votos para prêmios…

Tendo dito tudo isso, acho que, este ano, alguns comitês e departamentos fizeram um trabalho muito melhor que outros. E muitos fizeram escolhas ótimas e terríveis ao mesmo tempo.

Não vou nem falar de filmes como meu querido Drive ou o igualmente sensacional Precisamos Falar Sobre Kevin, cujas chances de serem compreendidos pelo establishment hollywoodiano eram mínimas (pelo menos os técnicos de som se lembraram do quanto o filme de Nicholas Winding Refn sabe usar a trilha…). Mas falo, sim, de algo medíocre e forçado como Tão Forte e Tão Perto que conseguiu emplacar duas indicações, inclusive, justamente, melhor filme. Amo Max Von Sydow e acho que ele faz o que pode com um personagem artificial (como todos os outros do filme de Stephen Daldry) mas teria sido tão mais bacana e coerente ver Albert Brooks indicado ali para melhor coadjuvante por Drive…

Entre outras ausências notáveis (Tilda Swinton! Ryan Gosling! Michael Fassbender! Shailene Woodley! Projeto Nim!), fiquei chocada com a de Tintim e o Segredo do Licorne entre os filmes de animação (onde tinha até o fraco, fraco Gato de Botas). A animação de Steven Spielberg/Peter Jackson venceu o prêmio da Producers Guild mas não conseguiu empolgar os 343 votantes do departamento de curtas e animação da Academia (sim, eu também acho estranho que curtas e animação estejam juntos no mesmo departamento, mas enfim…) Meu palpite, parte 1: captura de desempenho realmente não passa pela garganta da Academia e 2. Spielberg não tem muitos fãs entre os animadores (o que não deixa de ser tristemente irônico, já que Spielberg é fã e incentivador de animação…)

Prefiro lembrar as gratas surpresas: Árvore da Vida com três indicações, inclusive melhor filme (o mesmo número de indicações, devo lembrar, de Harry Potter e as Reliquias da Morte parte II, embora as deste último sejam todas técnicas); Demián Bichir lembrado por seu ótimo trabalho no pequeno mas sincero A Better Life (crédito à influência das indicações da Screen Actors Guild); a presença de Nick Nolte e sua comovente composição do pai/treinador aos pedaços de Warrior; Pina, de Wim Wenders, lembrado pelo menos na esquisitíssima lista de documentários; A Separação entre os melhores roteiros originais (nos últimos dias da votação havia uma campanha cerrada para emplacar uma indicação tanto para roteiro quanto para diretor, além de filme estrangeiro. Estou feliz que uma delas deu certo…); e pelo menos um cheiro de Brasil com a canção de Rio (senti a falta dele entre as animações…)

Amanhã, um pouco mais sobre o que os Oscars e o que as indicações revelam do estado de coisas da industria, hoje.


E lá se vai 2011, parte II: o ano em que o cinema teve saudade do cinema
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Ana Maria Bahiana

Com o mercado norte-americano em franca depressão – este foi o pior consumo de ingressos de cinema em 16 anos –  e os grandes estúdios com o dedo colado no botão de pânico, este foi um ano de vacas anoréxicas. E onde, talvez não por acaso, o cinema teve saudade do cinema.

Aqui, os meus favoritos deste ano esquisito:

1. Drive, Nicolas Winding Refn. Um homem, um carro, o infinito labirinto urbano de Los Angeles. Uma pura experiência cinematográfica.

2. Os Descendentes, Alexander Payne. Laços de sangue, laços de terra. A exploração da familia como espellho de algo maior. Assim como…

3. A Árvore da Vida, Terrence Malick.  Desafiador, exasperante, embriagador. Outra pura experiência cinematográfica .

4. O Espião que Sabia Demais, Thomas Alfredson A claustrofobia da casa de vidro, num perfeito exercício de controle e interpretação.

5. Cavalo de Guerra, Steven Spielberg. Num filme deliciosamente à moda antiga, uma reflexão sobre a natureza da coragem.

6. O Artista, Michel Hazanavicius. Se tirarmos todos os artifícios que o cinema conquistou nos últimos 100 anos, o que resta? O poder da narrativa, se for tão boa como esta.

7. Meia Noite em Paris, Woody Allen.  Saber sonhar bem é positivamente mágico no melhor filme de Woody Allen em muito tempo.

8. Planeta dos Macacos-a Origem, Rupert Wyatt Há um lugar especial no meu coração para filmes que são mais inteligentes do que precisam. Este é um exemplo perfeito. Viva Andy Serkis!

9. Tudo pelo Poder, George Clooney. O jogo de intrigas atrás da luta pelo poder revelando, no fim das contas, apenas nossa humanidade.

10. As Aventuras de Tintin: O Segredo do Licorne, Steven Spielberg. Ah! Ter 10 anos de novo e experimentar a imagem em movimento como algo inédito!

11.  Rango, Gore Verbinski. Um diretor que nunca fez animação ataca o processo “fora da caixa” e os resultados são uma delícia.

12. Precisamos Falar Sobre Kevin, Lynne Ramsay. A sensacional atuação de Tilda Swinton ancora uma viagem aos infernos da relação entre mãe e filho.

13. A Invenção de Hugo Cabret, Martin Scorsese. Depois de muita perda de tempo chega-se ao puro coração mágico de uma verdadeira adoração ao cinema.

14. Pina, Wim Wenders. Corpo em movimento e imagem em movimento encontram-se num único gesto poético.

15. O Abrigo, Jeff Nichols. Se é para falar sobre o pavor da extinção da Terra, melhor a delicada, precisa visão deste filme indie, centrado nas atuações perfeitas de Michael Shannon e Jessica Chastain.

Menção especial:

Harry Potter e as Relíquias da Morte, parte II , David Yates. Por encerrar brilhantemente uma série de filmes que deixou bem claro que entretenimento infanto-juvenil pode e deve ser inteligente e de qualidade superior.


O mundo dos animais: Steven Spielberg e Cameron Crowe em busca do coração selvagem
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Ana Maria Bahiana

Se era preciso mais prova de que a safra 2011 do cinema tem saudade de sua infância e adolescência, Cavalo de Guerra, de Steven Spielberg (dia 25 de dezembro nos EUA, 6 de janeiro no Brasil) e Compramos um zoológico, de Cameron Crowe (23 de dezembro nos EUA e Brasil) seriam a prova final. Em ambos, seus realizadores buscam um estado de pureza, uma inocência desprovida do cinismo e amargura dos nossos tempos, apostam no potencial para nobreza e  coragem da natureza humana e usam animais como metáforas daquilo que ainda é possível salvar na humanidade.

Cameron Crowe é um diretor/roteirista com tanta fé no ser humano que seus filmes muitas vezes são tidos como “ingênuos”. É um risco que ele prefere correr para se manter fiel  a si mesmo e a uma linhagem de outros otimistas que o influenciaram e que ele admira : Frank Capra, Billy Wilder, François Truffaut. Seres humanos fazem muita besteira, os filmes de Crowe dizem (ecoando o espírito de seus ídolos) mas tem em si mesmos a capacidade de fazer por merecer sua redenção.

Em Compramos um zoológico – paráfrase de uma história verdadeira acontecida na Grã Bretanha – o herói improvável é o jovem viúvo Benjamin (Matt Damon), e o risco que ele decide correr é, como o título diz, comprar um parque zoológico decadente e ameaçado de fechar.

Benjamin e seus filhos (Colin Ford e Maggie Elizabeth Jones) ainda não se recuperaram inteiramente da morte da esposa e mãe, com a vida diária atropelando, em sua implacável rotina, os sentimentos profundíssimos de dor e perda irreparável de toda a familia. Lançar-se de corpo inteiro num projeto que parece completamente absurdo parece, num primeiro momento, uma dose gigante de anestésico. Mas o ritmo pausado da vida longe da cidade e a realidade de lidar diretamente com a natureza e a vida em estado puro, através dos animais do zoo, tem o efeito oposto : a perda absoluta se torna completamente real, para todos. E fazer as pazes com ela torna-se a única opção.

É um riff em cima de Momento Inesquecível, o filme de Bill Forsyth de 1983 que Cameron usou para guiar a interpretação de Damon. Nele, um executivo da indústria de petróleo encontra a si mesmo, sua consciência e a possibilidade da magia ao se ver num vilarejo remoto da costa da Escócia, sem nenhum dos artifícios de sua vida anterior.  Aqui, Benjamin e sua familia estão diante da vida em estado bruto, sem distração alguma que os separe de decisões realmente elementares e fatais.

Crowe povoa o zoo com  animais que espelham as emoções da familia e um grupo de figuras levemente excêntricas – entre elas sua própria mãe e Patrick Fugit, de Quase Famosos, sem muito o que fazer além de andar com um macaco no ombro. E dá ao Benjamin de Matt Damon um interesse romântico que não existiu na história real, e que se torna absolutamente irresistível na pessoa de Scarlett Johansson.

Como um show dos Rolling Stones, todo o filme parece estar sempre a um breve passo do caos, neste caso um caldeirão de melaço capaz de por o espectador em coma hiperglicêmica. E, como os melhores shows dos Stones, ele resvala pela borda do abismo sem cair nele , desafio que o próprio Crowe se impõe, quem sabe como exercício para  provar seus próprios “20 segundos de coragem absurda”, a frase-chave de Zoológico. Neste caso, a coragem de sentir plenamente, sem ironia e sem sarcasmo, correndo todos os belos riscos de um coração vivo e aberto.

Cavalo de Guerra ecoa outro tipo de filme, o épico em grande escala de David Lean e John Ford, e de certa forma o mesmo tema – a coragem e a possibilidade do coração aberto. Mas enquanto Zoológico é uma peça de câmara, Cavalo de Guerra é uma sinfonia para grande orquestra, com harpa e tudo.

Não é figura de linguagem: os primeiros 15 minutos de Cavalo de Guerra são apenas música – a maravilhosa trilha de John Williams – e a paisagem de Devon, na Grã Bretanha, contando a história do nascimento do potrinho que será herói de guerra.

É o primeiro toque para a espectadora/especetador do que realmente importa no filme: o cavalo e a terra. Os humanos, diminutos em suas batalhas entre si, seus planos de glória, sua crueldade, sua arrogância, são engolfados por algo mais antigo e maior que eles algo que, novamente, fala diretamente sobre o pulsar essencial da vida.

São os humanos que tomam as decisões da vida do potro alazão e lhe dão vários nomes ao longo da história (e é interpretado por vários cavalos, mas menos do que o costume em filmes assim; Spielberg queria “manter a personalidade individual” do personagem equino). Mas nenhum desses humanos é o protagonista desta história: a verdadeira coragem, o verdadeiro grande coração, são do cavalo, inexplicáveis e absolutos como são as coisas na natureza selvagem.  O que os humanos podem esperar – e o que acontece, episódicamente, ao longo do filme – é que tenham a graça de serem tocados por essa energia.

Como Crowe, mas numa escala maior, Spielberg é frequentemente acusado de sentimentalismo e de uma filmografia menor, inconsequente. São acusações das quais não compartilho e que são brilhantemente desmontadas por uma recente série de ensaios visuais do site Indiewire. Suspeito que uma grande parte desta cisma é que Spielberg, de novo como Crowe, recusa-se a ser cínico e a tratar emoções e sentimentos como coisas irônicas e triviais. Ele é essencialmente um humanista, correndo os riscos do que isso quer dizer numa sociedade fraturada.

Usando a espetacular fotografia de seu parceiro, o mestre Janusz Kaminski, Spielberg deixa a história do livro de Michael Morpurgo respirar em amplos espaços, grandes movimentos de câmera. É um filme gloriosamente à moda antiga, com efeitos reduzidos a um mínimo essencial, e que exige que a espectadora/espectador se entregue a ele sem reservas.

E, no final, a aventura vale a pena.