Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : Arrested Development

As mulheres, os mortos e os vivos: meus queridos da “TV” em 2013
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Ana Maria Bahiana

Este foi um ano espetacular para  aquilo que se chamava televisão e hoje se chama… humm.. ainda não descobriram como se chama, acho. De todo modo aqui vão 12 coisas que, na tela aqui da minha sala, mantiveram minha fé na narrativa audiovisual em qualquer plataforma…

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Breaking Bad – Porque é a perfeição e a suprema alegria para quem escreve e/ou ama a criação.

Les Revenants/The Returned – Porque oferece a primeira meditação profunda sobre a morte, a perda e a separação numa plataforma em que em geral essas coisas são vendidas a quilo, pelo valor do espetáculo.

The Bridge – Porque pela primeira vez que eu me lembre trouxe uma verdadeira história de fronteira, bilingue e bicultural, para dentro de nossas casas.

The Americans – Porque foi uma grata surpresa.

Top of the Lake – Porque abraçou o real e o surreal, o terrível e o belo, o absurdo e o lógico como eu não via desde Twin Peaks.

 Enlightened – Porque foi a série mais bem escrita e interpretada na qual poucos prestaram atenção.

 Game of Thrones– Porque tem uma ambição e uma competência que o cinema não tem mais.

 Girls – Porque eu já gostaria só porque é uma história de mulher, do ponto de vista de mulher. Mas ainda tem todas as complicações de uma geração sobrecarregada de informação e desprovida de expectativas. E por falar nisso…

 Orange is The New Black – Pelo mesmo motivo, mais uma dose de real compreensão da condição humana.

Arrested Development – Porque não perdeu nem um grama de seu delicioso absurdo. Talvez um grama. Não faz diferença.

 Mad Men – Porque continua ancorado num nível de qualidade que todo mundo tem que correr atrás.

 The Walking Dead – Porque me amarro num terror bem feito, e porque a temporada atual está voltando ao essencial da metáfora do apocalipse zumbi.

 

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E também: Drunk History, porque nunca ri tanto este ano; Time of Death, pelos mesmos motivos de Les Revenants, só que a vera; Behind the Candelabra, porque as complicações da paixão não tem rótulo; The Killing, por Peter Sarsgaard; Getting On, porque promete; Casting By, porque é um banquete pra quem gosta dos bastidores do cinema; e Hemlock Grove, porque era tão ruim que chegava a ser barroco.

Um 2014 cheio de boas histórias para todos nós!

 


A plateia no poder: o que querem dizer as vitórias da Netflix nos Emmys
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Ana Maria Bahiana

Sobre os Emmys: em primeiro lugar, calma. Respirem fundo. As nove indicações para House of Cards, e a solitária (injustamente) indicação para Jason Bateman por Arrested Development são, de fato um marco. Mas não exatamente o marco que tenho lido/ouvido por aí.

Repitam comigo: Netflix não é “a internet”. Netlflix é um sistema de distribuição de conteúdo audiovisual que apenas recentemente começou a usar prioritariamente a internet ou melhor, os meios digitais de transmissão, para que  esse conteúdo chegasse a seus assinantes.

Entre 1997, quando a Netflix foi fundada num subúrbio de Santa Cruz, California,  e  julho de 2011, quando separou as assinaturas entre “apenas online” (mais barata) e “apenas DVD”, a Netflix competia em primeiro lugar com locadoras como a Blockbuster, que distribuiam conteúdo através de mídias físicas. O sistema on demand ou instant watch – visão instantânea- não funcionava muito bem nem quando se navegava numa rede de alta velocidade, como DSL ou cabo.

A partir de 2008, quando a Netflix fechou seu primeiro contrato de exclusividade – com o Starz, um canal “tradicional” de TV por assinatura – para distribuição de conteúdo, a empresa acelerou sua decolagem na rampa online. O acordo era, na verdade, uma parceria entre duas empresas que estavam pensando além dos canais disponíveis até então. Starz e Netlflix eram, até então, versões só um pouco mais modernas da locadora de bairro: ambas  distribuíam conteúdo produzido por terceiros, ou através de DVDs, ou de um pacote de TV por assinatura.

As mudanças começaram aí. Em 2010, quando a Starz começa a lançar seu balão de ensaio em conteúdo próprio, a Netflix muda completamente sua infra-estrutura digital. Um ano depois, com seu sistema on demand funcionando plenamente, a Netlflix não muito sutilmente começa a instigar seus assinantes a optarem por receber conteúdo exclusivamente por streaming, seja ele em sua TV, computador, tablet ou smatphone.

O lógico passo seguinte – que a Starz, aliás, também dá nessa época – é investir com tudo em conteúdo próprio.

Aqui é preciso fazer dois esclarecimentos importantes:

  1. A “TV” como ela é usada no Brasil é uma criatura em vias de extinção nos Estados Unidos, esperando apenas o impacto de um meteoro cultural /tecnológico para ir fazer companhia aos dinossauros.  O segmento de público que “assiste TV”, ou seja, liga seu aparelho em determinados horários, para ver programas, notícias ou filmes segundo a grade de programação, está diminuindo a passos largos. Uma estimativa (que eu acho conservadora) diz que em 2020 77% do público de conteúdo audiovisual doméstico não “verá TV” nesse sentido. Em 2012, cinco milhões de lares nos Estados Unidos não tinham nenhum tipo de transmissão “normal” de TV, embora tivessem telas de TV _ estão recebendo conteúdo audiovisual através de streaming em aparelhos como BluRay players, computadores, tablets, consoles de games ou AppleTV.  E mesmo os que tem TV por assinatura não seguem mais a grade – programam seus aparelhos (que podem ser Blu Ray players, consoles, computadores ou hardware específico, como o TiVo) para gravar o que querem, e vêem quando querem.  Uma das grandes sacadas da Netflix foi perceber de imediato o potencial dessa mudança do mercado e começar a oferecer variedade de conteúdo para uma platéia que não tinha mais paciência para deixar que programadores lhe dissessem o que assistir, e quando.
  2. O modo como esse conteúdo é distribuído não altera sua forma ou  estética , a não ser em dois pontos: maior liberdade para exibir cenas realistas de sexo, conflito e violência, e a possibilidade do público controlar o modo como vê, segundo seus horários e disponibilidades. Fora isso, a oferta segue os formatos estabelecidos na TV tradicional: seriados dramáticos com 13 episodios de 50 minutos cada, seriados de comédia de 13 episódios de 22 minutos cada.

A Netflix não produz conteúdo, apenas licencia e distribui on demand. Seu fundador e CEO, Reed Hastings, sempre viu a empresa como uma “programadora, uma distribuidora de licenciamentos”.  A Netflix não é dona do conteúdo que disponibiliza – ela compra uma licença para distribui-lo em seu sistema durante um período X. A premiada House of Cards foi produzida inteiramente pela produtora Media Rights Group. Seu licenciamento foi um leilão, uma verdadeira guerra entre HBO e Netflix pela compra dos direitos (valor final, pago pela Netflix: 100 milhões de dólares por 26 episódios em duas temporadas).

Essa é uma diferença fundamental entre ela e o modelo HBO, com quem a Netflix gosta muito de ser comparada. A HBO é uma produtora, e é dona da imensa maioria do conteúdo original que exibe porque produz, investe nele desde o começo, em muitos casos ainda na fase de desenvolvimento. É mais parecida com um estúdio, envolvendo-se, arriscando-se e bancando projetos.

A Netflix é uma compradora astuta: House of Cards, Arrested Development, Hemlock Grove, Orange is the New Black. Mas ainda está na dependência do que o mercado pode oferecer, já pronto – e é claro que, agora, o mercado está se atropelando mais que os zumbis de Guerra Mundial Z para oferecer conteúdo. E compreendeu até onde vai o desejo de controle por parte da plateia, oferecendo as temporadas de cada um de seus títulos em pacotes com todos os 13 episódios, um procedimento impensável, até hoje, no que estamos chamando de “TV convencional”. A “TV convencional” vende tempo – o tempo que  o anunciante tem para passar a mensagem dele para os olhos, espera-se, cativos dos espectadores. A Netflix não precisa de anunciantes porque tem assinantes e compradores diretos- ela vende, estritamente, o acesso ao conteúdo.

As vitórias  da Netflix nos Emmys não querem dizer que uma nova estética foi subitamente endossada pelo establishment da TV (é isso que todo prêmio é, certo?). Quer dizer que o establishment da TV sabe muito bem que os sistemas de produção, programação e distribuição que foram inventados no século passado estão acabando de vez.


As séries de TV mais bem escritas da história (segundo a WGA)
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Ana Maria Bahiana

Qual a série de televisão mais bem escrita da história?  Segundo a Writers Guild of America, Família Soprano. Seinfeld vem logo a seguir e um favorito da minha infância, Além da Imaginação, em terceiro.

A ideia de que estaríamos vivendo uma era de ouro do roteiro de TV não tem o apoio das escolhas do sindicato: os top 10 são dominados por séries dos anos 1950- 1980. Mad Men está em sétimo lugar, West Wing em décimo, Breaking Bad em décimo terceiro, Arrested Development em décimo sexto, Daily  Show em décimo sétimo, A Sete Palmos em décimo oitavo, 30 Rock em vigésimo primeiro e Game of Thrones em quadragésimo ( na frente de Downton Abbey, Law and Order e Homeland…)  Um renascimento da dramaturgia televisiva, então?

O que mais gostei: ver Os Simpsons lá em cima, entre The West Wing e I Love Lucy, devidamente creditados por terem mudado completamente as regras do jogo da comédia, abrindo caminho para a sátira social surrealista que hoje domina o gênero na TV. Doh!

As Top 20:

1. Família Soprano

2.Seinfeld

3.Além da Imaginação

4. All in the Family

5. M*A*S*H

6. Mary Tyler Moore

7. Mad Men

8. Cheers

9. The Wire.

10. The West Wing

11. Os Simpsons

12. I Love Lucy

13. Breaking Bad

14. The Dick Van Dyke Show

15. Hill Street Blues

16. Arrested Development

17. The Daily Show with Jon Stewart

18. A Sete Palmos

19. Taxi

20. The Larry Sanders Show

A lista completa aqui. Vocês concordam?

 


Começar de novo: as novas temporadas de Arrested Development, The Killing
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Ana Maria Bahiana

 

A máxima “ não existem segundos atos em vidas americanas” (do escritor da hora, F. Scott Fitzgerald) não tem muita tração no mundo do entretenimento. Julgando pelas ofertas da temporada-pipoca, quase todos os títulos são segundos  atos(ou terceiros, ou até sextos, como Velozes e Furiosos) ou reboots ou segundos atos de reboots.

Melhor citar o químico francês Antoine-Laurent de Lavoisier: “Na natureza nada se cria, nada de perde, tudo se transforma.”

Nos domínios de TV e companhia, isso nunca foi tão verdadeiro.

 Arrested Development, a série super cult criada por Mitchell Hurwitz em 2003, foi cancelada pela Fox em 2006, depois de três temporadas premiadas, aclamadas pela crítica mas fracas de audiência. A Imagine de Ron Howard e Brian Grazer, produtora da série, tentou durante anos, transformar Arrested em filme (algo mencionado até nos últimos momentos do último episódio da terceira temporada), sem sucesso.

Corte rápido para o admirável mundo novo o conteúdo on demand, onde empresas que, dez anos atrás, ou não existiam ou eram meras locadoras/vendedoras de produtos alheios – Netflix, Amazon, YouTube—tornaram-se os novos mini-estúdios, a continuação da revolução da TV por assinatura dos anos 1980.

O filme não veio, mas a quarta temporada de Arrested Development estreou na Netflix neste domingo passado, com o mesmo formato de House of Cards, sua antecessora no departamento conteúdo original: todos os 15 episódios  disponíveis ao mesmo tempo, em todos os principais mercados (inclusive o Brasil), esperando que os fãs dediquem o maior tempo possível à série, vendo todos os episódios em seguida (e assim, de certa forma, criando eles mesmos o filme que não chegou a ser produzido.)

Vocês viram? E, se viram, viram assim?

Eu, que sou fã da série original, achei difícil emendar os 15 episódios. Há algo no humor de Hurwitz, veloz, sarcástico, satírico, denso, que pede uma pausa digestiva entre uma dose e outra. Por exemplo: a narração off de Ron Howard, perfeita em um episódio, talvez dois, torna-se quase insuportável se consumida sem pausa, seguidamente.

Fora isso, entendo e não entendo por que os críticos daqui torceram o nariz para esta nova temporada. Entendo porque, a esta altura, e com uma pausa de sete anos no meio, o frescor da novidade se foi; o tom pseudo realista/ totalmente absurdista de Arrested foi incorporado em doses diversas em outras séries; muitos de seus atores subiram em status e popularidade – Michael Cera, Jason Bateman, Will Arnett, Portia de Rossi.

Não entendo porque Arrested Development continua muito, completa, ferozmente engraçada, exata na compreensão dos modos e costumes dos Estados Unidos no século 21 e – o que para mim foi o melhor achado – incorporando na trama os sete anos de sua ausência, e tudo o que aconteceu neles.

Para uma série cujo ponto de partida foi profético – a queda iminente de um mercado imobiliário hiper inflacionado – a crise financeira de 2008 é um prato cheio do qual Hurwitz se serve fartamente. Não quero estragar a alegria de quem ainda vai curtir esta quarta temporada, mas entre os negócios de Michael (Jason Bateman), o julgamento de Lucille (Jessica Walter), as explorações místicas de George (Jeffrey Tambor) e as ambições do casal Lindsay-Tobias (Portia de Rossi. David Cross) a derrubada do poderio econômico norte americano está amplamente explicado – e nós podemos rir muito com ele.

 

A situação de The Killing é diferente. A série começou muito bem no AMC, traduzindo com impacto o clima sombrio e existencial do original dinamarquês. E então, no último episódio da primeira temporada, pisou na bola ao negar à plateia a resolução do caso que tinha sido o gancho de todos os episódios. A segunda temporada arrastou-se à sombra desse passo em falso, eclipsando tudo de bom e promissor com que a série tinha acenado.

O cancelamento, inevitável, veio logo. Mas…

Pensando na possibilidade de ainda haver alguém interessado nos poderes investigativos de Sarah Linden (Mireille Enos) e Stephen Holder (Joel Kinnaman), AMC, Fox e (olha ela aqui de novo) Netflix se uniram para, somando recursos de produção e distribuição, bancar o experimento de criar não um segundo, mas um terceiro ato para a série.

A estreia é neste domingo, dia 2 de junho, mas vi o episódio duplo de estreia e não me decepcionei. The Killing voltou ao ponto de partida, reapresentando Sarah, Holden e seu mundo, algum tempo depois dos acontecimentos das duas primeira temporadas. Holden foi promovido, Sarah foi demitida. Ambos tem novos companheiros, novas vidas mas, aparentemente, os mesmos fantasmas interiores de antes. Uma menina de rua aparece assassinada. É o bastante para abrir os porões da memória de Sarah.

O risco de tecer uma nova temporada com as mesmas pistas falsas e becos sem saída da primeira ainda é alto, mas achei encorajadora a coerência do perfil dos personagens, e o surgimento de um vilão capaz de dar aulas de como ser sinistro a todos os seus colegas atualmente na telinha: Ray Seward, um assassino condenado à morte, interpretado por  Peter Sarsgaard com uma precisão apavorante.

Agora é ver o que vão fazer com tudo isso..


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