Blog da Ana Maria Bahiana

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Danny Boyle fala sobre 127 Horas: “É um thriller, um drama e não uma reflexão pastoral”
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Ana Maria Bahiana

Estréia amanhã aqui nos EUA  127 Horas, o novo filme de Danny Boyle  que, me  parece, bateu o recorde de O Exorcista em número de pessoas passando mal no cinema (e antes mesmo  de ir para o circuito comercial!).

Seria pena se 127 Horas entrasse na narrativa do cinema apenas como provedor de sustos e horrores – como o filme de William  Friedkin foi, no início. É um belo filme, uma jornada interior traduzida em imagens.

Achei que seria uma boa ocasião para deixar o próprio Danny Boyle falar _ Boyle passou feito um relâmpago por Los Angeles para promover a estréia norte americana de 127 Horas_ e depois, de volta a Londres onde está adiantado o desenvolvimento de mais um Extermínio (desta vez, 28 Months Later, e Boyle, além de produtor, quer pilotar a direção).

AVISO: se você realmente não sabe quem é Aron Ralston e o que aconteceu com ele em maio de 2003 – e que inspirou seu livro Between A Rock and A Hard Place e 127 Horas – você tem duas opções: se informar ou  ler esta entrevista sem entender muito bem o que estamos debatendo (porque, como disse antes, não vou ser eu quem vai contar…)

Você estava trabalhando nesse projeto há muito tempo?

_ Acompanhei o acidente de Aron pela mídia e li o livro dele. Mas foi quando conheci Aron em 2006  que senti que havia um filme ali. Conversei na época com Christian (o produtor Christian Colson, parceiro de Boyle em seus projetos) e ele não concordou. Queria fazer um documentário, e eu sempre quis fazer uma narrativa na primeira pessoa, uma experiência de imersão na jornada interior de Aron _ que, para mim, sempre foi o mais fascinante. Na minha cabeça o que eu queria era estar no canyon com ele, em seus pensamentos, suas alucinações… Escrevi uma sinopse e finalmente convenci Christian. E aí veio o sucesso de Quem Quer Ser Um Milionário e de repente algo que podia ser muito difícil se tornou possível…

Muita gente não teria a mesma visão que você. É um drama tão  individual, tão pessoal, um homem preso no fundo de um canyon…

_ Exatamente, por isso imediatamente eu vi uma narrativa completamente imersiva, em que as pessoas pudessem estar naquele canyon com ele e… sei que parece pretensioso mas.. eu vi que o único modo que a história poderia funcionar seria se o público pudesse, por assim dizer, ajudar Aron a fazer o que ele precisa fazer. Porque de outro modo…. Eu teria multidões saindo correndo do cinema, berrando “isso é insuportável, não consigo ver uma coisa assim!”..

Algumas pessoas estão passando mal mesmo assim…

_ Bom, não dava para não mostrar o momento que, nas palavras do próprio Aron, mudou e redefiniu a vida dele. Eu precisava honrar esse momento, a coragem dele. E não podia ser um segundinho e cortamos para ele fora do canyon. Na realidade ele levou 44 minutos fazendo o que fez. Era fundamental manter essa perspectiva e, mais uma vez, colocar o público junto com ele.

Como você escolheu James Franco para viver Aron Ralston? Fisicamente, não há muita semelhanca, pelo menos à primeira vista..

_ Mas há uma tremenda conexão emocional. James tem um tremendo senso de humor, e uma enorme capacidade dramática. É um espectro de desempenho muito vasto , ele pode nos levar ao drama e ao sofrimento e ao mesmo tempo ser um palhaço, brincar. Quando se passa um tempo com Aron você vê que ele é exatamente assim.

Você é uma pessoa que curte montanhismo, aventura, esportes radicais? A natureza é um grande personagem de 127 Horas.

_ Sou uma pessoa completamente urbana. Simon (Beaufroy, roteirista) é que gosta de escalada e acampamento. E foi por isso que pensei nele em primeiro lugar para fazer o roteiro comigo. Eu acho que, como espécie, nós, humanos, gostamos de estar juntos. Há algo no nosso DNA que nos compele a buscar uns aos outros e por isso estamos em geral aglomerados em cidades. Mas em toda tribo há os outsiders e na nossa, muitas vezes, são pessoas como Aron, que só se sentem realmente felizes sozinhos na natureza, e que, acho, nos desprezam um pouco.  Não pude deixar minha sensibilidade urbana de lado _ filmei 127 Horas com uma linguagem completamente urbana, dinâmica. Para mim é um thriller e um drama pessoal, não uma reflexão pastoral sobre a natureza.

127 Horas estréia dia 18 de fevereiro no Brasil. Volto a esta entrevista, com mais detalhes da produção, nessa época.


Só para os fortes: vem aí o cinema-claustrofobia
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Ana Maria Bahiana

Não sei se poderíamos chamar de sub-gênero, mas dois filmes de alta visibilidade que estarão em cartaz en breve nos EUA tem tanto em comum que não resisto a chamá-los de cinema claustrofobia: Buried (Enterrado Vivo), que estreia neste fim de semana (12 de novembro no Brasil) e 127 Hours (127 Horas), que vai para as telas, aqui, dia 5 de novembro (18 de março no Brasil). Um é cem por cento ficção, o outro baseia-se em fatos reais. Ambos são criaturas da produção globalizada de hoje,  co-produções entre estúdios independentes de luxo norte americanos e empresas europeias. Ambos têm um único protagonista em, praticamente, um único cenário, foram dirigidos por europeus- o espanhol Rodrigo Cortés e o inglês Danny Boyle- trabalhando com orçamentos reduzidos e tecnologia de ponta, capaz de suplantar os apertos financeiros com engenho e arte.

Os dois se seguram em fiapos de narrativa, às vezes titubeiam e muitas vezes alcançam  momentos de alto brilho . Mas, mais importante, ambos são muito bons _ embora não aconselháveis para pessoas impressionáveis, como se dizia antigamente.

Enterrado Vivo é meu favorito.  A espoleta da narrativa é tão absoluta que, muitas vezes, parece forçada – mas outros filmes já gastaram muito mais dinheiro e tempo de nossas vidas com muito menos… Paul Conroy (Ryan Reynolds) é um motorista de caminhão trabalhando no Iraque  na entrega de suprimentos. Quando seu comboio é atacado, Paul é nocauteado e acorda num caixão  enterrado em algum ponto da área de conflito, com um celular, um isqueiro e um cantil. Vozes diversas, ao telefone, alternam-se ao longo dos concentrados 90 minutos do filme (o tempo que Paul  tem de oxigênio em seu cativeiro) .  Algumas, ameaçadoras, explicam que ele é um refém cuja libertação custa, em princípio, muitos dólares  (as exigências aumentam com o passar do tempo); outras, indiferentes ou compassivas, vão compondo a reação do mundo da superfície à tragédia de Paul.

O diretor Rodrigo Cortés – que filmou Enterrado Vivo na Espanha pelo ínfimo orçamento de 3 milhões de dólares – mantém o olhar do filme estritamente dentro dos limites do caixão. É um feito que daria orgulho a Alfred Hitchcock e que, para muitas pessoas da plateia, causa acessos muito reais de falta de ar. A espetacular fotografia de Eduard Grau (cujo talento vimos recentemente em A Single Man) explora cada ângulo possível para manter a composição ao mesmo tempo clara e opressiva. E como o roteiro (do americano Chris Sparling) é fictício e define Paul como um civil sofrendo as consequencias da guerra alheia, a conexão com a plateia é muito fácil, ultrapassando posturas políticas e indo direto ao coração humano da trama – e Ryan Reynolds trabalha esses contornos com enorme talento.

127 Horas baseia-se numa história verdadeira : em maio de 2003 o engenheiro civil e  alpinista Aron Ralston, de 28 anos, sofre um acidente num remoto canyon do Utah, e se vê aprisionado no fundo de uma ravina, a mão direita esmagada por uma enorme rocha. Aron sobrevive cinco dias – as 127 horas do título – nessas condições, até , em desespero, sem víveres e sem água, tomar uma decisão excruciante para salvar sua vida. Se você não sabe o que é, não vou contar – basta dizer que é dramático o bastante, no filme, para enviar pessoas mais sensíveis direto para o banheiro.

Boyle faz o que pode para elevar a narrativa acima do desesperador tédio de cinco dias solitários no fundo de um cânyon – Aron (James Franco) monologa, alucina, relembra. Como Boyle e seu co-roteirista Simon Beaufroy estão trabalhando com fatos reais, eles não têm a liberdade de Enterrado Vivo para armar tramas paralelas nos momentos cruciais, de forma a segurar o espectador. O foco precisa se manter inteiramente em Aron – e seu estoicismo, típico de alguém com grande preparo físico e íntimo conhecimento da natureza, muitas vezes parece indiferença ou até mesmo arrogância. Crédito a Boyle e aos DPs Enrique Chediak e Dod Mantle por criarem mini-poemas visuais de intensa beleza pontuando as 127 horas da provação de Aron, e por se recusarem a levar o filme para a apelação. Quando acidente e solução final acontecem, é com a exata simplicidade e até rispidez com que essas coisas realmente têm.

Para espíritos fortes, recomendo ambos.


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