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Como Smash se transformou em Glee para adultos
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Ana Maria Bahiana

Vocês estão começando agora a ver Smash, não é? Sinto muito, mas tenho o pior dos spoilers pra vocês: a série vai piorar um bocado, daqui para frente.

Aqui nos EUA Smash está no ar desde 6 de fevereiro e vai até 14 de maio. Por um instante não muito breve esteve ameaçada de cancelamento. Foi renovada de raspão, com o sacrifício de uma cabeça: a da showrunner Theresa Rebeck, roteirista, autora e dramaturga com experiência na Broadway.

A crítica, que abraçou entusiasticamente a série na estréia, está chamando Smash de Glee para adultos (dica: isso não é um elogio…). Depois de uma estréia com 11.4 milhões de espectadores, a audiência despencou mas finalmente estabilizou-se em 7.7 milhões de espectadores; entretanto,  apenas um terço dessa audiência está na cobiçada faixa 18 a 49 anos. É um impasse sério para uma série que começou ambiciosa – os bastidores da Broadway! Grandes números musicais! – e cara – o piloto custou $ 7.5 milhões de dólares, o equivalente à produção de um filme independente.

Para entender o nó da questão de Smash é preciso acompanhar o projeto desde sua origem _é um estudo fascinante de como as mídias se diversificaram e especializaram, e como uma ideia sela seu destino cada vez que escolhe um caminho nas muitas encruzilhadas de seu desenvolvimento.

Smash começou em 2008 como mais uma das ideias ousadas mas complicadas de Steven Spielberg : de olho na Broadway, onde a Disney emplacava um sucesso atrás do outro adaptando filmes para o palco, Spielberg pensou que o caminho oposto poderia ser interessante. Que tal uma série de TV na qual cada episódio fosse a concepção e montagem de um musical? E que tal se cada um desses musicais fosse produzido de verdade, no palco?

Por mais maluca que a proposta pareça ser, uma pessoa acreditou nela – talvez porque seja difícil dizer “não” a Spielberg. Em 2009 Robert Greenblatt, então presidente do canal a cabo premium Showtime, topou ir adiante com o projeto, com alguns ajustes: em vez de um musical por episódio, a série se concentraria nos bastidores de uma grande produção da Broadway, focalizando as vidas, personalidades, desejos e conflitos de quem cria, escreve, compõe, produz e interpreta os musicais. A referência que Greenblatt deu a Speilberg foi, supreendentemente, a série política The West Wing, de Aaron Sorkin: o mesmo olhar sobre as vidas secretas por trás de atos muito públicos.

Quando, em janeiro do ano passado, Greenblatt migrou da Showtime para o posto supremo da rede NBC – perpetuamente enfurnada no quarto lugar entre as quatro grandes e desesperada por sangue e ideias novas – ele resolveu levar Smash consigo. E aí está a raiz do drama da série: TV a cabo, especialmente num canal premium, e TV aberta são modelos financeiros e estéticos tão diversos quanto um filme autoral, independente, e a próxima franquia de super heróis.

Um canal como a Showtime vive exclusivamente para atender o gosto da platéia. É altamente segmentado _ 7.7 milhões seria uma platéia enorme e até um pouco problemática, por ser difícil de entender e atender. Na faixa dos 2, 3 milhões de espectadores o canal tem a liberdade de saber com quem está falando e não depender de anunciantes como fonte de renda. O que Grenblatt temia era que o custo por episódio estivesse acima do bolso do canal – Showtime ainda é a prima pobre da HBO, e não dá para pensar em algo na escala de, digamos, Game of Thrones ou Boardwalk Empire.

Para ter a grande platéia da TV aberta, Smash teria que fazer concessões. Menos bastidores e mais dramas pessoais (Bebês! Casos! Traições! Fofocas! Drinques jogados na cara!). Menos material original – os números musicais da peça em produção, sobre Marilyn Monore, são todos compostos por Michael Shaiman e Scott Wittman – e mais covers de canções conhecidas. Uma aparição de Nick Jonas – cantando, é claro – para atrair a plateia entre 18 e 39 anos (a aparição foi tão forçada quanto aquele Justin Bieber na abertura do Oscar deste ano…).

É nessa encruzilhada que a série se encontra, agora . O episódio da semana passada, com um desesperado número musical “moderno”, vagamente Lady Gaga , valeu como um meta-comentário: na série, o musical está ameaçado e precisa de uma grande estrela popular para salvá-lo; na vida, digamos assim, real, sua ousadia e visão podem estar se mostrando demais para os limites da selva da TV aberta.

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