Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : Pacific Rim

Duelo de titãs
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Ana Maria Bahiana


Círculo de Fogo
(Pacific Rim, dir. Guillermo Del Toro, 2013) não é o filme mais profundo, mais filosófico ou sequer inteligente do ano ou mesmo da temporada pipoca (suspeito que este título vai ficar com Elysium…). Mas para qualquer criança que cresceu encenando batalhas entre dinossauros e robozinhos (como eu) ou vendo aqueles seriados japoneses em que criaturas variadas destroem cidades com o mesmo entusiasmo que você com seus bonecos, Pacific Rim (vamos combinar de chamá-lo assim?) é um prazer.

Godzilla/Gojira, o rei dos kaiju…

 

…e seu antepassado mais próximo.

O kaiju ega ou “filme de criaturas estranhas” é um sub gênero estabelecido do sci fi japonês desde Gojira/Godzilla, de 1954. Godzilla, por sua vez, era uma re-interpretação de filmes B norte americanos, notadamente The Beast From 20,000 Fathoms, (dir. Eugene Lourie, efeitos  do mestre Ray Harryhausen)  à luz do trauma coletivo das bombas atômicas de Hiroshima e Nagazaki.

É bom saber tudo isso para apreciar o que Pacific Rim tem de melhor, o uso da escala monstruosa e da mitologia (consciente e inconsciente) associada com ela para criar uma fábula pop para  o século 21.

Del Toro gosta muito de monstros.  De Cronos a Labirinto do Fauno, passando por A Espinha do Diabo e Hellboy, Del Toro compreende o monstro como uma extensão da alma humana, seus pavores, seus pesadelos, suas sombras.

Travis Beacham, o jovem autor do argumento e co-roteirista (com Del Toro) assinou, antes, Fúria de Titãs, uma tentativa de novo olhar sobre uma mitologia clássica já visitada por Harryhausen, Imagino que ele tenha ambições épicas – algumas ideias de Pacific Rim são verdadeiros achados, especialmente o artifício narrativo que dá uma dimensão realmente humana aos super- robôs criados para enfrentar os kaiju. O que ainda lhe falta  é o refinamento do diálogo e do desenvolvimento dos personagens, algo que já não é o forte de filmes deste tipo.

Mas não se aborreçam. Pacific Rim encontra seu pulso, sua presença e, por que não, sua força metafórica exatamente nos enfrentamentos entre os kaiju que se erguem do Pacífico (ou do nosso terror/culpa pela destruição ecológica?) como seus antepassados do século 20, e são combatidos por estes novos gladiadores super-dimensionados, os titãs de um futuro próximo, literalmente tão fortes por fora e tão frágeis por dentro , onde habitam seus controladores humanos.

São monstros de respeito, todos eles, com a atenção ao detalhe, a referência biológica e o poder de realmente aterrorizar que são a marca de Del Toro. Outro tema comum à sua filmografia, o poder da inocência contra a insanidade destruidora, aparece de forma breve mas eficaz em um flash back da personagem Mako (Rinko Kikuchi) que, pelo menos para mim, lembrou muito algumas das melhores coisas de Labirinto do Fauno.

Pacific Rim estreou neste fim de semana nos Estados Unidos e será lançado no Brasil dia 9 de agosto. Por favor, procurem o cinema com o melhor som da sua cidade – é essencial para realmente apreciar a escala do filme.


Porque o acordo Universal/Legendary faz sentido. E é um negócio da China.
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Ana Maria Bahiana

Thomas Tull (esquerda) e Guillermo del Toro ontem no teatro Dolby. Sim, isso é um sorriso.

Thomas Tull, o CEO da Legendary, era todo sorrisos ontem na estreia de Pacific Rim no teatro Dolby, em Hollywood. Como empresa responsável, a Legendary está promovendo todos os projetos já realizados com sua futura ex-parceira, a Warner, até o fim do acordo entre os dois, em dezembro. Isso inclui especialmente o filme de Guillermo del Toro, cujas perspectivas não são muito boas, e também o reboot de Godzilla e a sequel de 300, que a Legendary estará promovendo na Comic Con, dentro de duas semanas.

De janeiro em diante, nova parceria, novos projetos . O acordo com a Universal – Legendary adquire propriedades, desenvolve e traz a maior parte do orçamento, Universal distribui mundialmente – é de cinco anos (dois a menos que seu arranjo anterior com a Warner) e faz sentido  por todos os ângulos. Vamos a eles:

–       A Universal não tem em sua carteira os filmes que são a especialidade da Legendary: propriedades intelectuais baseadas em jogos e hq, do tipo que rende franquia, viaja bem pelo mundo afora e gera uma infinidade de subprodutos. A Universal já está chamando esta nova linha de projetos “os filmes Legendary”, e eles incluem títulos baseados nos games World of Warcraft e Mass Effect, na hq Gravel e nos brinquedos Hot Wheels (alô Transformers!).

–       Múltiplas plataformas é coisa que a Universal pode oferecer, de sobra: parques temáticos,  forte distribuição internacional, uma cadeia de TV aberta (NBC) e canais por assinatura (USA, Bravo), e uma nave-mãe, a Comcast, líder na infra-estrutura digital.

–       A TV é claramente um atrativo importante para a Legendary – em maio o ex chefão de TV da Warner, Bruce Ronsemblum, se mudou de armas e bagagens para a Legendary, com o mandato de criar um departamento de projetos na mesma linha dos filmes, mas com aquilo que a TV traz de melhor – a garantia de acesso a uma plateia internacional, de forma rápida e econômica.

–       Além disso, a Universal tem uma administração estável e um acervo de outras propriedades intelectuais que podem interessar à Legendary – de clássicos de terror a Tubarão a ET.

–       O fato de Legendary e Universal serem complementares garante à empresa de Thomas Tull o que ela sempre quiz no seu tempo com a Warner: liberdade para escolher e desenvolver seus projetos. Em seu papel de distribuidor, a Universal dará palpites na hora da aprovação final, mas a Legendary tem uma capacidade muito maior de pensar e realizar seus projetos sem interferência de alguém como, por exemplo, Jeff Robinov, cujos choques constantes com Tull estão entre os motivos de sua saída do estúdio, em junho.

–       É um negócio da China, literalmente. A Legendary já tem um dos bens mais cobiçados da indústria: um acordo com o China Film Group, a produtora estatal da China, o mercado mais atraente para todos os grandes, médios e pequenos produtores.

Não chorem pela Warner, contudo. A administração Kevin Tsujihara está claramente pensando num tipo de abordagem onde cinema e TV estão mais próximos (ele vem de home entertainment). E além do acordo possível com a Dune/Bank of America (e Brett Ratner e seus amigos bilionários) a Warner sempre contará com os cofres genorosos e os ainda mais amplos recursos de produção da australiana Village Roadshow.


O que quer dizer o novo acordo financeiro da Warner
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Ana Maria Bahiana

A primeira coisa que me chamou a atenção sobre o anúncio do novo acordo financeiro da Warner foi que os dois trades rivais, Variety e Hollywood Reporter, colocaram a palavra exclusivo em suas manchetes. O pau deve ter comido solto, porque pouco tempo depois a Variety tirou o “exclusivo” deles.

É um detalhe pequeno, mas que me diz o seguinte: a Warner está preocupada em mandar com urgência, para seus acionistas e para a indústria em geral , o recado de que está tudo bem, que a saída da Legendary até que não é tão terrível assim, e mesmo que Pacific Rim seja a meia bomba na bilheteria que as projeções anunciam, tudo vai ter um final feliz.

Ei, até o possível buraco nos cofres que o Homem de Aço é capaz de deixar está resolvido! (Leiam com calma o último parágrafo da matéria do Hollywood Reporter…)! E, de todo modo, nunca estivemos em crise! (Leiam a primeira frase do penúltimo parágrafo da matéria da Variety, que fala nos “bolsos profundos” da matriz corporativa da Warner, a Time Warner…. Que se baseia em hã… livros, discos, revistas e TV a cabo… que estão..hã-hã… morrendo?)

Falo como quem trabalhou muitos anos em trade – esse é o principal papel desses veículos business to business, num business tão louco, arriscado e cheio de egos como este: mandar recados para lá e para cá. Lendo as matérias com esses olhos, eis minha teoria: o acordo ainda está longe de ser fechado, mas a Legendary já caiu fora; vamos falar “extra-oficialmente”, prometendo exclusividade a ambos, com os dois principais trades norte americanos, para passar o recado de que não há crise, está tudo bem…

Acho até que sei quem falou com quem mas não vou arriscar meu pescoço.

Os pontos mais interessantes do novo acordo financeiro:

_ Três empresas subsituiriam o atual arranjo com a Legendary: o conglomerado financeiro Bank of America/Merryl Lynch entraria com um financiamento de 400 milhões de dólares; a empresa de investimento privado Dune Capital colocaria cerca de 150 milhões de dólares de aporte direto, em troca de uma parte de todos os direitos de cada projeto; a produtora Rat Pac, do diretor Brett Ratner em parceria com o multimilionário australiano James Packer (dono do maior iate ao largo da Croisette, em todo Cannes) entrariam com um valor ainda não especificado, também em troca de participação equity nos filmes da Warner.

-Pausa : você confiaria num estúdio que tem Brett Ratner como um de seus parceiros, provavelmente com poder de decisão?

_ Pausa 2: Ratner não é mencionado na matéria da Variety. Aí está uma pista interessante.

_ Continuando: ao contrário da Legendary, que escolhia os projetos nos quais parceirava com a Warner, o novo acordo cobriria todas as produções do estúdio. Como o acordo oficialmente ainda não foi concluído, não se sabe quais as contrapartidas, ou como ficará o poder de dar a luz verde e a forma final dos projetos.

_ Há uma possível dança das cadeiras no ar. O Bank of America teve durante anos um acordo semelhante com a Fox que garantiu, entre outros, Avatar. A Fox é o estúdio mais interessado em parceirar com a Legendary – até porque já deu partida em mais uma tentativa de franquia com o reboot de A Liga Extraordinária,agora como série de TV.  A série hq de Alan Moore e Kevin O’Neill já virou filme em 2003 mas não foi muito longe. Quem sabe agora…..

 


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