Blog da Ana Maria Bahiana

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E agora com vocês… os Oráculos do Oscar 2012!
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Ana Maria Bahiana

Foi uma batalha, entre os torpedos da “melhor montagem” e sucessivas contagens e recontagens noite adentro… Mas valeu: aqui estão, em toda a sua glória, os Oráculos do Oscar 2012! Palmas para eles!

(Dê “refresh” regularmente- novos nomes serão acrescentados à medida em que eles aparecerem aqui neste Hollywood & Highland virtual…)

Fazendo honra às oráculos da antiga Grécia, Nathally da Silva Carvalho, 25 anos, de Macaé, RJ,  foi a única mulher na tropa de elite dos acertadores. Cinéfila desde a adolescência, Nathally estuda Ciências Sociais na Uenf.

Sou cinéfila desde o começo da minha adolescência, quando minha percepção se tornou mais aguçados para a sétima arte: queria saber mais sobre os atores, suas filmografias, os diretores, e como os filmes eram feitos.

A partir de então comecei a pesquisar sobre a indústria, a alugar 4, 5 até 6 filmes por fim de semana e a ver com as grandes premiações como o Globo de Ouro e o Oscar. Fiquei muito feliz em saber que estou entre os Oráculos 2012. Fiz minhas apostas observando muito as críticas, (principalmente as categorias ‘bombas’ como documentário e curta), já que não tive muito tempo para ver os filmes indicados esse ano. Como disse uma grande amiga, acho que meus 20 acertos são creditados muito a um misto de sorte, instinto e conhecimento sobre o Oscar (muito pelas dicas que a própria Ana dá, todos os anos, de como são os mecanismos de votação). Acho que meu grande trunfo esse ano foi apostar sem ressalvas na Meryl Streep como Melhor Atriz, tinha certeza que esse ano era dela!

Gostaria de agradecer a Deus pela dádiva de ser uma cinéfila; a Ana pela oportunidade de exercitar minha paixão pelo cinema, não só vendo – e lendo sobre a sétima arte, mas também participando do Oráculo do Oscar; agradeço a Jairo Souza meu grande amigo cinéfilo, com quem troco grandes experiências e dicas sobre cinema e séries (minha vitória é sua também!) e agradeço a Nathália Fernandes que acompanhou a noite do Oscar comigo, via internet, e vibrou com cada acerto meu. Agradeço a todos os grandes homens e mulheres da indústria, que trabalham com afinco para trazer um mundo de sonhos, reflexões e aprendizado para todos aqueles que se propõem a ver no cinema muito mais do que algumas horas de diversão.

Parabéns a todos os outros oráculos de 2012, e que 2013 tenha uma safra de filmes encantadoramente surpreendentes.”

 

 

O advogado Francisco de Assis Nóbrega, 28 anos, é recifense mas mora em Caruaru, PE, onde é Defensor Público Federal.

“Desde criança adoro ir ao cinema e colecionar filmes. Antes videoteca, atualmente DVDoteca, tenho filmes de todos os gêneros, estilos e nacionalidades, atualmente são mais de 600 títulos. Vidrado no Oscar, desde o ano 2000 organizo um bolão para amigos e faço uma pequena festa para receber os mais cinéfilos e loucos pelo Oscar feito eu, já é tradição! A estatueta em miniatura ao lado da TV dá o toque especial da festa! rs Após chegar perto em várias edições, estou muito feliz em ser um dos oráculos deste ano! Muito obrigado por organizar com tanto carinho o oráculo!”

Lucas Lôbo Takahashi é, na verdade, colega de Angelina Jolie  e George Clooney : todos eles trabalham para a mesma entidade,a Agência para Refugiados das Nações Unidas. A diferença principal é que Lucas está em Brasilia,DF, onde também estuda Relações Internacionais.

Eu nasci e cresci em uma cidade pequena, que não tinha cinema. Quando eu ia pra capital, assistia quatro ou cinco filmes no mesmo dia, e nunca me cansava. Sempre fui apaixonado por cinema, e o Oscar era umas das únicas maneiras de ter contato com aquele mundo, em uma época em que internet não era tão popular. Assim, vejo a cerimônia desde os sete ou oito anos, e nunca deixei de ver. Por isso, mesmo depois ter deixado de achar que o Oscar é um parâmetro de qualidade, eu ainda me importo com ele. E ganhar esse bolão e todos os brindes que você está dando me traz muito satisfação!  Obrigado! Espero lhe conhecer um dia!

Eduardo Azeredo Salgado, 31 anos, de Pindamonhangaba, SP, trilha o caminho de muitos realizadores ilustres: desde os 14 anos trabalha numa locadora de filmes. E mesmo não tendo cinema na cidade, não perde sua paixão pela Sétima Arte:

“Cinema sempre fez parte da minha vida, a primeira lembrança que tenho de ver um filme quando criança foi o filme A Missão com meus pais e de lá pra cá essa paixão pela Sétima Arte só aumentou. Por isso já faz muito tempo que vejo o Oscar e dou meus palpites, que desta vez deram resultado!”

Rodrigo Santiago,  23 anos, doutorando de Ciência Política em Recife,PE, é fã de Meryl Streep… e de Bette Davis também.

“É um prazer ser um Oráculo 2012! Há algum tempo, as atuações da Bette Davis e da Meryl Streep fizeram-me ver o cinema como uma forma de arte que vai além do entretenimento. A força das atuações dessas atrizes, bem como a direção e filmes do Ingmar Bergman, transformaram-me em um ávido apreciador da sétima arte. A partir do momento que tive contato com essas figuras, em especial, tornei-me um leigo que busca ler sobre a temática e, que de vez em quando, arrisca escrever algumas críticas sobre películas. Acho que essa bagagem, juntamente, com o acompanhamento das temporadas de premiação ajudaram a alcançar esse posto (o que não é fácil, principalmente, quando se tenta prever as categorias técnicas, documentários e curtas). Em síntese, eu agradeço ao cinema, por ele ser capaz de transformar a fantasia em realidade, e, ao mesmo tempo, mostrar as várias facetas do caráter humano. O cinema, quando nos faz refletir, cumpre o seu objetivo mais fundamental enquanto arte, ele propicia ao espectador o sentimento de estar vivo. “

Rafael Susin Baumann, 19 anos, estudante de arquitetura em Caxias do Sul, RS, participou pela primeira vez do Oráculo e já saiu na dianteira:

“Gostaria de lhe agradecer pela oportunidade, agradecer a aqueles que ainda suportam ir ao cinema comigo e, claro, agradecer a todos que tornam o cinema algo possível. Desde os 9 anos lembro de ir atrás de informações relacionadas ao cinema, principalmente comprando revistas relacionadas ao assunto. As idas à locadora e ao cinema tornaram-se frequentes e comecei a fazer uma lista com todos filmes que assistia (e até hoje não deixei de marcar). Aos poucos, já não havia mais lançamentos para alugar e comecei a ir atrás do cinema de verdade. Foi aí que descobri diretores como Hitchcock (meu favorito). Assim, o cinema tornou-se indispensável.  Não lembro exatamente a partir de que ano comecei a acompanhar o Oscar, mas lembro perfeitamente de Chicago ganhando como melhor filme (e tenho que admitir, não considero uma injustiça como a maioria acredita ser). Quanto ao Oscar desse ano, a maior surpresa da noite para mim foi montagem para Millenium. Uma mistura de satisfação (por ser realmente o filme merecedor do prêmio, e, na verdade, merecia uma indicação para melhor filme) e tristeza (por ser um ponto a menos nas apostas). Foi difícil conciliar favoritos com as apostas na hora da torcida, mas, fiquei satisfeito principalmente com roteiro para Meia-Noite em Paris, Rango como animação e os prêmios para Hugo.”

 Lucas Mateus, 27 anos, é pedagogo em Natal, RN e não perde uma premiação desde que Steven Spielberg ganhou com A Lista de Schindler:

É uma honra poder ter superado tanta gente boa no Oráculo do Oscar 2012. Acompanho a festa do Oscar desde criança, nos tempos em que Steven Spielberg ganhara seu tão aguardado prêmio de Diretor em 1994 por Schindler’s List. Desde então, não tenho perdido uma premiação, sempre testemunhando as vitórias e as injustiças que fazem parte do espetáculo. Acredito que o cinema seja a forma de arte que melhor retrata uma era da sociedade e o Oscar expõe, de alguma maneira, essas transformações que nós protagonizamos de tempos em tempos.”

Rafael Melo Feitosa, 23 anos, é carioca e blogueiro:

“É clichê, mas palavras não podem definir a minha relação com o cinema. É algo extremamente sensorial e que existe desde que me entendo por gente. O Oscar tem, para mim, a importância de uma Copa do Mundo. Sinto-me envolvido como se fizesse parte da indústria cinematográfica… torço, vibro, reclamo, discordo. Meu obrigado: à minha mãe por ter me apresentado ao Oscar quando eu tinha 7 anos; aos cineastas brilhantes que mantêm sempre acesa a minha paixão pelo cinema; e àqueles que disponiblizam os filmes na Internet, que fazem com que a cultura não tenha mais barreiras e que nos possibilitam assistir a todos os indicados. E, claro, muito obrigado à Ana Maria Bahiana por nos propiciar essa promoção espetacular com prêmios maravilhosos.


Semana do Oscar: como funciona a cabeça dos votantes?
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Ana Maria Bahiana

Mr.Oscar chega ao Hollywood/Highland. Foto de Richard Harbaugh/AMPAS

Os Oscars foram criados para “destacar e honrar qualidade e excelência na arte cinematográfica”. Junte três pessoas e peça que cada uma defina “qualidade e excelência”. Agora junte 6 mil.

Pois é.

Não é possível fazer um estudo estatístico preciso sobre o que os votantes do Oscar –em sua maioria homens brancos com mais de 50 anos, semi-aposentados, como se viu ontem – pensam quando escolhem os vitoriosos, mas alguns traços aparecem com clareza durante os mais de 80 anos do prêmio:

1. Complexo de inferioridade. Há anos digo isso e fiquei feliz ao ver o Los Angeles Times concordar comigo _ a Academia prefere sempre o que menos se parece com aquele filmão feito em massa, especificamente para atender o mercado. É um estranho processo de baixa auto-estima que funciona mais ou menos assim: adoramos ganhar tubos de dinheiro com um monte de filmes mais ou menos, mas sabemos que a maioria deles não presta mesmo; portanto, qualquer coisa que não seja este modelo tem que ser premiado.

Ou seja: tem filme “pra ganhar dinheiro” e filme “pra ganhar prêmio”. As duas coisas ao mesmo tempo… aí complica.

Isso explica a  aversão a comédia, ficção científica e fantasia e a cisma com diretores que trafegam com grande facilidade entre o comercial e o artístico, como Steven Spielberg e Christopher Nolan: seu trabalho bate de frente com a percepção de que há algo profunda e essencialmente errado em fazer um filme sobre, digamos, um extra terrestre perdido na Terra ou um milionário que se torna super herói, e querer que ele seja reconhecido como algo mais além de uma fonte de  dinheiro. Spielberg só conseguiu vencer esse preconceito com A Lista de Schindler (leia o item 3). Nolan…. Acho que vai ter que esperar mais um pouco.

 2. Anglofilia. Um desdobramento comum do complexo de inferioridade é achar que, em princípio, qualquer coisa feita na Grã Bretanha é melhor do que qualquer coisa feita em qualquer outro lugar do mundo, especialmente nos Estados Unidos. Isso explica porque Carruagens de Fogo bateu Indiana Jones (um filme pipoca! E de Spielberg!) em 1981, O Paciente Inglês derrotou Fargo em 1996, a vitória de Shakespeare Apaixonado em 1998 (e Judi Dench levando um Oscar por cinco minutos de tela) etc etc etc. Este ano Sete Dias com Marilyn , se produzido nos EUA, seria talvez um bom filme de TV sem maiores ambições. Mas é britânico! Com Kenneth Branagh! E Judi Dench! Como vamos ignorá-lo?!

3.Fixação com o Holocausto. Aqui o sempre agudo J. Hoberman apresenta uma estatística impressionante nos Los Angeles Times: nos 83 anos do Oscar 20 filmes indicados tinham o Holocausto como tema e pano de fundo; apenas dois não converteram em estatueta a indicação. Este ano, preparem-se : A Separação é o filme a ser batido na categoria filme estrangeiro. Mas abram o olho para In Darkness, de Agniezska Holland, sobre judeus poloneses refugiados nos esgotos da cidade de Lvov. Até porque, no passado, Holland dirigiu um dos dois filmes sobre o Holocausto que foi indicado mas não levou _ Colheita Amarga, de 1985.

4. Saudosismo. É curioso como um prêmio que nasceu destacando o ousado – Asas, um filme adiante de seu tempo em muitos níveis – rapidamente começou a ter saudade de tudo. Culpe-se a chacoalhada dos anos 1970 e da geração sexo drogas e rock n roll? A engorda do blockbuster nos anos 1980-90? O fato é que, desde Titanic, tudo o que lembra “os  bons tempos” àqueles senhores brancos de meia idade cai no paladar. A ideia de que “os filmes eram melhores naquela época” é uma fantasia que põe os votantes num estado de transe…. E este ano vai premiar, pela primeira vez na história, uma produção da França… onde o cinema começou. Salut, Lumiére!


E lá se vai 2011, parte II: o ano em que o cinema teve saudade do cinema
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Ana Maria Bahiana

Com o mercado norte-americano em franca depressão – este foi o pior consumo de ingressos de cinema em 16 anos –  e os grandes estúdios com o dedo colado no botão de pânico, este foi um ano de vacas anoréxicas. E onde, talvez não por acaso, o cinema teve saudade do cinema.

Aqui, os meus favoritos deste ano esquisito:

1. Drive, Nicolas Winding Refn. Um homem, um carro, o infinito labirinto urbano de Los Angeles. Uma pura experiência cinematográfica.

2. Os Descendentes, Alexander Payne. Laços de sangue, laços de terra. A exploração da familia como espellho de algo maior. Assim como…

3. A Árvore da Vida, Terrence Malick.  Desafiador, exasperante, embriagador. Outra pura experiência cinematográfica .

4. O Espião que Sabia Demais, Thomas Alfredson A claustrofobia da casa de vidro, num perfeito exercício de controle e interpretação.

5. Cavalo de Guerra, Steven Spielberg. Num filme deliciosamente à moda antiga, uma reflexão sobre a natureza da coragem.

6. O Artista, Michel Hazanavicius. Se tirarmos todos os artifícios que o cinema conquistou nos últimos 100 anos, o que resta? O poder da narrativa, se for tão boa como esta.

7. Meia Noite em Paris, Woody Allen.  Saber sonhar bem é positivamente mágico no melhor filme de Woody Allen em muito tempo.

8. Planeta dos Macacos-a Origem, Rupert Wyatt Há um lugar especial no meu coração para filmes que são mais inteligentes do que precisam. Este é um exemplo perfeito. Viva Andy Serkis!

9. Tudo pelo Poder, George Clooney. O jogo de intrigas atrás da luta pelo poder revelando, no fim das contas, apenas nossa humanidade.

10. As Aventuras de Tintin: O Segredo do Licorne, Steven Spielberg. Ah! Ter 10 anos de novo e experimentar a imagem em movimento como algo inédito!

11.  Rango, Gore Verbinski. Um diretor que nunca fez animação ataca o processo “fora da caixa” e os resultados são uma delícia.

12. Precisamos Falar Sobre Kevin, Lynne Ramsay. A sensacional atuação de Tilda Swinton ancora uma viagem aos infernos da relação entre mãe e filho.

13. A Invenção de Hugo Cabret, Martin Scorsese. Depois de muita perda de tempo chega-se ao puro coração mágico de uma verdadeira adoração ao cinema.

14. Pina, Wim Wenders. Corpo em movimento e imagem em movimento encontram-se num único gesto poético.

15. O Abrigo, Jeff Nichols. Se é para falar sobre o pavor da extinção da Terra, melhor a delicada, precisa visão deste filme indie, centrado nas atuações perfeitas de Michael Shannon e Jessica Chastain.

Menção especial:

Harry Potter e as Relíquias da Morte, parte II , David Yates. Por encerrar brilhantemente uma série de filmes que deixou bem claro que entretenimento infanto-juvenil pode e deve ser inteligente e de qualidade superior.


Drive, Moneyball: celebrando a solidão do herói
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Ana Maria Bahiana

 

Devo, não nego, um apanhado dos primeiros lançamentos da temporada-ouro. Comecemos por aqui:

“Existem 10 mil ruas nesta cidade e eu conheço todas elas “, diz a narração off. “Eu dirijo. Não carrego armas, não participo de nada. Dou a você duas horas. O que acontece nessas duas horas é responsabilidade minha. O que acontece antes e depois, eu não quero  saber.”

A voz é do anônimo motorista/dublê vivido por Ryan Gosling em Drive, o excepcional filme que marca a estreia do diretor dinamarquês Nicolas Winding Refn numa produção norte-americana (ainda que independente, cortesia da Film District, divisão da GK Films).

Drive começou como um belo livro  de James Sallis, um expert no neo-noir que explora a evolução do crime sob o sol de California, Arizona, Nevada, nas décadas depois da sacramentação do gênero. Na adaptação magistral de Hossein Amini (Paixão Proibida, Asas do Amor), cenário, tramas e personagens foram depurados e concentrados: tudo se passa agora entre uma oficina mecânica, um prédio modesto e uma pizzaria , com um set de filmagem e uma loja de penhores no meio, entre as 10 mil ruas do vasto, complicado município de Los Angeles.

Numa feliz sincronicidade que pode ser obra tanto do acaso quanto de intensa colaboração, o motorista sem nome de Ryan Gosling é a soma perfeita de todos os heróis/antiheróis da obra de Refn: lacônico, contido, seu mundo interior, emocional, trancado a mil chaves e só percebido por mínimos gestos, expressões, olhares.

Refn, que não conduz (porque foi reprovado várias vezes na prova de direção), foi escolhido pessoalmente por Gosling, fã de seu trabalho e do livro de Sallis. Depois de um primeiro encontro desastroso – Refn, gripadíssimo, passou mal à mesa – uma carona de Ryan e uma longa conversa on the road cimentaram a colaboração para criar o protagonista, absolutamente central à história. Nas palavras de Refn, “um homem que se define pelo que faz _ no caso, dirigir.”

Exemplo perfeito: a sequencia de abertura, um primor de fotografia, som e montagem, onde, sem diálogo, passamos a saber tudo sobre o personagem de Gosling, enquanto ele pratica, brilhantemente, seu segundo emprego _ pilotar carros de fuga para grandes roubos. Seu primeiro emprego é motorista-dublê em filmes, o que imediatamente cria uma interessantíssima justaposição de ficção e realidade, tão perfeita tradução de Los Angeles.

O gradual envolvimento com uma vizinha – Carrie Mulligan, excelente – leva nosso anti-herói a um “trabalho” especialmente arriscado, que vai abalar todas frágeis cadeias de seu pequeno mundo: a oficina mecânica do seu mentor – o sempre extraordinário Bryan Cranston, no avesso do seu Mr. White de Breaking Bad – e Nino (Ron Perlman) e Bernie (Albert Broks, absolutamente sensacional) os donos da pizzaria e investidores do seu possível novo projeto, um espetáculo ambulante de stunts.

Refn dirige Drive com o rigor e a clareza de olhar que são a marca do seu trabalho, referenciando as raízes inteligentes do filme de ação – Acossado, Operação França, Bullit – mas traçando seu próprio risco, um ambiente ao mesmo tempo intensamente real e estilizado, onde cada gesto, cada luz e cada sombra tem significado (e aqui, palmas à parte para a fotografia e Newton Thomas Sigl).

Absolutamente imperdível.

Drive está em cartaz nos EUA e ainda sem data de lançamento no Brasil.

 

É possível ver um filme lindamente dirigido, superbem escrito e com grandes desempenhos de bons atores e não se sentir investida emocionalmente nele nem por um segundo? Deve ser, porque foi o que aconteceu comigo em Moneyball.

Dirigido por Bennett Miller (Capote), Moneyball traz outro herói solitário e de poucas –mas boas- palavras: Billy Beane (Brad Pitt, bem escolhido e desempenhando à altura), cartola do time de beisebol Oakland Athletics que, em 2002, cansado de ver o time nadar, nadar e morrer na praia, abandonou os métodos tradicionais de escalação e, com a ajuda de um nerd formado em economia (Jonah Hill, ótimo), passou a escolher jogadores através de um software que leva em conta as estatísticas de desempenho de cada um.

É uma história verdadeira, contada no livro de não-ficção de Michael Lewis e  adaptada maravilhosamente pelos craques Steve Zaillian e Aaron Sorkin. Como em outro filme escrito por Sorkin – A Rede Social – e de certa forma como em Drive, Beane é um herói solitário andando contra a corrente, buscando apenas em si mesmo a força necessária para prosseguir.

Miller, fiel às suas origens como documentarista, mistura material documental com o filme em si, e enquadra com enorme inteligencia cada tomada, situando Beane em seu mundo e abrindo espaços para seu fugidio mundo interior – como o do anti-heroi de Drive, um mundo secreto, contido, nascido das frustações de quem foi jovem e brilhante atleta, e abriu mão dos estudos por uma carreira curta e brutal.

E com tudo isso…. Jamais consegui me conectar com o filme. Por que? Como muitos de vocês, nasci e me criei num universo onde o futebol era a língua-mãe. Entendo absolutamente nada de beisebol, e seu eco emocional, passional – abordado com tanta precisão em Moneyball – me escapa completamente. E beisebol, acima de qualquer outra coisa, é o coração, a essência de Moneyball. Se você conhece e gosta, não perca. Senão… não sei.

Moneyball estreia hoje nos EUA e 18 de novembro no Brasil.


Na Academia, uma aventura pelo avesso do cinema
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Ana Maria Bahiana

Uma das coisas que mais me emociona no cinema é sua mistura em partes iguais de alta tecnologia e puro artesanato, indústria de larga escala e ofício manual, orgânico, simples.  Um dos maiores privilégios deste meu trabalho de observadora é justamente poder acompanhar de perto essa fusão mais que centenária, essa profusão de criatividade, improviso, acrobacia e engenharia que, como  sabem os grandes, – de Meliés a Fellini, de Griffith a Scorsese – tem em seu coração algo de circense.

Começa nesta sexta feira na Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, aqui em Los Angeles, uma exposição que captura plenamente essa magia: Crew Call, reunião de 115 fotos de cena realizadas por 25 integrantes da Society of Motion Picture Still Photographers focalizando exatamente o trabalho que, se for bem feito, ninguém jamais vê: o das equipes de técnicos, artesãos e especialistas, os operários da indústria do sonho.

Por exemplo:

 

Fazendo Brandon Routh voar em Superman –O Retorno, de Bryan Singer. Foto de David James.

 

Almoço em família com claquete no set de uma cena fundamental de Touro Indomável. Foto de Brian Hamill.

 

Dando um banho de chuva em Owen Wilson no set de Dois é Bom, Três é Demais. Foto de Melissa Moseley.

 

Uma aventura náutica no set de Zé Colméia- O Filme. Foto de Phil Bray.

 

Tiffany e seus amigos no set de O Filho de Chucky. Foto de Rolf Konow.

 


No adeus de Harry Potter, o poder da vida e a magia do cinema
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Ana Maria Bahiana

 

 

A morte e os mortos tem um papel de destaque no derradeiro Harry Potter, parte II do último livro da saga concebida por J.K.Rowling, Harry Potter e as Reliquias da Morte. É um tema apropriado para o fim de um ciclo, a jornada de  mais de uma década de um herói que influenciou e povoou os sonhos de uma geração.

Como algumas gerações anteriores – as que cresceram à sombra do ciclo O Senhor dos Anéis, de J.R.R. Tolkien, obra que com certeza é uma influência no trabalho de Rowling – os contemporâneos da jornada de Harry foram levados a debater a importância das escolhas individuais, o sentido da amizade e da lealdade e, em última análise, a natureza do bem e do mal. Como Frodo em Senhor dos Anéis, Harry não é excepcionalmente forte, inteligente ou poderoso _ seu destino foi selado pela mão do acaso, e sua natureza heróica deve ser provada ou rejeitada pelas opções que fará nas encruzilhadas de sua trajetória. E, como Frodo, seu chamado não é para obter algo, mas para destrui-lo: a recusa de um tipo de poder para que se possa, amplamente, abraçar seu avesso.

Todos esses temas estão expressos e sintetizados em Harry Potter e As Relíquias da Morte – parte II, fecho perfeito para o ciclo de  oito filmes que, consistentemente, adaptou a obra de Rowling para a tela. Alguns foram melhores que outros,  mas mesmo o primeiro, Harry Potter e a Pedra Filosofal, que hoje parece ainda mais tosco, tem o mérito de ter escalado, brilhantemente, o elenco essencial que deu corpo a Harry, Ron, Hermione, seus colegas, adversários e mestres.

Reliquias II pode ser lembrado como um dos melhores. Mais uma vez, fãs do texto de Rowling podem estranhar as simplificações e liberdades que Steve Kloves –roteirista de sete dos oito filmes, escolhido pessoalmente pela autora – tomou com a obra. Mas é sempre bom repetir o mantra: livro é livro, filme é filme.

O essencial- o confronto entre Harry e Voldemort, que é, basicamente, o encontro de Harry com seu destino – precisa ser expressado visualmente dentro de um período limitado de tempo. Imagens e gestos precisam ser conjurados para concretizar o que, na página, são descrições e adjetivos.

Kloves e o diretor David Yates – que se desincumbiu bravamente dos quatro últimos títulos da série – ancoraram o episódio final de Harry Potter numa série de sequências de ação empolgantes, um contraste com o ritmo mais lento da primeira parte: a invasão das caixas fortes do banco Gringotts, o ataque a Hogwarts, o confronto final entre Harry e Voldemort.

O clima aqui é de urgência e resolução – com um poderoso interlúdio na estação de King’s Cross do metrô de Londres, perfeito em espírito e realização, que ilustra bem um outro ponte forte da série, a integração excepcional entre desenho de produção, fotografia e efeitos.

Este talvez seja o mais emotivo de todos os Harry Potters, provando o quanto vale a qualidade de um elenco de primeira linha, encabeçado por mestres como Alan Rickman (Severus Snape), Ralph Fiennes (Voldemort) e Michael Gambon (Dumbledore).

E no final estamos de volta a Hogwarts, encerrando um ciclo e começando outro, como a vida, que se estende sempre além da morte.

Precisava ter sido dividido em duas partes? Provavelmente não. Precisava ser em 3D? A não ser para espectadores que realmente apreciam cobras avançando em sua direção e objetos mágicos voando sobre as poltronas, não faz muita diferença. A magia de Harry Potter é obra de suas ideias e não de seus truques.

Harry Potter e as Reliquias da Morte Parte II teve pré-estreia  dia 7 na Grã Bretanha e entra em circuito mundial a partir de 14 de julho. Nos EUA e no Brasil,a estréia é dia 15 de julho.

 

 


Super 8: brincando nos campos do Senhor Spielberg
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Ana Maria Bahiana

A primeira coisa que você precisa saber sobre Super 8, de J.J. Abrams, é que é necessário suspender MUITO a descrença. Cartesianos super racionais talvez prefiram poupar o dinheiro do ingresso, o que seria uma pena, porque o filme é uma delicia. Se resolverem correr o risco, lembrem-se do meu aviso: não comecem a se perguntar “mas como?”, “como é que é?”, “como é possível?” e coisas do tipo.

A segunda coisa é que, como bem disse este crítico, Super 8 é “pornô Spielberg”: uma citação explícita, reverente, salivante, hard core de temas, imagens e signos spielberguianos.

Tem gente torcendo o nariz para isso, mas não me incluo nesse bloco. Tenho outros problemas com Super 8 _ a gigantesca quantidade de fé na premissa que nem sempre é recompensada nem com a lógica interna do roteiro; o final meio apoteose em fúria, jogando no liquidificador todos os possíveis e imagináveis elementos fantásticos de uma história que já estava implorando por um pouquinho mais de lógica.

Mas cultuar o (aliás produtor) Spielberg não é um desses problemas. Gosto sempre de lembrar que os humanos das cavernas foram  provavelmente os únicos com direitos exclusivos à originalidade absoluta. Nas artes populares contemporâneas saber escolher as referências é uma parte importante da qualidade final. Afinal, a geração de Spielberg (e Lucas, e Coppola, e Scorsese, e Friedkin) achava que estava fazendo seu próprio culto a Truffaut, Godard, Clouzot, Antonioni e Kurosawa ( e os Beatles e Rolling Stones tinham certeza de que sua música era i-gual-zinha a dos grandes mestres do blues dos anos 1940 e 50…)

Muito natural, portanto, que Abrams vá direto à veia da Geração 70, pegando como inspiração uma frase de uma entrevista de Coppola dos anos 1980 sobre o futuro do cinema – “algum dia alguma garotinha gorducha do Ohio vai ser o próximo Mozart e fazer um filme lindo com a camcorder de seu pai”-  e saturando sua premissa com o cânon spielberguiano.

Em Super 8 um garoto gorducho do Ohio faz um filme, não necessáriamente lindo,  com a super 8 do pai dele. E esta é, na verdade, a melhor parte da película de Abrams. O garoto  Charles (Riley Griffiths) é.. bem… o DW Griffith de uma turminha de moleques (Joel Courtney, Zach Mills, Ryan Lee, Andrew e Jakob Miller e a cada vez mais excepcional Elle Fanning) que, claramente inspirada por George Romero (conte as referências…) está fazendo um filme de zumbis em uma pacata cidade do interior.

Como todo bom realizador, Charles está interessado em “grandes valores de produção”, de preferência a custo zero, o que leva sua brava equipe a uma estação de trem no meio da noite. Algo acontece, a camereta continua rodando e a história se torna mais spielberguiana e mais fantástica a partir daí. As referencias  – a ET, Parque dos Dinossauros, Contatos Imediatos do Terceiro Grau, Guerra dos Mundos– se empilham, assim como o glossário de imagens spielberguianas: espelhos, automóveis, flashlights, rápidas aproximações da câmera.

A delícia não está aí: está no coração da trama, em sua inocência fundamental, no grupo de crianças, no limite da adolescência, buscando sua voz e sua visão, aprendendo a se relacionar entre si e com o mundo adulto, através da poderosa metáfora da fantasia, da imagem em movimento. O que acontece a partir da brusca interrupção de suas filmagens é divertido e segue em bom ritmo – exigindo cada vez mais a suspensão de descrença que mencionei lá em cima – até a mega apoteose final, absurdista ao ponto do bizarro (me lembrou a fruteira emergente do final de Segredo do Abismo. Não foi uma boa lembrança…)  Mas o que nos prende ao filme não é o fantástico: é o profunda e cândidamente humano.

Super 8 estreia dia 10 nos EUA e dia 12 de agosto no Brasil.E… fique até o final dos créditos…

 


O 3D morreu? Viva o 3D?
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Ana Maria Bahiana

 

Nas últimas duas semanas algo interessante aconteceu no mercado norte americano:  o 3D como atrativo de bilheteria mostrou sinais de declínio. Sinais claros, vindos do índice de vendas de ingressos, assinalaram o que pode ser , na melhor das hipóteses, um desinteresse momentâneo e, na pior, o começo de uma curva descendente, o ciclo final de uma tendencia.

Primeiro, vamos ver o quadro geral: a venda de ingressos nos EUA, neste primeiro semestre, está em media 20% abaixo do mesmo periodo ano passado. É o ponto mais baixo de uma curva descendente que vem desde 2002, e que foi interrompida brevemente em 2009-inicio de 2010 por Avatar.

O mega-sucesso de Avatar, como se sabe, levou os nervosíssimos chefões da indústria a uma conclusão simples: o 3D é a salvação! Não apenas é o que público deseja, mas também é um modo de vender ingressos mais caros, dando um reforço na receita!

Como sempre acontece nesses casos, neste nível, ninguém discutiu a necessidade de tais filmes serem tão bons, tão envolventes e tão tecnologicamente avançados  quanto Avatar.

Fast forward para o feriadão de Memorial Day, a última segunda feira de maio, que marca o início da temporada-pipoca, em geral a fase das vacas gordas para Hollywood: Piratas do Caribe: Navegando em Águas Misteriosas, estreia no topo, como esperado _ mas apenas 46% de sua receita vem das exibições 3D. Uma semana depois, o filme é derrubado por Se Beber Não Case 2, em 2D. Mais sete dias – este final de semana – e Kung Fu Panda 2 fez pior: apenas 45% de seus ingressos vieram de exibições 3D.

A reação em Wall Street – que é onde realmente se resolvem  os destinos dos grandes estudios  e das empresas que deles dependem – foi rápida: as ações de empresas  do setor, como a Real 3D, despencaram vertiginosamente (11% em um dia, em um caso).

Na primeira eclosão do 3D, nos anos 1950, o entusiasmo das plateias durou exatamente três anos. Tentativas posteriores, nos anos 1970 e 80, resistiram menos tempo: um ano e meio, em media. Todas foram vitimadas pela mesma combinação de fatores: filmes vagabundos, falta de paciência com os óculos, problemas técnicos de exibição, alto custo do ingresso.

E nem assim ninguém aprendeu coisa alguma.

Existem algumas diferenças, contudo, entre as trajetórias anteriores do 3D e o que está acontecendo agora.

A primeira, e mais importante, é a força dos mercados internacionais, coisa que não existia em meados do século passado. O 3D pode estar caindo no consumo norte-americano, mas no exterior ainda é uma novidade pela qual, aparentemente, as plateias não se incomodam em pagar mais caro.

Na verdade, eu diria que todos os grandes lançamentos dos estudios, hoje, são criados, desenvolvidos e planejados visando em primeiro lugar o público fora dos EUA, de saturação mais lenta. Ou vocês acham que esses lançamentos simultâneos ou antecipados de arrasa-quarteirão são por acaso, ou apenas por conta do medo da pirataria?

O segundo elemento é o interesse na nova tecnologia por realizadores que não se alinham com o cinemão, como comentamos aqui, há pouco. A plasticidade e o poder visual da nova tecnlogia está oferecendo o que suas versões anteriores não tinham: a capacidade de ser uma real ferramenta narrativa, com resultados empolgantes e imprevisíveis.

E vocês, que estão consumindo o 3D além das fronteiras dos EUA, o que acham?