Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : Andrew Garfield

Scorsese rompe o Silêncio, com Andrew Garfield
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Ana Maria Bahiana

Depois de mais de duas décadas tentando trazer para a tela uma adaptação de O Silêncio, de Shusako Endo, Martin Scorsese finalmente conseguiu dar partida no projeto: Andrew Garfield será o protagonista, o jesuíta Padre  Sebastião Rodrigues, que chega ao Japão em 1638 com a missão de investigar os fatos em torno de seu predecessor e mentor, o Padre  Cristóvão Ferreira, que teria abandonado a batina e a igreja e se casado com uma japonesa. Ken Watanabe e Issei Ogata completam o elenco,  e o roteiro é de um velho colaborador de Sorsese, Jay Cocks. A busca de locações já começou e as filmagens estão planejadas para o início de 2014.

Silêncio é um projeto profundamente pessoal de Scorsese que, na juventude, considerou seriamente se tornar padre. Ele completa uma trilogia de indagação filosófica sobre a natureza da fé, iniciada com A Última Tentação de Cristo e continuada com Kundun. E aí está todo o problema de Silêncio: os projetos que Scorsese consegue financiar com facilidade são sempre os dramas policiais que a plateia mais facilmente associa com seu nome. Cristo e Kundun passaram pelos mesmos apuros, que se tornaram ainda maiores neste momento em que apenas filmes seguramente comerciais ou de baixo orçamento conseguem recursos. Foram precisos os recursos do próprio Scorsese, mais os da produtora belga Corsan Films, mais as produtoras de Irwin Winkler, Vittorio Cecci Gori e George Furla para dar o pontapé inicial – o restante do orçamento será levantado no mercado de Cannes, que acontece durante o festival.

O Silêncio já foi levado à tela uma vez, em 1971, por Masahiro Shinoda. Em novembro deste ano estreia The Wolf of Wall Street, a mais nova colaboração de Scorsese com Leonardo Di Caprio.


Quem é você, Peter Parker?
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Ana Maria Bahiana

 

“Eu sei qual é o seu nome. A questão é: será que você sabe?”, diz Gwen Stacy (Emma Stone) para um titubeante Peter Parker (Andrew Garfield), nos corredores da Midtown High School, logo nos primeiros momentos de O Espetacular Homem-Aranha. Pouco tempo depois, uma recepcionista vai mais além: “Você está tendo dificuldade em se encontrar?”, ela pergunta a um ainda mais confuso Peter Parker (a conversa é a respeito de um crachá, mas serve maravilhosamente aos propósitos da trama). E depois que tudo aconteceu, com aranhas, lagartos e tudo mais, uma professora explica, nos derradeiros minutos de imagem: “Um professor certa vez me disse que há apenas dez histórias no mundo. Mas para mim existe apenas uma única história: quem sou eu ?”

Identidade, acima de tudo, é o grande tema e o grande problema de O Espetacular Homem-Aranha. O diretor Marc Webb, que vem do cinema indie e ganhou notoriedade com o delicado (500) Dias Com Ela, tem o olhar perfeito para compreender o que muitas vezes escapa aos realizadores de filmes baseados em hq e que é, na verdade, a substancia sobre a qual se assenta todo o sucesso dos quadrinhos: o lado humano dos personagens. Quadrinhos funcionam através das décadas porque tem o poder das sagas mitólogicas: colocam em escala ampliada os obstáculos, frustrações e sofrimentos muito humanos de todos nós. E todos eles, em algum momento, tem a ver com a pergunta fatal: quem sou eu?

Trabalhando com um roteiro a seis mãos (embora todos escolados veteranos, inclusive um residente de Hogwarts, Steve Kloves) e, com certeza, o estúdio olhando por cima do seu ombro, Webb conseguiu o prodígio de, pelo menos na primeira parte de O Espetacular Homem-Aranha, manter uma visão coesa do drama da identidade – ou, como o próprio diretor disse, do “vácuo” – presente na vida de um adolescente inteligente e sensível demais para sua própria felicidade.

Onde seu filme é melhor e mais forte, reluzente com uma vivacidade que já começa a escapar do sub-gênero, é no estabelecer as origens do herói, a paixão por ciência que o conecta com o pai , preenche seu vazio e, inesperadamente, cria uma nova camada de identidade. De todas as lutas essenciais num bom filme de super-herói, a minha preferida é justamente a primeira, dentro de um vagão do metrô de Nova York, sem máscara e sem uniforme, uma parte da identidade se estabelecendo, a outra hesitando, pedindo desculpas. A opção de colocar Garfield, em muitas sequencias importantes, com o traje do Homem Aranha, mas sem a máscara, reforça a questão da identidade _ gradualmente, Peter é o Aranha, e o Aranha é Peter.

Webb tem em Andrew Garfield e Emma Stone seus parceiros ideais. Que me perdoem os fãs de Tobey Maguire, mas Garfield dá uma dimensão de complexidade e credibilidade a Peter Parker que eu ainda não tinha visto. A conexão com Emma Stone faz parte disso e a escolha de Gwen como a parceira/cúmplice do herói nascente funciona muito bem na exposição de sua questão essencial _ você sabe quem você é, Peter Parker?

Saber quem ele é também é uma questão para o próprio filme. Quando o Lagarto passa a dominar a narrativa, e até o Capitão Stacy, pai de Gwen (Denis Leary, muito bem escalado) passa a leva-lo a sério, tudo fica menos interessante, em grande parte porque o que havia mantido a história num plano mais vital e mais emocional vai embora. Claro, como é mandatório no gênero, temos muitas lutas, efeitos  digitais (nem todos me convenceram) e coisas atiradas na direção da plateia para justificar o 3D. Uma sequencia importante envolvendo uma sucessão de guindastes de obra é a mais poderosa de todas, e, possivelmente, a que mais reflete a sensibilidade de Webb na abordagem do material.

Eis o x da questão: até quanto tempo é possível fazer filmes de super herói sem repensar , mais uma vez, tudo a seu respeito? O Espetacular Homem-Aranha é um reboot razoavelmente precoce, motivado pelas duas grandes pressões da indústria : gastar menos e vender mais ingressos para novas plateias. Mas também pode ser uma oportunidade para rever o gênero. Sam Raimi concluiu sua jornada com o Homem Aranha em 2007. Christopher Nolan encerra este ano sua repensagem do Batman. X Men voltou ao passado do mito.Vem aí um reboot do Super Homem. Quem somos nós, na plateia, agora? E de que heróis precisamos?

O Espetacular Homem Aranha estreia nos EUA dia 3 de julho, e no Brasil dia 6 de julho.


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