Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : Jogo de Tronos

A loucura da compaixão e outras lições dos finais de The Killing e Jogo de Tronos
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Ana Maria Bahiana

 

Duas séries importantes deste primeiro semestre encerraram suas temporadas de estréia ontem, com resultados bem diferentes: uma, The Killing, me deixou extremamente frustrada; a outra, Jogo de Tronos,  confirmou os altos padrões de concepção e execução que são sinônimos da HBO.

The Killing sofreu do mesmo problema que assombrou outra série da AMC, Rubicon: uma promessa constante de grandes mistérios e revelações que , no final, não se sustenta. A maioria das séries deste nível é planejada minuciosamente antes do início das filmagens, mas os primeiros 13 episodios de The Killing pareciam, muitas vezes, uma improvisação livre em torno do tema “quem matou Rosie Larsen?”

Vamos dar pontos positivos ao desenvolvimento dos personagens que o ritmo da série possibilitou: é raro ver, na TV, as reais consequências, sobre toda a familia, de uma morte súbita e violenta. E mais pontos pelo clima noir-com-chuva, não visto na telinha desde os tempos de Twin Peaks, de saudosa memória.

Mas eu achei o final uma bela tirada de tapete, vocês não concordam? Mais uma falsa resolução, mais um mistério encaixado na última hora, mais um gancho para ver se é possível prender a atenção do público até a segunda temporada. Para mim não funcionou, pareceu coisa feita sem pensar, sem planejar, sem honrar os compromissos com o espectador que já havia investido tanto nas promessas da série.

Jogo de Tronos é uma outra criatura. Um elemento poderoso que narrativas de época, fantasia e ficção científica tem em comum é a capacidade de comentar assuntos extremamente atuais e difíceis deslocando-os para outro lugar ou tempo. Ao colocar sua desenfreada luta pelo poder num universo  fictício, George R.R. Martin nos permite participar, sem sentir, de uma profunda reflexão sobre a natureza humana e seus diversos tombos e topadas no caminho evolutivo.

No mundo de Westeros, situado mais ou menos no equivalenea ao final da nossa idade média, os Sete Reinos tem um certo verniz de civilização: há reis e conselheiros, cavaleiros, professores, estradas e uma engenharia sofisticada o suficiente para construir um gigantesco muro como defesa contra o que sempre tememos – os outros, os que não-são-nós.

No mundo de Essos ainda estamos a poucos passos dos primatas que fomos, e a força bruta é energia predominante: o Khal que não mais pode cavalgar não mais pode liderar; a horda que estupra e escraviza está fazendo “um favor” aos vencidos.

Em ambos, contudo, o ser humano ainda não evoluiu para um plano onde questões morais mais complexas e delicadas possam ser exercitadas.  Em Essos, ao salvar a vida da feiticeira Mirri Maz Duur (Mia Soteriu), Daenerys (Emilia Clarke) tenta exercer a rara arte da compaixão _ o que, como se vê no capítulo final, leva a uma sucessão de tragédias e à pergunta-chave: “Do que você me salvou?”

Em Westeros, visitando o prisoneiro Ned Stark (Sean Bean) no episodio 9, Varys (Conleth Hill), o mestre dos espiões, chama de “loucura” a compaixão que  levou o desgraçado primeiro ministro  a comunicar à rainha Cersei (Lena Headey) a descoberta de sua longa conspiração_ causando, assim, a morte do rei Robert (Mark Addy) e, finalmente, a sua própria.

Seguindo fielmente o primeiro volume da série Uma Canção de Gelo e Fogo – com pequenas alterações que, na verdade, facilitaram a compreensão da história – os roetiristas David Benioff e David B Weiss mantiveram o foco nessa profunda discussão moral que é a essência da saga. Porque estamos num mundo claramente imaginado, as questões podem ser apresentadas assim, de modo puro, sem firulas.

E mantendo sempre seu poder como entretenimento, amplificado por magníficas interpretações (Peter Dinklage como Tyrion Lannister é meu favorito) e por valores de produção de tela grande.

Foram 10 ótimos episódios para responder à pergunta da estréia da série – “você sabe por que está morrendo?” – e nos deixar com água na boca para a segunda temporada, no primeiro semestre de 2012.

Eu só ainda não gosto nas perucas.

E vocês, o que acham?

 


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