Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : animação

“As pessoas não tem mais que ir ao cinema”, e outros sinais da revolução
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Ana Maria Bahiana

 

netflix

Três ecos do fim de semana ilustram uma industria em absoluta transformação:
_ Falando a profissionais de efeitos especiais no fim de semana, Chris Meledrandi, CEO da Illumination Entertainment, responsável por fazer uma ponte importante entre animadores europeus e o mercado internacional com os dois Meu Malvado Favorito, repetiu exatamente o que Steven Spielberg e George Lucas disseram meses atrás: os estúdios estão canibalizando a si mesmos com a obsessão do mega-mega-blockbuster. “Eles ainda não compreenderam que há uma geração que simplesmente não precisa ir ao cinema.”, ele disse. “Há uma variedade de outras formas de entretenimento audiovisual competindo com o ir ao cinema.”. Meledrandi condenou a “resposta de pânico” dos estúdios a essa realidade criando apenas lançamentos gigantescos que o mercado não tem condição de absorver. “Um super filme evento devora a plateia de outro super evento. E isso acontece com filmes de ação e de animação, do mesmo modo.”

_ Curiosamente, no mesmo evento (mas numa outra palestra), o diretor Henry Selick  (Coraline, O Estranho Mundo de Jack) desceu o pau na franquia Meu Malvado Favorito, colocando os filmes da Illumination num bolo de “desenhos feitos em fórmula, todos parecidos uns com os outros, onde não é possível distinguir o estilo ou a criatividade de quem fez”. A saída? “As outras midias”, Selick disse. “Ponho mais fé na TV por assinatura e em opções como Netflix, Amazon e Google.” Dois dias depois, Selick fechou com a independente FilmNation para dirigir um filme com atores, adaptando o livro infantil A Tale Dark and Grimm.

_ Num outro evento, promovido pela Film Independent, que reúne produtores e diretores independentes,  Ted Sarandos, o presidente de conteúdo da Netflix, resumiu tudo e foi um passo adiante: não são só os grandes estúdios os responsáveis por um apocalipse iminente – os exibidores são até piores.  Novamente, Sarandos lembrou que ir ao cinema é algo cada vez mais remoto para as novas gerações – e para todas as pessoas, de qualquer idade, que moram em locais sem um cinema próximo.  “O cinema não é o único lugar onde se pode ver um filme”, disse Sarandos. ” Os produtores precisam se conscientizar disso, e os distribuidores precisam parar de se deixar intimidar pelos donos de cinemas e lançar os filmes simultaneamente em todas as plataformas- inclusive a Netlflix.”

Isso vai render…


Este é, possivelmente, o filme mais interessante de Cannes 2013
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Ana Maria Bahiana

The Congress,de Ari Folman, explica o que o realizador de Valsa Com Bashir esteve fazendo nos últimos quatro anos e meio: é mais uma engenhosa, perturbadora, maravilhosa colagem/colisão de animação e ao vivo, atacando com unhas, dentes e coração mais um tema que só vale a pena ser visto por todos os lados. No caso, o poder de criar mitos e o que fazemos com ele. Elenco de sonho: Robin Wright, Jon Hamm, Harvey Keitel, Paul Giamatti. Está estreando mundialmente na Quinzena dos Realizadores em Cannes. E já é, oficialmente, o filme da Croisette que mais quero ver.

 


A batalha pelas estatuetas de metal, parte 3: o zum-zum dos festivais e as promessas da animação
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Ana Maria Bahiana

Enquanto vocês curtiam o feriadão, algumas coisas interessantes aconteceram por aqui,  cada uma delas acrescentando mais um pouco de foco e detalhe ao panorama do fim de ano – que, por sua vez, é quando se estabelece o tema e o tom deste momento na indústria cinematográfica.

Na Academia – que tem presidente, diretor executivo e chefe de marketing novos este ano – os planos para o Oscar 2013 começam a tomar forma. Os premiados com Oscars honorários, este ano – aqueles que foram tirados da cerimônia principal e colocados num evento fechado, em novembro – não incluem nem atores, nem atrizes, nem diretores de ficção. Jeffrey Katzenberg, mega-executivo e presidente da DreamWorks Animation (e um dos responsáveis pelo renascimento da Disney nos anos 1980 e 90) ficou com o troféu Jean Hersholt, por atividades filantrópicas, e George Stevens Jr., um dos fundadores do American Film Institute, ganhou um Oscar honorário.

Para mim, os mais interessantes são os outros dois Oscars honorários: D.A. Pennebraker, mestre documentarista e responsável por alguns dos filmes formativos da minha vida – Monterey Pop, Don’t Look Back, Ziggy Stardust and the Spiders From Mars (cujo poster está aqui atrás de mim enquanto escrevo) – e Hal Needham, um dos pioneiros do árduo ofício de dublê profissional (Star Trek e Missão Impossível na tv, e dezenas de títulos no cinema, inclusive Operação França, Rio Lobo, Chinatown e Nasce uma Estrela) e inventor do atual modelo de camera car, que permite tomadas em movimento realistas e de baixo risco.

Os Globos de Ouro continuam no mesmo formato de sempre  (mas ainda não se sabe quem será o host…), e dia 1 de novembro conheceremos o recipiente do troféu Cecil B. de Mille, por conjunto de obra. E, como este ano é o 70 ° aniversário do premio ( e da Associação dos Correspondentes Estrangeiros que o outorga) teremos um troféu especial, a mais, que só será entregue desta vez… conto mais assim que souber…

Na bilheteria, a crise criativa se tornou espetacularmente aparente: este fim de semana foi a pior arrecadação desde o ataque às Torres Gemeas, quando um trauma real paralisou produção e consumo de entretenimento. As coisas estavam tão ruins – 37% a menos que a pior bilheteria deste ano — que o filme com maior venda de ingressos por sala foi…. Indiana Jones e os Caçadores da Arca Perdida, relançado em Imax. Ou seja – reciclagem por reciclagem , melhor rever o original.

E os primeiros ecos dos festivais de outono, Veneza e Toronto, apontam The Master, de Paul Thomas Anderson, e Argo, de Ben Affleck, como os pesos-pesados confirmados do final de ano. Não fosse um item do seu regulamento, The Master teria levado o Lido inteiro. Como não levou, abriu-se um foco de luz sobre o coreano Pieta, de Ki-duk Kim, na disputa de filme estrangeiro (onde, cada vez mais, reina Amour, de Michael Haneke).

 Cloud Atlas ganhou uma excelente matéria da New Yorker (que, entre outras coisas, documenta com precisão o que é levantar a arquitetura de financiamento de um projeto original, hoje…) e foi ovacionado em sua primeira sessão em Toronto, mas eu não percebo a unanimidade que cerca Master e Argo. E não é apenas porque as resenhas foram meio a meio – é porque há mais entusiasmo pelas tranças pink de Lana Wachowski (ex-Larry) do que pelo filme como um todo.

Vou conferir todos eles em breve, e continuo monitorando as reações dos formadores de opinião – estou bastante curiosa para saber o que, num ano de eleição, crise econômica e colapso de bilheteria, o cinema poderá expressar, coletivamente.

O que nos leva aos longas de animação. Quando a categoria foi criada nos Oscars, 10 anos atrás – e , cinco anos depois, nos Globos de Ouro, como resultado de uma campanha da qual tenho orgulho de dizer que participei – haviam basicamente três contendores: Disney, Pixar e DreamWorks (a última ganhou o primeiro Oscar com Shrek, a Pixar ficou com o primeiro Globo por Carros).

As coisas mudaram muitíssimo nos últimos anos – um olhar sobre os indicados das premiações deste ano revelam um panorama muito mais amplo, pontuado por estreantes (como a Paramount com Rango e a Fox  com O Fantástico Senhor Raposo) e independentes de paises fora dos EUA (O Segredo de Kells– que foi feito em grande parte no Brasil—  O Ilusionista, Um Gato em Paris, Persepolis, Chico e Rita).

Acho que a disputa deste ano será particularmente saborosa. A Pixar vem com Valente, que literalmente estabeleceu um novo padrão de qualidade na animação digital,  a Disney tem Frankenweenie, de Tim Burton, a DreamWorks vem com A Origem dos Guardiões e Madagascar 3 (um dos maiores sucessos de bilheteria de um ano de vacas anoréxicas).

Mas é sobretudo no território além dos pesos- pesados que vejo grandes possibilidades: Piratas Pirados!, da Sony/Aardman; Paranorman, da Focus;/Laika (os mesmos de Coraline) ; Hotel Transilvania, da Columbia, e O Lorax- Em Busca da Trúfula Perdida, da Universal.

From Up Poppy Hill, do Studio Ghibli

E atenção especial a uma pequena companhia que, título por título, pode ser a mais poderosa distribuidora no mercado norte-americanio: a Gkids, especializada em animação independente de qualidade e produtora do Festival Internacional do Cinema Infantil de Nova York – que qualifica para os Oscars…

Em 2011, a GKIds emplacou Chico & Rita e Um Gato em Paris. Para este ano a Gkids vai lançar cinco títulos dentro dos prazos qualificadores: From Up Poppy Hill, do Studio Ghibli do Japão, A Letter do Momo, também do Japão, e os franceses Zarafa, Le Tableau e o meu favorito, The Rabbi’s Cat (sobre um gato que engole um papagaio e se torna subitamente douto em doutrina judaica). É uma imensa lufada de ar fresco e novas ideias vindas de outros quadrantes, que o departamento de animação da Academia tem recebido de braços e olhos bem abertos.


A pré-corrida do ouro, parte III: estrangeiros, animação e o saldo do primeiro semestre
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Ana Maria Bahiana

 

O que falta no balaio dos candidatos a candidatos a prêmios na temporada ouro?

Ryan Gosling em Drive

 

Para começar, algumas incógnitas : Contágio, de Steve Soderbergh (setembro nos EUA,; outubro no Brasil) e Drive, de Nicolas Winding Refn (setembro nos EUA, sem data no Brasil) , tem fôlego para prêmios? ;  Inquietos (Restless), de Gus Van Sant, ( setembro nos EUA; outubro no Brasil) será cabeça demais para ser lembrado?; o que vai acontecer com Melancolia (agosto no Brasil, novembro nos EUA), depois que Lars Von Trier desatou a dizer besteira?; e o duelo das divas diretoras – Madonna com W. E., (dezembro nos EUA) e Angelina Jolie, com In The Land of Blood and Honey (dezembro nos EUA)- no que vai dar?

Depois, os filmes estrangeiros. Para estes, existem dois caminhos _ serem escolhidos por seus países para representá-los nas categorias Filme Estrangeiro dos prêmios (como Grécia e Polônia já fizeram) ou se arriscarem na grande arena dos lançamentos no mercado norte-americano o que, automaticamente, qualifica qualquer filme para concorrer aos principais troféus.

O francês L’Artiste (novembro nos EUA, sem data no Brasil) é, neste momento, o líder nesta sub-categoria de filmes não americanos com força (e campanhas) capazes de transformá-los em competidores com os anglófonos. Uma vantagem: é mudo. Outra vantagem: é uma deliciosa, poética homenagem à alvorada de Hollywood. Mais uma vantagem: é distribuído pela Weisntein Company. Quem será seu rival? Talvez La piel que habito (setembro no Brasil, outubro nos EUA), Almodovar ingressando pelo thriller de terror, uma linguagem que acadêmicos e companhia podem compreender.

Resta olhar para o que já entrou em cartaz até agora e estimar quem tem fôlego para uma arrancada na reta final de novembro-dezembro-janeiro. Na encolha, Árvore da Vida (Tree of Life, maio nos EUA,  agosto no Brasil), de Terrence Malick, vem sendo exibido e re-exibido para grupos profissionais aqui em Los Angeles e em Nova York. Lírico, altamente pessoal, poético e, às vezes, exasperante, Árvore da Vida pode ser um favorito ou um azarão na temporada ouro.

 


Meia Noite em Paris (Midnight in Paris, maio nos EUA, junho no Brasil) é a grande unanimidade da safra do primeiro semestre. Não apenas foi (merecidamente) elogiado pela crítica mas tornou-se o maior sucesso comercial dos  últimos 25 anos da carreira de Woody Allen. É um duplo triunfo que não passa despercebido pelos votantes.

 

A outra unanimidade do primeiro semestre foi o independente  (Focus) Beginners (junho nos EUA, sem data no Brasil). Segundo filme de Milke Mills (Thumbsucker, vários videoclipes), Beginners é uma exploração autobiográfica das relações entre pais e filhos – complicada, no caso de Mills, pela revelação, depois da morte da mãe, de que seu pai era e sempre tinha sido gay. Uma indicação para Christopher Plummer (o pai) é mais do que provável, mas eu gostaria de ver o sempre excelente e sempre esquecido Ewan McGregor  (o filho) ser nomeado, também.

O primeiro semestre viu dois filmões-pipoca que podem, sim, ir para a briga no final do ano: Super 8 e Harry Potter e as Reliquias da Morte II. O primeiro seria o reconhecimento do valor do cinemão comercial norte americano da geração Goonies; o segundo seria a última oportunidade para saudar todo o extraordinário ciclo de adaptações da obra de J.K. Rowling, seu elenco, diretores e equipe.

E, finalmente, animação? Seria este o primeiro ano sem Disney ou Pixar entre os indicados? Até agora os dois favoritos pertencem respectivamente à Paramount – Rango, de Gore Verbinski – e 20th Century Fox – Rio, de Carlos Saldanha. Agora é ver as chances de Happy Feet 2 , Arthur Christmas (da Aardvark) e Gato de Botas neste combate…


Voando para o ‘Rio’: por que o filme de Carlos Saldanha é muito importante
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Ana Maria Bahiana

 

Toda vez que alguém me faz a pergunta clássica – quais as chances do cinema brasileiro no mercado internacional? – eu respondo, com certa dose de cautela: as mesmas de qualquer país que produza cinema regularmente e, assim, dê oportunidades para o aparecimento e desenvolvimento de seus talentos.

E – eu acrescento, sempre- me parece que na animação estão, hoje, as maiores chances.

Em primeiro lugar, porque a quantidade de brasileiros que já estão, hoje, trabalhando em praticamente todas as produtoras de animação, da Disney à Klaaski Csupo, da Dreamworks à Pixar, é imensa. Em segundo lugar, porque animação tem enorme facilidade de transpor fronteiras, reduzir grandes temas a uma experiencia comum a diferentes culturas, idiomas, idades. Uma grande parte da animação é como o cinema mudo – transmite ideias sem palavras. O cérebro humano adora isso: é assim que sonhamos, que nos recordamos, que construimos nosso repertório pessoal.

Disney sempre compreendeu isso. No passado, quando Walt era vivo, seus personagens visitaram a América Latina e deram a partida na “aproximação cultural” que se fazia necessária durante a Segunda Guerra Mundial. Em anos mais recentes, longas da Disney flertaram com a China (Mulan), o Oriente Medio (Aladim),  a África e o público de origem africana (Rei Leão, A Princesa e o Sapo), a América hispânica (A Nova Onda do Imperador).

Era uma questão de tempo até que a confluência dessas duas tendências – a presença de brasileiros no setor e a sua tradição internacionalista – chegasse ao Brasil.

Sergio Mendes, produtor da trilha, e Carlos Saldanha (dir) na premiere de Rio, domingo, em Los Angeles

Teria sido sensacional se a maturidade desse movimento se desse através de uma produção brasileira. Em teoria, temos todos os elementos para isso. Mas a prática é sempre muito mais complicada.

Mas vamos comemorar – Rio, produção norte-americana (Blue Sky Studios, braço de animação da Fox), é exatamente o tipo de filme que concretiza essa aproximação cinematográfica entre o Brasil e o mundo. A Fox  pagou as contas e, com certeza, exigiu a presença de talento local : Jesse Eisenberg, Anne Hathaway, Jamie Foxx, etc (o que é uma coisa boa – garante muito melhor o livre trãnsito internacional). Mas sua concepção, seu desenho de base e todo o controle de sua narrativa são de um brasileiro que faz parte dessa vasta migração de talento: Carlos Saldanha, que pensou, com carinho, em elementos de nossa cultura e paisagem.

É o perfeito produto de exportação: padrão de qualidade e astros de calibre internacional, marketing global com toda força de um grande estudio, e um coração integralmente brasileiro, sem aquela visão forçada, de fora para dentro, que estamos tão acostumados a ver.

E é lindo.

Voar é uma dessas experiencias impossíveis que o cinema reproduz bem e que o cinema de animação recria espetacularmente. Ao colocar pássaros brasileiros como protagonistas de sua história, Carlos Saldanha deu a seu filme uma ferramenta excepcional para envolver as plateias e mostrar o Rio de Janeiro de um dos melhores pontos de vista possíveis. Nada como a perspectiva do alto, em movimento, para captar em toda grandeza a espetacular paisagem de blocos gigantescos de granito, massas de verde, curvas de azul.

Aprecio sobretudo a honestidade de não ignorar os problemas – a pobreza, as favelas, o menino de rua, os contrabandistas de animais silvestres- combinada com a delicadeza de saber como mostra-los para plateias infantis .

É uma fantasia com raízes na realidade, um bilhete de amor com a generosidade para envolver quem não conhece o começo do romance.

E, estrategicamente, é importantíssimo. Rio é o campeão de bilheteria nos mercados internacionais, e estou muito curiosa para ver como se portará aqui (a premiere foi neste domingo, e o filme entra em cartaz nesta sexta nos Estados Unidos, em contra-programação a Scream 4). Antecipo enorme sucesso.

Mas mesmo sem isso, Rio já abre portas de par em par para temática e talento brasileiros que estejam dispostos a realmente dialogar com a indústria e com plateias do mundo todo.

E, sinceramente, acho que mais gente vai resolver visitar o Rio de Janeiro depois de ver este filme do que com todas as campanhas oficiais que foram feitas nos últimos anos…

 


Depois dos prêmios, as crises
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Ana Maria Bahiana

Dá pra ver o Charlie Sheen daí? Cena de Marte Precisa de Mães...

...e os produtores Zemeckis, Jack Rapke e Steve Starke,da ImageWorks Digital

Se o Brasil retoma a vida depois do carnaval, LA  volta ao normal depois do Oscar, fim oficial e real da temporada de prêmios. Neste momento do ano que afinal começa, duas crises tem ocupado a industria:  a de Charlie Sheen e da animação por motion capture, escola Robert Zemeckis.

O suspense da crise Charlie Sheen tem duas partes: como  CBS/Warner/Chuck Lorre vão reformular Two and a Half Men,  sua série campeã de audiênica nos EUA e principal exportação mundo afora; e se Charlie será capaz de se reinventar depois do que parece  um descontrolado suicídio profissional.

Saberei mais, pelo menos sobre a primeira parte, em breve.

Passemos portanto para a segunda crise, que foi selada esta semana com o desastre de  Marte Precsia de Mães, a derradeira obra da ImageMovers Digital, o estúdio de captura digital criado por Robert Zemeckis em parceria com a Disney em 2007. Apesar de boas críticas, o longa de animação, que custou mais de 200 milhões de dólares e dois anos de trabalho para realizar e lançar, rendeu minguados 6.9 milhões de dólares na bilheteria norte americana. E os mercados internacionais não vão ajudar: Marte fez apenas 2.1 milhões de dólares nos 8 países nos quais já estreou (o filme ainda não tem previsão de lançamento no Brasil).

Todo mundo parece ter uma explicação para o fracasso de Marte : o título, que teria afugentado os meninos; a história de mães abduzidas, que poderia ter assustado a criançada mais moça; o congestionamento de lançamentos de animação. Mas o mais convicente, para mim, é o mais óbvio: a proposta estética do tipo de captura que Zemeckis e sua equipe praticam é frio, esquisito, desconfortável e, mais importante, vastamente suplantado por outras opções, como a perfeição psicodéllica de Avatar ou a “emotion capture” de Rango.

Mars – escrito e dirigido por Simon Wells, mas produzido por Zemeckis- não é a primeira rejeição deste estilo de mocap : Os Fantasmas de Scrooge foi outro fracasso de bilheteria, capaz de segurar os 200 milhões de dólares de seu custo apenas depois do lançamento internacional. O Expresso Polar, seu antecessor no estilo Zemeckis de mocap, foi apenas ok na bilheteria em 2004 _ e ambos contavam com o clima de festas para gerar interesse. (Beowulf, voltado para um outro segmento de plateia, é um caso a parte, mas também foi salvo pela bilheteria internacional).

A ImageWorks Digital já havia sido ejetada pela Disney ano passado, e agora fechou de vez, demitindo não apenas os 450 técnicos, artistas e funcionários responsáveis por Mars, mas também todos os que trabalhavam no reboot de Yellow Submarine – que já está oficialmente cancelado.

É um drama comum em pioneiros: ver primeiro não significa necessariamente ter a melhor solução.

Nos idos de 2002 Zemeckis foi um dos primeiros a abraçar completamente o que se anunciava como a nova grande fronteira da linguagem cinematográfica: a capacidade de anular a divisão entre real e virtual, captado e manipulado. Infelizmente, a WETA de Peter Jackson disparou à sua frente, desenvolvendo a tecnologia necessaria para realmente integrar os dois aspectos, inserindo o virtual no real sem quebra de engajamento da plateia – pensem na primeira vez em que vimos Gollum em Senhor dos Aneis – e, finalmente, em Avatar,  possibilitando a completa fusão de ambos.

Acho muito interessante o que aconteceu com Rango – que, se vocês não viram, devem correr para ver, pois é o melhor filme de 2011, até agora. Talvez porque tenha sido concebido e executado por dois forasteiros no mundo  da animação – Gore Verbinski e a Industrial Light and Magic – o maravilhoso western existencial se permitiu pensar fora da caixa.

Verbinski escreveu o roteiro pensando em cinema em geral e não animação em particular – o melhor modo de se pensar, como já propunha Papai Walt Disney . E como não queria perder a capacidade de improvisação de seu velho amigo Johnny Depp, e a vitalidade que vem de um bando de atores interagindo – o equivalente a gravar um álbum ao vivo- Verbinski e a ILM inventaram um sistema entre o mocap e a animação digital, captando interpretações ao vivo de todo o elenco que serviram de base para criação de suas personas digitais.

Há tempos este sistema é usado por animadores tradicionais e digitais como base de sequencias mais complexas – a valsa entre Bela e Fera, por exemplo, no longa de 1991. Sem um passado de animador, Verbinsky olhou para o recurso como uma ferramenta criativa nova, que poderia ancorar toda a sua saga de habitantes do deserto vivendo uma saga meio Chinatown, meio Sergio Leone e um tanto Carlos Castañeda. O resultado é um filme que, além de maravilhoso por si mesmo, está sendo abracado entusiasticamente pelas plateias. Como merece.

Mais Rango no próximo.


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