Blog da Ana Maria Bahiana

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Uma conversa com Duncan Jones: “Sci Fi é um modo de abrir mentes”
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Ana Maria Bahiana

Michelle Monaghan e Jake Gyllenhaal em Contra o Tempo...

...e Duncan Jones no set.

Um homem acorda num trem e não sabe quem é. Sua derradeira lembrança é estar numa missão de combate sobre o Afeganistão, no comando de uma aeronave militar, seus companheiros de tropa a bordo, fogo inimigo cerrado a seu redor. E agora uma moça bonita conversa com ele sobre trivialidades de trabalho com um vago ar de intimidade e flerte, enquanto uma passageira derrama café no seu sapato e o condutor anuncia que o destino final é Chicago.

Estes são os emocionantes 10 minutos de abertura de Contra o Tempo (Source Code, estreando hoje nos EUA, dia 17 de junho no  Brasil), o primeiro filme de Duncan Jones desde o sucesso  de Moon e sua estreia no esquema grande produção hollywoodiana. Contra o Tempo é um roteiro original do estreante Ben Ripley, desenvolvido sob medida para ser estrelado por Jake Gyllenhaal no papel do piloto, Colter Stevens.

Poderia ter sido complicado e frustrante – para Duncan Jone e para a plateia – mas não é. É imensamente humano, intrigante – em grande parte porque, como Jones relata aqui, descobrimos juntamente com o protagonista o que está se passando, cada nova descoberta adicionando uma camada nova de mistério, de urgencia, de tragédia. Revisitando um território que já atravessou em Donnie Darko, Gyllenhaal mostra-se um excelente companheiro de aventuras para Jones, cúmplice em sua mistura bem calibrada de suspense, humor e drama.

De passagem por Los Angeles para promover o filme, Duncan Jones sentou-se no pátio  ensolarado de um hotel de luxo e contou um pouco sobre seu caminho de “filho de David Bowie” a “diretor cult”, suas crises de identidade, seu amor pelo cinema em geral e ficção cientifica em particular – e como fazer homenagens a Ray Harryhausen com Smurfs e uma câmera super 8 operada por… David Bowie…

Contra o Tempo não é um roteiro seu _ por que você aceitou dirigi-lo?

_ Porque eu vi que podia acrescentar alguma coisa. Quando Jake me deu o roteiro, eu imediatamente gostei do material, a temática se alinhava com meu ponto de vista. Mas era um pouco pesado, muito sério, todo mundo se levava a sério demais. Faltava leveza. Se injetarmos humor, pensei, isso vai ajudar a plateia a acreditar na tecnologia. Jake concordou imediatamente. Ben Ripley pesquisou a fundo para escrever o roteiro e por isso ele focalizou tanto nos detalhes científicos, explicando muito como o “source code” funciona. Isso é importate para ele, como roteirista, eu compreendo perfeitamente. Mas para meu trabalho como diretor o mais importante é que a plateia abrace inteiramente, sem restrições, o conceito. E para isso eu não precisava dar uma aula, tinha que engaja-los pelo lado humano, e o humor é muito eficiente para isso,

O que pelo contrário atraiu você, sem pedir modificação?

_ O ritmo. De cara eu amei o ritmo da narrativa. A quantidade de pistas possíveis e como elas brincam com nossos preconceitos e ideias. O modo como o espectador adivinha situações e aprende o que está se passando no mesmo ritmo que Colter. Isso é muito importante para qualquer filme que tenha um elemento de thriller, de mistério.

É interessante como, mesmo não sendo um roteiro seu, Contra o Tempo continua a discussão de identidade e auto-reconhecimento que você levantou em Moon

_ Acho que é um dos assuntos que mais me interessa: a ideia de identidade, a pessoa que você é e a pessoa que os outros vêem. Acho que todo mundo algum dia se preocupou com isso em algum momento de suas vidas. Eu passei por isso tremendamente no final da minha adolescencia e nos primeiros 20 anos, tentando descobrir quem eu era e qual era meu lugar no mundo. Eu parecia destinado a ser uma coisa e percebi que… não era verdade. Eu era outra pessoa.

Que pessoa era essa que você deveria ser?

_ Eu estava cursando universidade e, depois, pos-graduação com o objetivo de ser professor de filosofia. O que obviamente eu não sou. Demorou muito tempo para eu aprender que aquele não era meu camiho, e as vezes lamento o tempo perdido. Mas, ao mesmo tempo, esse aprendizado e essa experiencia me fizeram a pessoa que sou hoje, capaz de me ocupar de outras formas da questao da identidade.

O tema da identidade também é central na obra de seu pai, que a discutiu de muitos modos em sua obra. Ele ajudou você neste periodo de dúvida?

_ Ajudou tremendamente. Ao longo de sua carreira ele viu muitas pessoas decolarem e despencarem e esse exemplo marcou muito o modo como ele encara a carreira dele, e como ele pode dar apoio à minha. Acho que minha sorte também é que nunca fui do tipo ultra-social, super-popular. Sempre fui um geek estudioso e preocupado com o trabalho. Ser ultra-social pode ser um perigo quando se está desorientado na carreira. Aí seim você se perde, perde todo o seu tempo fazendo nada e, possivelmente, metendo-se em encrencas.

Seu pai influenciou sua carreira?

_ No sentido de pai para filho, sim.  O trabalho dele é algo que sempre admirei e sempre respeitei imensamemte, mas acima de tudo ele é meu pai, e sua influencia é naquilo que ele me mostrou, nas experiencias que me proporcionou. Eu fui apresentado  a Stanley Kubrick porque meu pai não parava de ver Laranja Mecânica quando eu tinha 8 anos… e era provavelmente jovem demais para isso… E minha paixão por ficção cientifica vem dos livros que meu pai me deu, George Orwell e John Wyndham..

Quando você descobriu que queria ser diretor?

_Uma coisa eu sabia: que não ia ser músico. Nunca fui nada musical… Meu pai e eu brincávamos de fazer filmes desde que eu era moleque. Ele é fã de Ray Harryhausen e me mostrava os filmes dele. Tentávamos fazer o mesmo com uma velha câmera super 8 e meus bonequinhos de Guerras nas Estrelas e  Smurfs, nossa versão de animação stop-motion… Isso rapidamente se tornou um hobby pra mim, o hobby que me ocupava mais na faculdade que meus próprios estudos…

Qual é o poder da ficção científica, para você?

_É a capacidade de colocar várias hipóteses na nossa frente de um modo que podemos aceitar aquilo que, de outra forma, nos pareceria impossível ou até mesmo ridículo. É o modo mais perfeito para desafiar a plateia a aceitar coisas muito diferentes de suas próprias vidas, a rever seus conceitos, a abraçar o estranho, o improvável. É um modo de abrir mentes.


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