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Sucker Punch: Crepúsculo para meninos
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Ana Maria Bahiana

Existia (não sei se ainda existe) uma rádio comunitária na região do Saara, no centro do Rio de Janeiro cujo ponto forte eram  os comerciais, transmitidos a todo volume pelas ruas deste tradicional bairro de comércio popular. Meu comercial favorito era o de uma loja de roupa íntima, no qual uma locutora, afetando entonações sedutoras, dizia, com a devida pausa entre as palavras: “Sutiãs…. sexys! Calcinhas…. sexys! Meias…. sexys!”

O bordão não saía da minha cabeça durante os  barulhentos, intermináveis, penosos 109 minutos de Sucker Punch (incrível: a mesma duração de Paul… nem parece). Porque, não importa quanta explicação Zack Snyder dê para seus objetivos e referências, Sucker Punch é, em essência, apenas isso: um bando de moças bonitas e gostosas mudando várias vezes seus figurinos de pouca roupa, em múltiplas combinações de… bem… “Sutiãs…. sexys! Calcinhas…. sexys! Meias…. sexys!” Sempre combinando, é claro, com os diversos tipos de armamento empregados em poses…sexys contra antagonistas emprestados de um sortimento de games.

Não tenho absolutamente nada contra – muitíssimo pelo contrário – o excelente uso de lingerie ou a livre exibição da beleza do corpo humano (tenho mais ressalvas quanto às armas ). Mas, a não ser para quem tem a idade física ou mental de um menino de 11 anos, é preciso mais que isso para justificar  uma hora e 49 minutos do nosso precioso tempo.

Precedido de grande expectativa  (devidamente alimentada pela Warner) Sucker Punch, escrito por Snyder com Steve Shibuya,  a partir de seu proprio argumento- deveria ser a obra mais pessoal de Snyder, seu pronunciamento artístico. Espero que não seja – acredito que, com disciplina e um bom roteiro, ele ainda possa realmente mostrar o “visionário” que James Cameron (entre outros) vê nele.

Mas neste momento, lá está, nas telas de todo o mundo: cinco meninas bonitas (lideradas por Emily Browning, Abbie Cornish e  Vanessa Hudgens) em trajes sumários, pessimamente dirigidas (algumas cenas me lembraram os piores momentos das piores novelas que já vi) sem ter o que fazer. A trama é um fiapo: trancafiada num mancômio nos anos 1950/60, Baby Doll (Browning) cria elaboradas fantasias para fugir de sua existencia infernal e se vingar dos homens que atormentaram sua vida.

A principal fantasia, que serve de base para todas as outras, é o sinal mais claro do que Sucker Punch realmente é: Baby Doll imagina que o manicômio é um cabaré/prostíbulo de luxo. Ou seja : tudo não passa na verdade do sonho febril de um pré- adolescente bombardeado por hormônios e video games, nada mais.  De certa forma, é um Crepúsculo/Red Riding Hood para meninos.

Baby Doll e suas companheiras de aventura não são personagens completos, com  personalidade, profundidade, contornos, história, humanidade , nem alegorias ou metáforas para alguma outra coisa: são meras figurinhas movimentando-se em elaborados cenários, com a obrigatória cãmera lenta a la Syder, repetindo poses, situações e falas. Numa entrevista recente, Cornish disse que o trabalho de preparação para o filme foi de tal forma que ela e suas colegas se sentiam “mais dublês que atrizes”. Dá para ver.

E para quem tem reputação de visionário, Snyder precisa se esforçar mais : os mundos em que Baby Doll e suas amigas se refugiam já foram vistos antes, muitas vezes, em obras superiores de Peter Jackson, Quentin Tarantino, irmãos Wachowsky e muitos games.

Em vários momentos – a escolha das cores, o design dos ambientes do “bordel”, o uso de covers na trilha – Snyder parece estar referenciando Moulin Rouge!, o que seria uma escolha interessante se o resultado final não estivesse muito mais próximo de  um crazamento de Burlesque com Faster,Pussycat! Kill! Kill!

Mas poderia ter sido muito pior. Poderia ter sido em 3D.


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