Sexta temporada de Mad Men: passando pelo portal
Ana Maria Bahiana
Como o perfume das flores do Havaí, que serve de moldura ao primeiro episódio da sexta temporada de Mad Men, a morte é uma presença constante e sutil nas vidas dos publicitários da Sterling Cooper Draper Pryce. O episódio de duas horas se chama “O Portal” (“The Doorway”), e começa subitamente com imagens tensas do que pode (ou não) ser uma pessoa tendo uma grave emergência médica.
Corte súbito para o Havaí , onde Don Draper foi, com Megan, tirar umas “férias” pagas por um grande hotel, a pretexto de se inspirar para a próxima campanha publicitária do estabelecimento. Em cores de cartão postal dos anos 1960, enquadrada entre azuis e flores tropicais, o vulcão adormecido Diamond Head ao fundo, a praia de Waikiki e seu luxuoso resort sugerem uma versão de consumo do paraíso _ Don e Megan estão suspensos numa outra realidade, longe dos “eus” que deixaram em Nova York, abertos, quem sabe, a outras possibilidades. Vai um baseado? Vai um confronto com a crise da meia idade? Há também drinques exóticos, um casamento e um eco do passado de Don, que volta à Avenida Madison mais bronzeado mas tão insatisfeito quanto antes.
Os screeners de “O Portal” vieram acompanhados da cartinha mais enjoada que o famosamente enjoado Matthew Weiner já mandou para nós, pobres vassalos da imprensa. Nela ele “pede” (ordena, na verdade) que não se diga o ano em que a nova temporada se passa, qual a decoração da agência, não diga se há novos personagens e se os personagens antigos tem novos relacionamentos. Sou de paz, mas digo: levando em conta as referências a livros, programas de TV, capas de revista, vocabulário (“hippies”) e o abundante maconhal que pontua várias cenas, Weiner está sendo muito bobo – é claro que a sexta temporada se passa entre o final de 1967 e um bom trecho de 1968, o período dos grandes terremotos culturais, políticos, sociais e existenciais que sacudiram os Estados Unidos e o mundo. O que farão, neste mundo em ebulição, os quarentões da chefia, os trintões que eram jovens ambiciosos no início da série, as mulheres cujo espaço se amplia, trazendo mais oxigênio e mais veneno, também?
Por enquanto, neste episódio de abertura, estamos no portal. Há uma bebedeira homérica, uma interessante festa de ano novo e duas mortes, não tão súbitas e trágicaa como as anteriores, mas com intensas repercussões emocionais. Sally avança pela adolescência e Betty tem um vislumbre do que é a tal da contracultura. Megan faz o papel de empregada numa novela ( e assina autógrafos para fãs); Peggy não tem mais nenhum receio de impor sua autoridade; Roger experimenta a psicanálise, e Don , num de seus momentos de brilhantismo, tem um ato falho que mostra exatamente por onde anda sua cabeça.Num dos momentos definidores do episódio, um fotógrafo diz a ele, inocentemente: “Seja você mesmo”. É a pergunta-tema da noite…
Como Os Sopranos -escola de treinamento de Weiner – antes dela, Mad Men é uma série que marcou e mudou a TV americana, abrindo uma clareira de criação de dramaturgia num momento que parecia entregue inteiramente aos realities. Esta é sua penúltima temporada, e Weiner e sua equipe tem agora do desafio da alta expectativa, da capacidade – ou não – de manter a qualidade, a calma que impos ao seu ritmo, explorando (nas palavras do seu criador) não a época, mas as pessoas que, pela roleta do tempo, casaram de viver na época. “O Portal”, abrindo essas vidas para o momento em que, mais uma vez, elas tem que se definir, promete. E muito.
A sexta temporada de Mad Men estreia hoje, domingo dia 7 de abril, na AMC, nos EUA, e dia 22 de abril na HBO, no Brasil.