Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : Mireille Enos

Um caos de vida e morte
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Ana Maria Bahiana

As primeiras  imagens de Guerra Mundial Z (World War Z, Marc Foster, 2013), logo nos créditos, dizem tudo o que precisamos saber para compreender porque este thriller  acaba mexendo com muitas outras áreas da nossa emoção: formigueiros, bandos de pássaros, manadas em migração pelas savanas, animais selvagens exibindo suas  presas, multidões comprimidas em metrôs, escadas rolantes, shoppings, ruas. Foster está propondo a ideia do animal que nós somos, e do quanto  nossa explosão demográfica sobre o planeta nos coloca  numa posição complicada, ao mesmo tempo de domínio e fragilidade.

Adaptado muito livremente do best seller homônimo de Max Brooks, Guerra Mundial Z, com todos os problemas de produção que teve – acidentes, paradas, recomeços, alterações impostas, etc—é um ótimo filme, muito mais inteligente do que tem necessidade de ser.  Não tem o tempo e a calma de uma série de TV para fazer, como The Walking Dead, uma reflexão sobre quem são e como se comportam os humanos quando confrontados com sua mortalidade. Mas tem a capacidade de dar uma dimensão maior e muito mais humana ao que poderia ser mais um desses blockbusters barulhentos cheios de efeitos onde nada realmente comovente acontece.

E sim, se você gosta da deliciosa/terrível sensação de sentir um medão na segurança de sua poltrona no cinema, este é o seu filme.

Brad Pitt, em seu modo operacional profético-salvador, com barba e grandes olhos azuis que parecem sempre à beira das lágrimas,  é Gerry, um investigador das Nações Unidas recém-aposentado. Embora não tenha os super-poderes de seus colegas de temporada, Gerry deve ter sido treinado pela turma do Bourne _ sabe usar armas, pilotar aeronaves e administrar cuidados médicos de emergência em qualquer situação. Mas o fato de Forster nos apresentar Gerry como um pai de família, fazendo panquecas para a esposa (Mireille Enos, ótima e infelizmente pouco aproveitada) e filhas imediatamente nos alerta para sua humanidade . Estamos convidados a ver o filme, por mais impossível que seja, pelos olhos dele, que tem tanto em comum com os nossos.

E muito rapidamente o caos anunciado na abertura e no ruído das notícias que serve de pano de fundo (artifício comum em thrillers, mas bem usado, aqui) invade a tela. Quem viu o trailer conhece, ao menos em parte, estas imagens, mas  a sequência inteira é uma aula de narrativa de ação, bem dirigida, bem pensada, bem editada. O risco é real, imediato e profundo: algo está transformando seres humanos em formigueiros loucos, presas à mostra, destruindo tudo no caminho.

Gerry é convocado pelas Nações Unidas, única entidade que parece ter sobrevivido ao apocalipse zumbi, e despachado mundo afora para tentar descobrir a origem do cataclisma e sua possível cura.  As costuras de onde a narrativa foi alterada e re-orientada estão bem aparentes, mas a precisão do ritmo e a consistência da visão de Forster mantêm Z no rumo certo o tempo todo.

Perde-se a maravilhosa Mireille Enos, que fica lá no porta-aviões da ONU com as filhas, reduzida a fazer caras preocupadas e ligações no telefone por satélite nas horas mais incovenientes. Ganha-se uma série de perfeitas sequências de ação, inclusive, ecoando o que David Denby disse em sua resenha no New Yorker, o melhor uso de efeitos digitais desta temporada-pipoca _ o assalto aos muros de Jerusalém por um tsunami de zumbis.

O final é meio assim-assim, com cara de ter sido arreglado na última hora para garantir uma continuação. Mas a essa altura você já está bem feliz de ter sobrevivido incólume a tantos sustos, e compreendido, quem sabe, um pouco mais sobre por que o mito do zumbi é tão popular, principalmente em épocas de crise financeira, política e moral: porque um zumbi não é um monstro, somos nós, desprovidos de nossa humanidade.

Guerra Mundial Z está em cartaz nos EUA e estreia dia 28 no Brasil


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