Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : Rubicon. Jon Hamm

Nos finais de Mad Men e Rubicon, a inteligência contagiosa da TV
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Ana Maria Bahiana

Duas séries importantes tiveram seus episódios finais neste domingo, aqui, e estou devendo meus comentários. Tenho, contudo, uma ótima desculpa: só agora estou me recuperando de um ser daninho (vírus, bactéria, mini-alien, quem sabe?) que me derrubou esta semana.

Como é quase impossível falar sobre ambas sem revelar alguma coisa sobre seu conteúdo, já vou avisando que, se você é totalmente alérgica/o a  qualquer informação sobre algo que não viu, talvez deva ir para outro post. Prometo fazer o máximo para evitar os odiados SPOILERS, mas nunca se sabe…

Mad Men, primeiro. A quarta temporada começou com uma pergunta _ “Quem é Don Draper?” _ e terminou com a canção “I got you, babe”, de Sonny and Cher, hit pop teen de 1965. A pergunta não foi inteiramente respondida, mas, com certeza, foi explorada minuciosamente nos 13 episódios que levaram Don Draper-Dick Whitman (Jon Hamm) a duelar entre si com a fúria de um Dr. Jekyll e um Mr. Hyde, cada um o monstro do outro, a persona inventada rachando sob a pressão de várias rejeições – divórcio,  a instabilidade da nova agência – e o caipira desertor exigindo afeto, refúgio, perdão. Passado e futuro chocaram-se ruidosamente, repercutindo, no nível pessoal, as mesmas encruzilhadas que começavam a se delinear para toda a sociedade: fumar ou não fumar?, maconha ou heroína?, guerra fria ou guerra quente?, pílula ou aborto?

Foi uma temporada para Jon Hamm mostrar tudo o  que é como ator, capaz, como disse o criador Mathew Weiner ,de “modificar o rosto e a postura de tal modo que parece que sua própria estrutura óssea mudou”. Quando Anna (Melinda Page Hamilton) o chama de “Dick”, tudo nele muda, há uma regressão, um olhar de menino abandonado, uma humildade e uma humanidade que Don Draper, super-herói da Sexta Avenida, desconhece.

Foi também a temporada das mulheres:  Peggy Olson (Elizabeth Moss), avançando na vida e no trabalho como sua geração de fato faria; a Dra. Faye Miller (Cara Buono) mostrando-se igual, ombro a ombro, com Don (provocando uma mistura de fascínio e terror que foi um dos grandes ímãs da temporada); e Sally, ah! minha querida Sally! (Kiernan Shipka) anunciando o que as mulheres seriam mais adiante, emergindo da infância de conforto material e abandono emocional nos subúrbios para uma nova identidade nos anos 70.

No final, Don resolveu o conflito com Dick saindo pela tangente, como tantos homens de sua geração _ e além. Na última imagem da quarta temporada ele olha para a janela – o futuro- enquanto a escolha que fez dorme ao seu lado. Há uma outra pergunta em seu olhar, e ela pode muito bem ser a mesma que abriu a série.

Rubicon também terminou com um homem só, enfrentando um monstro que tentara decifrar durante toda a temporada. A diferença é que , para Will Travers (James Badge Dale), o monstro está fora; sua alma e sua intenção são claras e precisas, e seu conflito é com a areia movediça da “comunidade de inteligência” na qual trabalha, e da qual nunca pensou suspeitar.

Faltou à série a qualidade de roteiro que sempre foi o sustento de Mad Men – a narrativa custou a engrenar, pedindo ao  espectador um tempo e uma paciência difícil de obter na telinha. Quem persistiu, ganhou – Rubicon complicou-se maravilhosamente do episódio 5 em diante, e teve uma arrancada fascinante em seus três últimos episódios, com Will na situação clássica dos thrillers políticos dos anos 70: o único homem honesto que compreende inteiramente o que está acontecendo, mas pode fazer quase nada.

No momento em que escrevo, não se sabe se a AMC vai ou não encomendar mais 13 episódios de Rubicon – mas, em nome da cada vez mais contagiosa inteligência da TV, torço que sim.


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