Blog da Ana Maria Bahiana

As perguntas e reflexões do Oscar da saudade

Ana Maria Bahiana

Billy Crystal e o palco art deco do Oscar 2012...

..e uma das inspirações.

Hoje (segunda feira) Los Angeles amanheceu nublada e chuvosa. A frente fria, estacionada sobre o Pacífico, devia estar esperando o ok da Academia para só se instalar sobre a cidade depois dos Oscars (como reza a escrita aqui, o jabá dos produtores com os deuses do clima é poderoso).

O que se fala na cidade depois de um Oscar previsível:

 

A perna de Angelina Jolie, o bico do seio de Jennifer Lopez (que teria saltado do seu profundo decote e levado àquela apresentação inusitada, centrada na derriere…)

Como foi sem graça a pegadinha de Sacha Baron Cohen jogando as “cinzas de Kim Jong Ill” em Ryan Seacrest.

Com oito indicações convertidas em estatuetas os Weinsteins estão de volta mesmo. Conseguiram vender o peixe de um filme mudo e preto e branco, francês e com atores desconhecidos. E quebrar o encanto das 17 indicações infrutíferas de Meryl Streep. (O inferno não tem fúria como uma mulher desprezada, já dizia Shakespeare. Não subestimem a frustração de Meryl com estes anos todos na plateia, que alimentou, e muito, a arrancada de divulgação das duas semanas anteriores ao Oscar.)

Os discursos de Meryl e de Christopher Plummer, classudos, levando a sério o trabalho mas não a si mesmos;  a delicadeza de Meryl com o marido Don Gummer e o fiel colaborador J. Roy Helland, seu maquiador desde A Escolha de Sofia.

Lição de casa para a Academia: repensar, reimaginar, re-energizar a festa. O evento não foi exatamente um espetáculo de dinamismo e inovação (montagens demais, muitas gracinhas sem graça, clima ''velho'') mas pelo menos a audiência melhorou um tiquinho, comparada com 2011 (mas piorar ia mesmo ser muito difícil). Mas o Oscar 2012 ainda está abaixo do indice de 2010 e, apesar da piadinha com Justin Bieber na montagem de abertura, perdeu ainda mais a cobiçada fatia entre 18 e 24 anos. Em termos de eventos de prêmios, os Grammys ainda são o melhor show e a melhor audiência – mas tem a seu favor o próprio material que premiam, a música, bem mais fácil de se traduzir em espetáculo. Entre a segurança do evento deste domingo (que, vocês se lembram, foi organizado às pressas depois de crises e demissões de seus cabeças originais, o produtor Brett Ratner e o apresentador Eddie Murphy) e a novidade-pela-novidade de 2011, há espaço para muita coisa. Dois apresentadores, aliás, pareciam estar fazendo teste para um convite ano que vem: Emma Stone e Chris “a fim de voltar” Rock.

Aliás: os atores especializados em dublar animação estão furiosos com Chris e seu discurso “dublar animação é moleza”.

Como esta é uma industria de redundâncias não esperem muitos filmes preto e branco e mudos (em 3D?) no futuro imediato, mas o tema “era de ouro do cinema” não vai morrer tão cedo.

Jean Dujardin, o beijoqueiro, entre o Oscar...

..e a esposa, no Governors' Ball.

O que todo mundo quer saber: o que tantos “primeiros” (França, melhor filme, ator e tudo mais; Irã, melhor filme estrangeiro; Paquistão, melhor longa documentário) vão fazer agora, depois de suas vitórias históricas. Não esperem ver Asghar Farhadi batendo em portas em Century City (onde ficam as grandes agências da cidade) : seu compromisso com o cinema iraniano é firme, comprovado por suas declarações nos bastidores (“Minha vitória não é uma mensagem para o povo do Irã além do fato de que continuo acreditando que a cultura é o que o mundo mais deve cuidar e produzir. Se pudermos nos ver uns aos outros pelo prisma da cultura, vamos nos ver melhor, mais nitidamente.”) Saving Face, o curta documentário do Paquistão, vai ao ar pela HBO em março, e esperem ver sua diretora Sharmeen Obaid-Chinoy em outros projetos não-ficção do canal. A dúvida maior é quanto a Jean Dujardin – que teve grandes dificuldades no início de sua carreira porque os diretores de elenco achavam seu visual “antiquado” – e Michel Hazanavicius – cujos filmes anteriores passaram em brancas nuvens pelo mercado internacional. As armadilhas desta cidade são muitas e tentadoras…

E no fim das contas o Oscar da saudade do que não foi vivido se resumiu a um grupo de franceses re-imaginando o que teria sido a primeira hora de Hollywood, e um diretor norte-americando sonhando com o que teria sido a primeira hora do cinema em seu berço francês…