Ausência de favoritos pode ajudar Harry Potter?
Ana Maria Bahiana
Mais um mês se passou e ainda não apareceram os super-favoritos que, nos anos anteriores, definiam a corrida do ouro. Vocês se lembram, não é? Sangue Negro ou Onde os Fracos Não Tem Vez? Crash ou Brokeback Mountain? Avatar ou Guerra ao Terror? Benjamim Button ou Quem Quer Ser Um Milionário? A Rede Social ou O Discurso do Rei?
Para fãs, isso pode ser um fator empolgante na disputa deste ano. Para os estrategistas, o vazio tem cor e cheiro de oportunidade: a impressão é que, com pouco mais de um mês até as indicações para os Globos de Ouro e 70 dias das indicações para o Oscar, tudo pode acontecer.
Depois de ver alguns títulos que estavam no balaio de possibilidades – mas impedida, por embargos diversos, de dizer algo a respeito, agora – posso adiantar que a lista original encolheu um pouco. Por outro lado, cresce o burburinho em torno de Young Adult – que não vi ainda-, retorno da dupla Jason Reitman (diretor)- Diablo Cody (roteirista).
A falta de francos favoritos entre as opções de costume – independentes, independentes de luxo e lançamentos “de prestígio” dos estúdios, principalmente dramas, de preferência de época – pode levar a uma interessante resolução: a premiação de quem menos se esperava, em circunstâncias habituais. Quem se lembra de O Silêncio dos Inocentes em 1992? Lançado em fevereiro de 1991, o thriller de Jonathan Demme disparou na última hora exatamente porque seus rivais – Bugsy, JFK, O Príncipe das Marés e A Bela e a Fera (que aliás entrou na lista pelo mesmo motivo) – não tinham aquele “algo mais” que define o franco favorito.
Mais recente e mais adequada como comparação, a vitória de O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei em 2004 nasceu exatamente do mesmo impasse, a falta de poder de fogo da competição (Sobre Meninos e Lobos, Encontros e Desencontros, Mestre dos Mares e Seabiscuit-Alma de Herói).
Acho ainda mais interessante que Retorno do Rei tenha levado tanto o Oscar quanto o Globo de Ouro. O corpo votante dos Globos é menor e mais difícil de prever, impulsionado por preferências pessoais e culturais (afinal, somos todos correspondentes estrangeiros…). Já os Oscars e os prêmios das Guildas representam o consenso da indústria, dos colegas, de quem faz os filmes concorrentes. Suas escolhas revelam um tanto do, digamos assim, subconsciente do ofício: o que se faz é uma coisa, o que merece prêmio é outra.
Quando nenhum título das categorias previsíveis – drama, filme de época- tem a capacidade de gerar admiração sem reservas, sobem as chances de filmes que a indústria faz em grande volume mas quase nunca acha que merecem honra especial – thriller, fantasia, sci-fi.
Quem se beneficia este ano? Harry Potter e As Reliquias da Morte, parte II. É, até agora, uma unanimidade inquestionável de crítica, público e, sobretudo, apreciação de seus pares na indústria. Seria também um modo de reconhecer uma década de trabalho de superior qualidade realizado por uma equipe extremamente talentosa. E, para a platéia, uma supresa gostosa num ano até agora imprevisível.