Blog da Ana Maria Bahiana

Categoria : Estreias

Não foi você que envelheceu, Jack Bauer: foi a TV que rejuvenesceu
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Ana Maria Bahiana

 

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Em novembro de 2001, quando a 24 Horas estreou na Fox, sua chegada pareceu algo quase paranormal: três meses depois do ataque às Torres Gêmeas, aqui estava uma catarse coletiva prontinha, na medida, com a dose exata de violência explosiva e cuidadosamente orquestrada, produzida e realizada com a mesma extravagância e precisão dos arrasa-quarteirões da tela grande.

Em seu  centro, o  Jack Bauer  de Kiefer Sutherland, um herói indestrutível, um guerreiro imbuído de um senso férreo de certo e errado,  capaz de apanhar e bater com igual determinação e, ao mesmo tempo, ter aquela aura de vulnerabilidade ao redor dos olhos, ser um pai de família devotado (como esquecer aquela temporada em ele andou à cata de sua chatíssima filha perdida pelas montanhas ao norte de Los Angeles?).

Como os xerifes/caubóis justiceiros dos westerns clássicos, Bauer se guiava por um código particular de conduta, acima de todas as instituições, a cada hora/programa vingando um pouco mais um público (o norte americano) traumatizado pelo equivalente a uma bofetada cósmica na cara.

E isso explica os quase 14 milhões de espectadores em 2006 , o fato de ter-se tornado a série de ação mais longa da TV norte-americana (ultrapassando Missão Impossível) e uma boa parte dos prêmios – inclusive, em 2008, o primeiro Emmy na categoria “drama” da história da Fox. Para entender os outros aspectos de seu sucesso, tais como sua imensa popularidade pelo mundo afora, seu lugar de destaque na cultura pop do começo deste século, sua inclusão  em número 6 na lista 50 melhores séries de todos os tempos da revista britânica Empire é bom lembrar o quanto 24 Horas era audaciosa 14 anos atrás. O “tempo real” da narrativa – 24 horas de TV, uma hora a cada episódio. A contemporaneidade dos temas.  A qualidade dos efeitos. O realismo da violência. A complexidade de pelo menos alguns personagens.

Entretanto, entre novembro de 2001 e segunda feira passada  – quando estreou aqui a minissérie 24: Live Another Day – tanta coisa aconteceu na TV! A TV aberta, por exemplo, perdeu sua hegemonia para a TV paga, onde séries ainda mais bem produzidas, realistas em sua recriação da violência e infinitamente mais bem escritas tomaram a dianteira no coração das plateias do mundo todo (graças em grande parte a essa outra grande novidade, a internet banda larga).

O mundo ficou ainda mais complicado, e o público, mais relutante em aceitar mocinhos de chapéu branco que salvam tudo na porrada (a não ser que eles tenham capa, collant e estejam na tela grande. Ou se chamem Bourne. Mais sobre isso daqui a pouco). No vácuo de Jack Bauer, ausente da telinha desde 2010, entrou Walter White, o anti-herói sem nenhum caráter.

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Tudo isso explica porque Live Another Day pareceu tão previsível, tão sem graca, tão… antigo (e a audiência sólida mas morna parece que concorda comigo…).

Bem que tentaram modernizar a coisa toda: drones, ataques remotos, hackers e violação da privacidade online entram no coquetel; Jack Bauer é apresentado numa sequência de ação vigiada no coração de Londres que parece ter sido scaneada diretamente da franquia Bourne. Mas é tudo um verniz bem leve por cima de intermináveis diálogos de exposição (são quatro anos de ausência para serem explicados, afinal…) e os sopapos de sempre, com a mesma Chloe  mal humorada de Mary Lynn Rajskub  (agora com olhos de guaxinim!) guiando Bauer em manobras que imploram nossa capacidade de suspender a descrença.

Se você tem muita, muita saudade de 24 Horas, capaz até de achar divertido : é meio como rever um velho amigo, agora um pouco mais barrigudo e careca, mas ainda seu grande chapa. Se não estiver assim tão fissurado… pode dispensar. A TV cresceu e mudou muito desde 24 Horas (e em parte por causa de 24 Horas). Lá fora, hoje, tem muita coisa melhor.


Um RoboCop para tempos de cólera
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Ana Maria Bahiana

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Se é verdade que é tão perigoso para um poeta tentar um novo idioma quanto para um místico tentar uma nova crença – porque ambos correm o risco de perder sua alma – então o realizador que tenta migrar de seu país para a Babilônia de Hollywood corre risco dobrado. Crenças e estilo pessoais são frágeis diante do cinema de escala industrial, e já vi muita gente boa, excelente mesmo, perder não digo a alma mas com certeza a saúde, a paciência e, algumas vezes, o rumo.

Foi um enorme prazer e alegria constatar que, colocado no tango feroz com a Sony, José Padilha não apenas sobreviveu intacto como nos deu um filme sólido, divertido, às vezes deliciosamente perverso, que relê e reposiciona o igualmente sólido, divertido e perverso original de Paul Verhoeven.

Vamos tirar do caminho, logo de cara, o que não deu certo. A música (de Pedro Bromfman) não me convenceu, me pareceu uma trilha genérica levantada de qualquer outro filme de ação. O contraste com as espetacularmente bem escolhidas faixas não-originais – de Frank Sinatra a Focus, passando por uma canção do Mágico de Oz e encerrando com “I Fought the Law” na versão do Clash – só faz tornar a trilha original ainda mais sem graça.

E como já é praxe no gênero, as personagens femininas são pouco mais que nada – assistentes, secretárias e uma esposa que sofre muito (Abbie Cornish, desperdiçada). Mas isso é um problema muito mais vasto que apenas um filme e que, acho, só vai ser consertado quando surgir a Kathryn Bigelow da sci-fi.

De resto, que prazer! O RoboCop de 1987, dirigido por Paul Verhoeven e escrito pela dupla Edward Neumeier e Michael Miner (que também escreveram Tropas Estelares, adaptando o livro de Robert Heinlein) era um comentário ácido sobre a escalada da violência urbana , a inevitável militarização da polícia e o extermínio dos direitos dos cidadãos.

A versão de Padilha – trabalhando com um bom roteiro de Joshua Zetumer, um dos roteiristas não-creditados de Quantum of Solace – incorpora todos os elementos que tornam o mesmo tema muito mais complicado, hoje: a globalização, a guerra por controle remoto de drones e satélites, a interface entre ser humano e inteligência artificial, e as muitas, muitas concessões de liberdades pessoais sacrificadas no altar da “segurança” ao longo dos 27 anos que separam um filme do outro.

Usando uma “personalidade de TV” demagógica  (vivida com a perfeição de sempre por Samuel L. Jackson) como condutor da trama, Padilha traz para seu RoboCop a urgência de um bom documentário, sublinhada pela câmera nervosa de Lula Carvalho e a montagem exata de Daniel Rezende. Mas não é só Tropa de Elite à vigésima potëncia: é tambem uma reflexão sobre o que nos faz humanos, com ecos do Frankenstein de James Whale e uma performance exata e sensível de Joel Kinnaman como o homem comum perdido dentro da máquina.

Mesmo imaginando o que deve ter sido o processo de atualizar uma propriedade intelectual de um grande estúdio com mais inteligência do que é necessário, não posso saber ao certo como foi a batalha de Padilha para realizar sua visão mantendo claros tanto o compromisso com o mercado quanto sua integridade criativa. É nessa batalha que se testam os grandes talentos. E nesse round foi Padilha que saiu vitorioso.

RocoCop estreia nos Estados Unidos dia 12 e no Brasil dia 21 de fevereiro.


Pelos intestinos de Wall Street, guiados pelo Lobo.
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Ana Maria Bahiana

Esta foi minha resenha de O Lobo de Wall Street para o programa Just Seen It, da rede PBS.

Para facilitar, a tradução da resenha que está no site do programa… Divirtam-se!

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Retornando ao territorio que explorou em Os Bons Companheiros e Cassino -um grupo de homens unido pela mais profunda cumplicidade fazem, juntos, uma jornada sinistra por baixezas cada vez maiores – Martin Scorsese está no topo de sua forma com O Lobo de Wall Street, uma comédia super-hiper-negra sobre a era da ganância desenfreada em Wall Street.

Baseado na autobiografia homônima  de Jordan Belfort, o Lobo aborda um período de abusos de todos os tipos com a absoluta falta de respeito que o tema amplamente merece. Nada da solenidade trágica com que Oliver Stone tratou o mesmo assunto em Wall Street, ou a sensação de huis clos e vazio existencial de J. C. Chandor em Margin Call. Scorsese tem exatamente o pudor que o tema merece, ou seja, nenhum : seus anti-heróis são um bando de vira-latas sarnentos que se vêem elevados a lobos (graças a uma matéria da Forbes que é para ser crítica, mas tem o resultado oposto).

Do entretenimento circense envolvendo pessoas de baixa estatura à sensacional sequência em que Belfort (um desempenho espetacular de Leonardo di Caprio ) enfrenta uma overdose literalmente paralisante de mandrix, o Lobo dispara a toda velocidade , sem remorso, às gargalhadas, pelos intestinos do sórdido negócio de enganar trouxas e vender papel enquanto (nas palavras do mentor de Belfort, uma ponta sensacional de Matthew McConaughey) “se tira o dinheiro do  bolso do cliente e se põe no nosso bolso”.

Um conselho, aliás, que Jordan e sua turma  – um grupo de atores  dando o melhor de si, liderado por Jonah Hill num desempenho de primeira – seguem à risca, saltitando de fraude e roubo a orgias regadas a drogas a grande golpes financeiros sem sequer piscar.

Um roteiro impecável de Terence Winter (Sopranos, Boardwalk Empire), a fotografia incandescente de Rodrigo Prieto e mais uma montagem absolutamente precisa de Thelma Schoonmaker (lembrem-se de que Thelma e Marty editam levando o conteúdo emocional da cena em conta em primeiro lugar…) completam um filme imperdível, uma verdadeira festa de cinema (embora com um travo amargo).

Nota 1: com 165 minutos de duração, o Lobo é longo. Mas… que cena você cortaria?

Nota 2: conseguiu achar os três colegas diretores que Marty colocou diante da câmera?

 

 


Minha estreia na TV… dos Estados Unidos
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Ana Maria Bahiana

Aqui vai, como combinado, minha estreia no programa de TV Just Seen It, que vai ao ar semanalmente pelo canal PBS, o equivalente à TV Cultura daqui. Just Seen It é criação do showrunner David Freedman, um admirador do clássico programa de Ebert & Siskel, At the Movies. Ele modernizou a fórmula colocando os resenhistas num ambiente mais informal, aumentando o número para três pessoas e incluindo profissionais de cinema – como minha companheira de comentário, Brenna Smith, atriz.

O papo aqui é sobre Uma Questão de Tempo (About Time), do simpático Richard Curtis, roteirista de, entre muitos outros,  Quatro Casamentos e um Funeral Um Lugar Chamado Notting Hill e diretor de Simplesmente Amor (que eu adoro) e Pirate Radio. Aqui, no entanto….

Uma Questão de Tempo estreia amanhã aqui nos Estados Unidos e dia 6 de dezembro no Brasil.

 


A prisão de cada um: Os Suspeitos e o desafio de rever o thriller
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Ana Maria Bahiana

Um dos principais problemas dos thrillers de crime, no cinema – especialmente os que envolvem serial killers – é o quanto a TV, especialmente a TV aberta, esvaziou o gênero. A competição de séries de arco narrativo longo, como The Killing e The Bridge, é o menor dos problemas. O pior são esses duzentos mil e oitenta seriados que a cada semana apresentam um novo monstro “como nunca foi visto na história “ ou coisa parecida e, em 48 minutos, resolvem o caso, acham o criminoso (depois de exatamente 2 e ½ pistas falsas) e pegam o dito cujo, dramaticamente.

Uma consequencia importante desse desgaste é dessensibilizar o público, tornando crueldade e  violência coisas banais, que precisam ser amplificadas cada vez mais para atrair e manter a atenção das pessoas.

Para mim uma das qualidades centrais de Os Suspeitos (Prisoners, 2013) é exatamente subverter esse princípio. Há violência, e muita, no filme do canadense Denis Villeneuve (que nos deu o maravilhoso Incendies em 2010) mas ela é mostrada com  a clareza e a dureza de algo que não é espetáculo, mas horror. E – o que mais nos perturba e nos obriga a um olhar diferenciado – a violência é cometida não pelos personagens que enquadraríamos como “vilões” numa narrativa mais previsível, e sim por aqueles que somos levados a ver como “heróis”.

Há outras qualidades em Os Suspeitos – a fotografia do mestre Roger Deakins, a música de Johán Johánnson, os desempenhos de todos os atores, incluindo Hugh Jackman num papel fora do comum em sua trajetória – mas fiquei marcada especialmente pelo modo cuidadoso, deliberado, preciso, com que Villeneuve conduz e enquadra a narrativa, tocando exatamente em nossos cacoetes de plateia e revertendo nossas expectativas. É perturbador e é bom, como um jorro de água fria no rosto, de manhã, pode ser bom : para estimular, acordar.

O título original, Prisoners, encerra melhor essa ideia. Ao longo da história, diversos personagens serão retirados de suas vidas habituais e confinados, restritos, aprisionados. A trama, em si, é simples. Duas meninas desaparecem misteriosamente no dia de Ação de Graças, num subúrbio classe media dos Estados Unidos. O pai de uma delas – Hugh Jackman – convence-se de que sabe quem é o raptor – Paul Dano, o rapaz que dirigia uma van pela vizinhança no dia – e resolve tomar as medidas que acha apropriadas, à revelia do policial – Jake Gyllenhaal – encarregado do caso.

A questão, contudo, não é nem quem fez o que (embora essa parte seja muito interessante) mas quem é, de fato, prisioneiro – e de que. Quem está absolutamente aprisionado, abrindo mão de sua capacidade de escolher e decidir? E até onde violência é o instrumento desse aprisionamento?

O roteiro original de Aaron Guzikowski (Contrabando) tem lá seus furos, mas a clareza com que Villeneuve conduz nosso olhar, e o quanto ela nos faz pensar, vale tudo.

Os Suspeitos está em cartaz nos EUA e  estreia hoje no Brasil.


Tá chovendo zumbi: quarta temporada de The Walking Dead promete
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Ana Maria Bahiana

Enquanto escrevo este post o grande debate da cidade é se a “linha invisível” que separa a TV por assinatura da TV paga foi ou não rompida com o mega sucesso do episódio de estreia de The Walking Dead, ontem: mais de 16 milhões de espectadores, sem contar os estimados 500 mil que baixaram o episódio informalmente pelo mundo afora.

A questão é a seguinte: ficou estabelecido que a TV por assinatura tem mais liberdade, mais qualidade, mais ousadia e, em tese, atinge um público mais reduzido e , por definição, segmentado.; a TV aberta não tem direito a nenhuma dessas regalias, mas atende uma massa de público muitas vezes maior.

Só que os zumbis da AMC acabam de quebrar esse conceito: 16 milhões é audiência de um NCIS, CSI da vida. Os cálculos ainda estão sendo feitos, mas parece que ontem o programa de maior audiência na TV norte americana foi mesmo The Walking Dead. Não da TV por assinatura, vejam bem: da TV.

Não é pouca coisa, principalmente considerando os percalços no caminho, com trocas sucessivas de showrunners (e, por consequencia, de pontos de vista…) e aquilo que muitos analistas consideravam um obstáculo irremovível para alcançar o grande público em casa: violência e sangueira.

Mudou a TV ou mudou o público? Ou ambos?

Com essa dúvida na cabeça, acrescento – Vi os dos primeiros episódios desta quarta temporada e ainda não sei se sei para que lado o novo showrunner, Scott M. Gimple vai levar a narrativa e a atmosfera da série.  Há uma desaceleração clara – “30 Days Without An Accident” se permite o luxo de explorar a bizarra paz da prisão, quase bucólica com suas hortas, refeitórios comunitários e horas de lazer para crianças (lembrem-se que a população aumentou consideravelmente com a chegada dos refugiados da terra do Governor…)… e com a mesma calma nos lembrar que esse condomínio campestre tem altas cercas de arame farpado cercadas por todos os lados por zumbis furiosos…

É um ritmo interrompido apenas quando é preciso com o habitual combate humanos/walkers (eu chamaria a do episódio de abertura de “Chuva de Zumbi”… com os devidos parabéns a Greg Nicotero – que dirige o episódio -e sua equipe, que está cada vez mais arrasando com os prostéticos..) e com uma trama secundária que vem vindo para o primeiro plano com grande força, trazendo novos obstáculos e novos zumbis (se eu entrar em mais detalhe será SPOILER…).

 

Mas de tudo o que vi nos dois episódios o que mais me impressionou foi esta cena aqui em cima – o encontro de Rick com uma sobrevivente, na mata em torno da prisão. Ali está Walking Dead no que tem de melhor – prendendo a atenção pelo suspense emocional, nos envolvendo em algo ao mesmo tempo terrível e misterioso, do tipo que não suportamos ver mas não resistimos não olhar. Palmas para a irlandesa Kerry Condon, irreconhecível como a mulher faminta que vagueia pelo mato, a verdadeira morta que caminha – como Rick, que perambula pela vida como um sonâmbulo nos braços da morte.


Os filmes da temporada ouro: Gravidade
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Ana Maria Bahiana

A temporada-ouro começou. Mesmo sabendo que uma grande parte destes filmes só estrearão no Brasil em 2014, vou procurar manter vocês atualizados com resenhas dos títulos mais importantes da temporada.

Terra, Terra/ Por mais distante o errante navegante/quem jamais te esqueceria” – Caetano Veloso, “Terra”

 

Os primeiros minutos de Gravidade (Gravity, 2013) são tomados primeiro pela escuridão absoluta, depois por uma única imagem: o azul profundo do planeta Terra, coberta de nuvens como na canção de Caetano, girando lentamente no silêncio abissal do espaço. Nada mais é preciso para estabelecer a narrativa que vai  ocupar os próximos 90 minutos – certamente entre os mais rápidos na vida de qualquer espectadora ou espectador. É aqui que estamos: suspensos onde aquilo que torna possível nossa humanidade é algo distante, intocável, e o abismo está por toda parte, crivado de luz e ocasionais vestígios da passagem de nossa espécie.

A Terra, que ocupa quase todos os quadros deste elegantíssimo e absurdamente bem feito exercício em sci-fi filosófico, é, na verdade, o tema recorrente de sua trama. Suspensos  no vazio ao redor de um ônibus espacial, aquele azul imenso ao fundo, a engenheira médica Ryan (Sandra Bullock) e o veterano astronauta Matt (George Clooney) conversam menos sobre a tarefa que os ocupa e mais sobre o planeta acima do qual flutuam. O que ela, Terra, é, a gravidade com que atrai as vidas, emoções e desafios de seus filhos, tão doidamente distantes de seu abraço, são o que acaba nos prendendo completamente à trama, além da exatidão dos efeitos, além da estranha beleza desse cenário completamente novo.

Mesmo quando, em seu terço final, o filme ameaça flertar com o esquema “mais é melhor”, atirando todo tipo possível de obstáculo na direção da pobre Ryan, continuamos inteiramente comprometidos com ele por esse motivo simples: porque, com imagens poderosíssimas, ele nos dá a real dimensão de ser humano longe de casa.

Cuarón, fã de pesquisa espacial, confessa ser admirador fanático de 2001: Uma Odisséia no Espaço, a obra prima de Stanley Kubrick que, nos idos de 1968, nos deu pela primeira vez a real dimensão do que a vertigem do espaço representava para nossa espécie, em termos físicos, emocionais e existenciais. Cuarón também diz que evitou rever 2001 enquanto trabalhava em Gravidade por “puro medo. Não há comparação. O filme de Kubrick é um extraordinário ensaio filosófico. Eu ficaria completamente petrificado se sequer pensasse nele enquanto realizava Gravidade.”

E no entanto, os dois filmes têm muito em comum, começando pelo salto quântico que cada um deles trouxe para os efeitos visuais. 2001 foi diretamente responsável pela nova dimensão que os filmes de ficção científica tomaram a partir dos anos 1970. Gravidade mostra o que é possível fazer neste momento, na encruzilhada entre arte e ciência, entre o que a exploração espacial nos informou, o que a tecnologia digital realiza e o que um realizador imagina.

Mas isso seria um exercício frio se Cuarón, realizador sensível, não desse um coração profundamente humano ao seu filme. Matt e, especialmente, Ryan, tem tanto de cada um de nós que sua odisséia, seu naufrágio no oceano sem fim acima da Terra, nos toca e nos prende. Ficamos, como eles, pequenos, frágeis, desorientados, procurando o amparo da ciência e da tecnologia mas no fim descobrindo apenas uma coragem animal que, contraposta àquele imenso disco azul girando ao fundo, se torna radicalmente comovente.

Um dos grandes trunfos de Gravidade é seu uso do som. Como Kubrick, Cuarón mantem-se fiel à realidade de que, no espaço, não há som. O que ouvimos é o que captam os microfones nos trajes espaciais dos personagens – e, novamente como Kubrick, Cuarón usa a sonoridade e o ritmo da respiração como um recurso dramático da mais alta eficiência. O silêncio do espaço é quebrado apenas pela nossa presença, pela intrusão humana – mesmo a trilha musical é usada economicamente.

Considerando que Gravidade é um tour de force praticamente solo de Sandra Bullock e que em nenhum momento damos um passo atrás em nossa empatia com ela,posso dizer que aí está um caso raro em que a tecnologia digital não limitou, mas expandiu o trabalho humano. Mais um ponto: o excelente 3D, que não distrai, não interfere, apenas contribui para a completa experiência do filme.

E, no fim das contas, Gravidade – de novo como 2001, ou como Solaris, de Tarkovsky, que Soderbergh refez em 2002, com George Clooney – é sobre vida e morte. Mérito de Cuaron por realizar, com enorme precisão e delicadeza, o paralelo entre flutuar em  zero gravidade no ventre do espaço e flutuar em líquido amniótico no ventre materno, onde outros cordões nos prendem à sobrevivência, ao que tem peso, pulso, oxigênio, terra.

Gravidade estréia nos Estados Unidos dia 4 de outubro e no Brasil dia 11 de outubro.


Perdidos na reality: o mundo falso brilhante de Bling Ring
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Ana Maria Bahiana

Entre o final de 2008 e meados de 2009, Los Angeles, uma cidade que já viu praticamente tudo o que de bizarro a humanidade pode inventar (e é capaz de inventar mais coisas quando não há oferta suficiente…), ficou absolutamente fascinada com um fenômeno novo: as mansões de ricos e famosos , nas colinas de Hollywood, estavam sendo sistematicamente invadidas por bandidos que não arrombavam, não quebravam e algumas vezes não roubavam coisa alguma.

Primeiro Paris Hilton, depois a estrela reality Audrina Patridge, e em seguida os atores Rachel Bilson , Megan Fox, Lindsay Lohan e Orlando Bloom foram vítimas da estranha nova categoria de ladrões, que pareciam não tomar precaução alguma, davam adeuzinho para as eventuais câmeras de segurança e, quando roubavam, se interessavam apenas pelos itens fashion: roupas, sapatos, relógios, bijuterias e acessórios de griffe.

Quando finalmente a quadrilha foi presa, os queixos caíram ainda mais: eram todos moças e rapazes de famílias de alta classe média, moradores dos luxuosos condomínios fechados do subúrbio super exclusivo de Calabasas, nas montanhas acima das praias de Malibu. Uma das dificuldades para apreender a turma era justamente o fato de nenhum deles ter antecedentes criminais – foi preciso um deles fazer a besteira de tentar vender os relógios roubados para um atravessador e traficante conhecido para que a estranha aventura tivesse fim.

Essa história pode ser contada de várias maneiras, e uma delas é a excelente reportagem da revista Vanity Fair, assinada por Nancy Jo Sales, que inspirou o Bling Ring: A Gangue de Hollywood, de Sofia Coppola. Há na matéria uma quietude repleta de curiosidade  (e, lá bem pelo meio, compaixão) voltada não para os feitos mas para o perfil dos jovens ladrões e os mecanismos que inspiraram suas incursões pelas colinas de Hollywood.

É uma sintonia boa. A história das meninas e meninos de boa família que se tornam ladrões por tédio casa perfeitamente com a estética e as preocupações de Coppola. Aqui está Los Angeles, a cidade onde ela cresceu à sombra da cultura da celebridade, sua sedução e desencanto – que ela explorou em Um Lugar Qualquer – habitada por uma nova geração cuja ideia de “busca de identidade” envolve griffes e estrelas de reality shows.

Sofia conhece e desconhece essa cidade, e seu olhar sobre ela tem ao mesmo tempo a distância de quem não mais reconhece nela nenhum sinal familiar e a intimidade de quem jamais se esqueceu o que é ser jovem cercada de fama e glamour por todos os lados.

O jovem elenco tem uma cara muito conhecida – Emma Watson, excelente como a líder intelectual, por assim dizer, do bando – mas vale pelo conjunto, uniformemente ótimo, com pelo menos duas grandes revelações: Israel Broussard como o solitário (em todos os sentidos) rapaz da gangue e Katie Chang, como a ponta de lança da quadrilha.

Quando Sofia situa esses jovens personagens – fictícios, mas seguindo de perto os verdadeiros integrantes do “bling ring” de 2008 – em seus habitats naturais, com suas familias, na escola, ela é crítica: aqui está o vazio onde essas pessoas, mal saídas da infância, devem buscar suas referências.

Quando eles estão à solta no mundo absurdo dos clubes e aventuras noturnas pelas casas dos famosos, o filme adquire uma dimensão de sonho, todo cores extremas, azuis, roxos, vermelhos, o verde bizarro da câmera noturna contrastando com a névoa neon da cidade. Em uma tomada em especial, que começa na casa de Paris Hilton e vai abrindo para mostrar tanto os inusitados ocupantes da mansão quanto a vastidão da cidade à sua volta, Sofia sintetiza toda a absoluta solidão de uma existência sem amarras num universo sem eixo. É um momento que remete tanto a Encontros e Desencontros quanto a Um Lugar Qualquer e a um tema central da filmografia de Coppola: quem somos de verdade quando não temos mais a bússola do habitual para nos formatar?


D23 Expo: o futuro da Disney é previsível, lucrativo e às vezes poético
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Ana Maria Bahiana

Passei  três dias intensos no coração do mundo Disney e vivi para contar a história para vocês. Mais sorte que a do meu computador, que faleceu em algum ponto entre Buzz Lightyear e Maleficent e ainda não ressuscitou (o que explica em grande parte o meu sumiço daqui).

No passado, a Disney fazia encontros modestos com a midia, uma vez por ano, para mostrar seus novos projetos. Lembro com carinho de um em particular, numa sala alugada em West Hollywood, onde Jeffrey Katzenberg anunciou A Bela e a Fera, mostrando croquis da animação e um trecho ainda em lápis de “Be Our Guest” com acompanhamento ao vivo de Alan Menken ao piano. Meninas e meninos, eu vi.

Há quatro anos, contudo, a Disney resolveu transformar o anúncio em um grande evento: a D23 Expo, espécie de versão exclusiva da Comic Con. Criada em 2009, o D23 (D de Disney, 23 de 1923, ano da fundação do império) é o fã clube oficial de todas coisas Disney, inventado e implementado pelo chefão Bob Iger. A Expo, no hiper mega gigantesco Centro de Convenções de Anaheim, o subúrbio de Los Angeles que também abriga a Disneylândia,  tem tudo o que a Comic Con tem – cosplay, shows, exibições,  dezenas de stands com produtos e serviços – só que com um único tema: Disney.

O ponto alto desta festança vagamente assustadora são as duas apresentações de futuros projetos, uma dedicada à animação, a outra aos filmes. A plateia – 99% fãs enlouquecidos – adora tudo. Eu, que pertenço ao 1% de observadores razoavelmente isentos, me senti engolida por um tsunami de informação, nem toda muito útil ou sequer divertida.

Duas coisas que muita gente – eu, inclusive – queria saber foram abordadas de razante: o sétimo episódio de Star Wars (o primeiro da era Disney) e Tomorrowland, a nova incursão na seara atração-de-parque-que- se transforma em filme. A expressão usada por Bob Iger para descrever os dois foi “estamos muito empolgados (excited)”, mas isso quer dizer muito pouca coisa – ele usou exatamente os mesmos termos para descrever todos os outros projetos do estúdio.


O que me empolga  (ou tranquiliza) um pouco mais com Tomorrowland é a presença de Brad Bird como diretor, desenvolvendo o roteiro com Damon Lindelof (ter George Clooney e Hugh Laurie no elenco também ajuda…). Bird tem, além de uma fina sensibilidade ,uma visão muito interessante das ideias e estética de meados do século passado, de onde nasceu a  Tomorrowland, a Terra do Futuro dos parques da Disney (confiram The Iron Giant e Os Incríveis e vocês vão ver).

Aperitivo: a app que explora as referências visuais e conceitos de “futuro” como era visto em 1952…

E acho que, no departamento filmes, essas ausências me animaram mais que as presenças. Angelina Jolie foi aclamada quando apareceu para plugar Maleficent – o visual é bacana, os chifrinhos foram a marca registrada entre os fãs. Mas, como Saving Mr. Banks, temo que seja mais do mesmo, a milionésima iteração da mesma história, sem a menor possibilidade de um olhar novo ou sequer irônico.

O que me leva à animação, que foi apresentada por um empolgado John Lasseter, mudando de camisa a cada novo título. Embora todas as histórias sejam, de fato, a mesma história – protagonista descobre algo novo sobre si mesmo/a, encontra um coadjuvante fofinho que, depois de algum conflito, se torna seu/sua melhor amigo/a e os dois partem numa fantástica aventura – quatro me chamaram a atenção, de cara:

Zootopia (previsão: 2016) , o projeto ultra-secreto que a Disney Animation verm desenvolvendo há dois anos (“vamos ter que matar todos vocês depois desta apresentação”, disse o diretor Byron Howard), tem grandes achados conceituais e visuais: um mundo desprovido de seres humanos, povoado apenas por animais que desenvolveram todas as nossas características, manias e necessidades. “Nós sempre quisemos fazer um filme de animais humanizados, continuando uma tendencia tradicional da Disney”, disse Lasseter, anunciando o projeto. Vi ecos de Madagascar e, no protagonista, muita coisa de O Fantástico Sr. Raposo (menos a ironia…) mas… o projeto é para 2016, ainda tem muito chão…

Inside Out (previsão: 2015) , outro projeto ultra secreto, dessa vez da Pixar (tão secreto que não tinham nem título até ser batizado pelo departamento de marketing nas vésperas da D23 Expo) traz a assinatura de Peter Docter (Toy Story, Wall-E, Up), o que para mim já é uma tranquilidade. Mas foi seu tema que me intrigou: o filme todo se passa no mundo interior de uma familia que se muda de uma cidadezinha do meio oeste norte-americano para a metrópole de San Francisco. Seus protagonistas não são a mãe,o pai e a filha adolescente, mas suas principais emoções: Raiva, Tristeza, Alegria, Nojo e Medo. É uma espécie de Bergman à moda da Pixar e a sequencia  que foi exibida, em rascunho, com os conflitos interiores da família em torno da mesa de jantar, foi pura perfeição. É claro que em algum momento alguém se junta com alguém e parte em uma aventura mas….

Big Hero 6 (dezembro de 2014). Don Hall, que dirigiu o lindo Winnie The Pooh de 2011, inspirou-se numa série HQ da Marvel, cult ao ponto de ser obscura, para criar o fabuloso mundo de Sanfranstokyo, a grande metrópole pan-pacífica de algum universo paralelo. Gostei da história, que mostra adolescentes inteligentes, articulados,, plausíveis — inclusive o herói, um gênio precoce da robótica – que se transformam numa espécie muito especial, talvez hesitante, de super-herói. Mas foi o visual que me encantou _ paixão pura, pura imaginação.

Get a Horse! (novembro 2013). Guardei o melhor para o final. Produto da divisão “pobre” da Disney, a Disney Toons, dedicada ao trabalho sem glória de criar curtas e médias metragens para o mercado de TV e home entertainment, este curta pode ser a grande gema da Disney desta temporada. E quanto menos eu falar sobre ele, melhor. A inspiração veio de um par de croquis  de Mickey e Minnie encontrados nos arquivos da Disney, datados de 1928. Mais não digo. Nele está o coração daquilo que, hoje, é uma commodity enlatada – a magia Disney. É em parte imaginação, em parte molecagem, em parte inocência, e , completamente, a pura alegria, a embriaguez de criar, de contar uma história com o desenho em movimento. Get a Horse! Vai ser exibido antes de A Rainha da Neve, a super-previsível aventura-com-princesas deste ano. Considerem ir ao cinema, ver o curta e ir embora. Depois que ele estrear eu conto o resto da história…

 


Quando os humildes herdaram a Terra: todo o poder de Elysium
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Ana Maria Bahiana

A melhor ficção científica não é sobre o futuro: é sobre o presente, e tudo aquilo que nos assusta, angustia, empolga e intriga no presente. Dois alicerces do gênero no cinema – Le Voyage Dans La Lune, de Georges Méliès, 1902, e Metropolis, de Fritz Lang, 1927 -falavam, na aurora do século 20, dos medos do que a muito recente revolução industrial poderia fazer com o planeta e seus habitantes.  Chaminés fumegantes inspiram os cientistas de Voyage Dans La Lune a buscar novos horizontes na Lua. Uma sociedade radicalmente dividida entre  operários oprimidos, vivendo em miséria, e oligarcas opressores, vivendo no luxo, gera uma revolução em Metropolis.

Há um tanto de ambos, Metropolis e Le Voyage Dans La Lune, em Elysium, o arrasa-quarteirão mais inteligente desta (fraquíssima) temporada pipoca.  Porque seu realizador, Neil Blomkamp, não deixa o cérebro na prateleira quando cria, todo o poder do sci-fi, sua capacidade de especular sobre o que estamos vivendo agora, com a liberdade de ver os problemas na distância do futuro, passa, intocado, da tela para a plateia.

Em seu sensacional filme de estreia, Distrito 9, Blomkamp refletia profundamente sobre os conceitos de raça, espécie e a infinita arrogância dos humanos, colocando em nossas mãos um novo tipo de ET – o ET das comunidades carentes, dos marginalizados, dos segregados.

De muitos modos Elysium continua o raciocínio de Distrito 9, adicionando boas doses das ideias dos prioneiros da sci fi. Como em Voyage, a Terra em Elysium é um planeta devastado e, como em Metropolis, quem a herdou foram de fato os humildes _ todos aqueles pobres demais, marginalizados demais para se mudar para o novo paraíso celeste, Elysium, uma espécie de mega-condomínio fechado, exclusivo para ricos e bem nascidos, valsando acima da Terra como uma perversão sinistra da estação espacial de 2001 Uma Odisséia no Espaço, imune a pobreza, violência e doença.

Os melhores achados de Elysium estão em sua abordagem do que foi feito da Terra, pelo microcosmo de Los Angeles. No século 22, LA terá se transformado, dependendo do ponto de vista, numa imensa Tijuana ou num interminável Complexo do Alemão, hiper-poluída, desprovida de serviços  públicos  e controlada ou por um sortimento de gangues e mercenários, ou por robocops que chamam todo mundo de “cidadão” enquanto baixam o sarrafo.

É uma vida em círculos, onde quem tem sorte, como Max (Matt Damon) trabalha , por trocados , em condições precaríssimas, em grandes fábricas de bens de luxo e segurança, ganhando tempo até que alguma trivialidade – um encontro mais brusco ou com os robocops ou com os mercenários, uma doença – ponha um ponto final. Uma das melhores cenas desse primeiro ato envolve Max e um robojuiz, que vai fazer a delícia (ou a agonia) de qualquer pessoa que algum dia teve que resolver um caso complicado com um burocrata.

Sobre esse inferno terrestre paira Elysium, acessível apenas aos seus cidadãos, e governado com elegante mão de ferro por uma Jodie Foster em seu melhor modo vilanesco,bebendo champanhe e falando francês enquanto ordena ataques mortais a dezenas de pessoas, à distância e sem elevar o tom de voz.

Eu só lamentaria uma coisa, mas ao mesmo tempo compreendo o que aconteceu. Enquanto Distrito 9 deixava que os personagens contassem a história – e nós nos envolvíamos a partir do que íamos descobrindo sobre eles – Elysium, a partir do meio, apoia-se no velho modelo das repetidas cenas de ação e enfrentamento para tocar a narrativa.

Mas eu entendo: ao contrário de Distrito 9, este é um filme de grande orçamento, com grandes expectativas de um grande estúdio – a Sony – que teve uma temporada pipoca atribulada. Posso imaginar perfeitamente o quanto de interferência o roteiro original sofreu para incluir “mais efeitos!”, “mais ação!”, “mais perseguições!”, “mais explosões!”.

 

A presença de Alice Braga e Wagner Moura num ótimo elenco multicultural que inclui também Diego Luna e  Sharlto Copley merece uma conversa à parte. Ambos estão excelentes e tenho certeza de que, bem administrada, essa exposição pode ser um salto quântico em suas já luminosas carreiras. Eu espero apenas que Alice faça, em breve, um papel num grande projeto internacional onde ela não seja a boa moça em perigo. Sei, sabemos, que ela é capaz de muito, muito mais. Wagner criou seu líder bandido Spider com impressionante presença e fisicalidade _ agora é só esperar as próximas ofertas (e escolher bem).

Elysium estreia aqui nesta sexta feira, dia 9, e no Brasil dia 20 de setembro.