Ana Maria Bahiana
De volta a Los Angeles em plena modorra pós-prêmios, pré-pipoca, quebrada apenas por dois escândalos de natureza sexual: as alegações de estupro contra o diretor Bryan Singer, bem na hora em que seu novo X Men vai estrear, e aquela cena no último episódio de Game of Thrones.
Estou acompanhando o primeiro com luvas e máscara cirúrgica , para evitar tanta poeira tóxica. O segundo é uma obra de ficção, claro – e eu já havia alertado aqui que esta temporada continha uma das cenas mais perturbadoras de toda a história da TV. Não vou ficar falando muito por conta dos famosos SPOILERS. Mas para mim estes são os pontos principais:
– entendo a reação aqui, nos EUA, por conta de um elemento específico – a TV (e o cinema) sempre usaram a violência contra a mulher quase como um cacoete narrativo, um default, e recentemente esta forma particular de violência – o estupro – tem sido usada com ainda mais frequencia.
– O mundo criado por George R. R. Martin em sua saga é brutal como nós éramos na antiguidade e na idade média (e como, infelizmente, ainda somos, apesar de todo nosso verniz de civilização…). Dentro dos horrores já perpretados pelos personagens de Game of Thrones, a tal cena do episódio passado faz sentido.
– Sim, a cena está nos livros mas tem uma perspectiva diferente do que aconteceu no episódio. GRRM está meio que saindo de fininho quanto às alterações que os criadores da série se permitiram fazer, mas numa coisa ele tem razão – no seu texto a cena é contada do ponto de vista de Jaime. Na série, texto e direção se colocam de fora, num terceiro ponto de vista. Seria esse ponto de vista o mais exato sobre o que realmente se passou naquele momento? (Tomando “realmente” com certa licença, claro – estamos falando de Westeros…)
De todo modo, esse bate boca me lembrou, mais uma vez, quem realmente está puxando este trem: a TV, ou aquilo que a gente costumava chamar de TV. Este tipo de discussão, que nasce espontâneamente (e não como marketing viral…) como resultado do eco de uma representação fictícia que cutuca problemas reais, costumava ser, aqui, algo que o cinema era em geral capaz de fazer.
Ainda hoje duas notícias importantes confirmaram o avanço da TV como quem comanda o mercado. A HBO, sempre tão ciosa com a originalidade e o controle do seu conteúdo, acaba de fechar uma parceria de distribuição exclusiva com a Amazon . Isso é a mesma coisa que, vinte anos atrás , uma produtora independente como a Miramax ou Working Title fechando com uma Disney ou Paramount. O peso que a notícia está tendo na midia e nas conversas demonstra claramente para onde o business está indo.
E tem mais: suprindo uma lacuna que o cinema sempre tentou mas nunca conseguiu atender direito, a Netflix está anunciando sua primeira produção inteiramente em espanhol, produzida inteiramente no México, com elenco latino americano, e dirigida pelo mexicano Gaz Alazraki, responsável por um dos maiores sucessos de bilheteria en español, a comédia Nosotros Los Nobles. Ainda sem título e com estreia prevista para 2015, a série de 13 episodios se passa no mundo do futebol profissional. Ou seja: gol de placa.
Mais TV no próximo post, com a minha nova série-obsessão…