Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : Matthew McConaughey

2014, uma nova odisséia no espaço
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Ana Maria Bahiana

Interstellar abre

 

Christopher Nolan sempre disse que seu filme favorito de todos os tempos é 2001, Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick – que reinventou a ficção científica nos idos de 1969, inspirou Guerra nas Estrelas e, este ano, está sendo relançado para comemorar seus 45 anos de pioneirismo.

Tempo, tecnologia e prestígio deram a Nolan , finalmente, a oportunidade de criar sua resposta à obra do mestre _ e o resultado é ao mesmo tempo espetacular e frustrante.

Trabalhando mais uma vez com um roteiro a quatro mãos com seu irmão Jonathan, Nolan fez de Insterstellar a sua odisséia no espaço, sua declaração de amor à ciência e, em última análise, ao espírito humano, capaz tanto de mesquinhez quanto de grandeza. O grande triunfo de Interstellar é o modo como Nolan usa o filme – no caso, película mesmo, 35 mm e 70mm – para abordar os conceitos mais avançados da física, levando adiante a visão de Kubrick e de Arthur C. Clarke (que aliás aparece numa ponta muito inteligente do filme) para um momento da história em que a mesquinhez da humanidade esgotou completamente o planeta Terra, deixando como únicas opções a extinção ou a exploração espacial.

O que em 2001 era pura curiosidade científica é, em Interstellar, o desespero que leva à coragem absoluta. Num planeta exaurido, um núcleo de cientistas remanescentes do que restou da NASA planeja uma saída de emergência: uma missão (talvez suicida) para explorar um buraco negro além do qual podem existir mundos viáveis para a sobrevivência da humanidade. Cooper (Matthew McConaughey), um ex-astronauta transformado em fazendeiro depois de um acidente quase fatal, é o escolhido para a mais arriscada das tarefas – ir verificar as descobertas feitas pelas missões anteriores.

Paro aqui para não tirar o prazer de acompanhar essa jornada que – mais uma vez ecoando 2001 – envolve os conceitos de portal, tempo e espaço, e o profundo impacto emocional, existencial e ético que isso implica.

Inters elenco

E é aí que Interstellar se torna ao mesmo tempo embriagador e frustrante. 2001 era assumidamente uma exploração intelectual, quase espiritual. Nolan é um realizador cerebral, que sempre está mais à vontade usando seus personagens e situações como peças que,  num tabuleiro, se movem exclusivamente para impulsionar a trama, propondo e resolvendo enigmas. Interstellar, contudo, se propõe a ser algo muito mais emocional, no qual as relações de família, de amor e de amizade são essenciais para a própria essência da trama.

E não sei se ele consegue. O longo primeiro ato, no qual os irmãos Nolan precisam estabelecer as relações humanas que devem colorir todo o resto, acaba se tornando quase uma hora de exposição pura e simples (algo que também acontece em Inception, mas que a gente acompanha pelo próprio desafio da trama).

Uma vez no espaço, Interstellar flerta algumas vezes com o imenso potencial apresentado pelos desafios do multiverso e do multitempo. Há momentos de grande força, como quando Cooper encara pela primeira vez, na prática, o que representa ter passado pelo buraco negro enquanto sua família continua no tempo terrestre. Nolan faz aqui uma de suas escolhas mais brilhantes, fechando a câmera em McConaughey e não no que ele está vendo – e nos colocando imediatamente no coração da humanidade do personagem e de nós mesmos, na plateia.

Mas são momentos raros, e Interstellar perde com isso.

Inter terra

O que vale: a sensacional combinação de fotografia e efeitos, gerando (pelo menos para mim) a primeira recriação plausível e envolvente do que significaria uma viagem intergalática; a direção de arte, tão minuciosa e inteligente quanto a de Kubrick, nos dando, entre outras coisas, uma versão inesperada de uma inteligência artificial; e o som, que, como Gravidade, explora bem o silêncio absoluto do espaço (já a trilha de Hans Zimmer me deixou em dúvida com seu órgão e seus riffs constantes em cima de “Assim Falou Zaratustra” e “Danúbio Azul”…)

O elenco faz o possível e o impossível para dar emoção às longas exposições do roteiro. Gostei principalmente das interações entre McConaughey e a jovem atriz Mackenzie Foy, que interpreta sua filha na juventude (Jessica Chastain, sempre ótima, é a versão adulta da mesma personagem).

Minhas dicas; saibam que o filme tem quase três horas de duração (nada de refri gigante….) ; escolham a sala com a melhor tela (IMAX se possível) e o melhor som; e não custa nada dar uma atualizada nos conhecimentos básicos de física antes de ir pro cinema…

Interstellar estreia mundialmente dia 6 de novembro.

 

 


O final de True Detective: mil e uma noites no sul da Louisianna
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Ana Maria Bahiana

True-detective-1x02-7 Minha primeira reação quando terminou o episódio final de True Detective foi: caramba, agora não dá pra ver mais nada hoje; todo o resto vai parecer….televisão. Depois eu fiquei com pena de todo mundo que, viciado em “televisão”, estava esperando mil truques e viradas e sustos. Pelas reações que vi no Twitter, tem muita gente assim. Dá dó mesmo. Porque  esta temporada de True Detective sempre foi sobre duas coisas, e duas coisas sempre: o poder da narrativa; e a narrativa de um lugar.

As pistas estavam na cara da gente o tempo todo, provocando, pedindo que a gente pensasse fora da caixa, pensasse não no que está acontecendo mas como e onde está acontecendo – e como esse artifício, tão antigo quanto a mente humana, ainda, mais uma vez, era capaz de nos manter presos à nossa capacidade de imaginar, que nem o Sultão ouvindo Sherazade nas Mil e Uma Noites. “Tudo foi sempre uma história, a mais antiga de todas”, Rust Cohle, o personagem de Mathew McConnaughey diz no diálogo que resume tudo. Quando Nic Pizzolato lançou a isca de Ambrose Bierce e seu  “Habitante de Carcosa”, que por sua vez leva ao Rei de Amarelo de Robert Chambers, que por sua vez leva a H. P. Lovecraft, o mito de Cthulhu e dezenas de outros escritores desenvolvendo histórias sobre histórias como níveis e mundos de um videogame a proposta ficou clara: este primeiro True Detective era sobretudo sobre contar histórias. A história de 1995. A história de 2002. A história de 2012. A história de Cohle, a história de Hart, a história que eles contam um ao outro, que eles contam aos detetives em 2012, que eles contam a si mesmos. A história que nós estamos vendo. E no fim, uma história muito antiga – a coragem necessária para entrar num labirinto sabendo, com certeza, que “no final há um monstro”. Uma história que por sua vez abraça uma história ainda mais antiga: bem, mal, luz, escuridão. Mas esta primeira safra de True Detective foi também sobre um lugar – o sul da Louisianna, onde Pizzolato cresceu, uma terra sempre à beira do caos, lentamente devorada por marés, tempestades e furacões, pontuada por ruínas e refinarias de petróleo, às vezes intocada e selvagem, às vezes poluída e contaminada, onde todos os opostos são possíveis, e convivem. Em True Detective a paisagem era um personagem, e sua história era uma das histórias mais poderosas da trama. Houve um tempo em que apenas o cinema – e o cinema de qualidade superior e grandes ambições – provocava esse tipo de reflexão, essa riqueza de ideias. Pizzolato e a HBO criaram um problemão para si mesmos: fazer uma segunda temporada desta série-antologia (nos moldes de American Horror Story) neste mesmo nível. E por favor indiquem para os Emmys todo mundo de True Detective – inclusive o notável time da montagem, que inclui o brasileiro Affonso Gonçalves, o mesmo de Beasts of The Southern Wild (que, se não foi uma das inspirações para a série… sei não…)


Cannes 2012: quem será O Artista deste ano?
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Ana Maria Bahiana

Começa hoje o festival (e mercado) de Cannes. E este ano ele vem acompanhado de uma tremenda expectativa: quantos títulos o festival vai catapultar para os prêmios de fim de ano?

Nem sempre foi assim. Muito pelo contrário. Cansei de ver sensacionais filmes premiados (e até vencedores, como o genial Underground, de Emir Kusturica, em 1995) demorar uma eternidade para conseguir –  ou não conseguir de jeito nenhum –  distribuição em mercados além dos seus países de origem, especialmente o cobiçado mercadão norte americano.

Muita coisa mudou desde então:

  •  Os mercados internacionais, fora de EUA/Canadá, tornaram-se muito mais importantes tanto como fonte de receita quanto como geradores de produção com possibilidades além de suas fronteiras.
  •  A recessão levou os grandes estúdios a abandonar a produção do que não fosse estritamente comercial, com retorno o mais garantido possível dentro da indústria louca do cinema, criando uma lacuna importante.
  •  Os prêmios de fim de ano assumiram uma importância além da vaidade dos concorrentes e interesse dos fãs: são cada vez mais as principais ferramentas de marketing para qualquer filme que não seja um arrasa-quarteirão apoiado por um milionária campanha de divulgação.

Ano passado, o poder combinado da Croisette e dos irmãos Weinstein  conseguiu um fato inédito: tornou um filme francês, mudo, preto e branco e com atores desconhecidos o grande vencedor do Oscar e um sucesso de bilheteria pelo mundo afora. Além de O Artista, outros filmes premiados/destacados em Cannes foram para os prêmios de fim de ano e conseguiram uma visibilidade muito maior do que poderiam esperar: Meia Noite em Paris (a maior bilheteria da carreira de Woody Allen), Árvore da Vida, Drive.

O que pode acontecer este ano? Algumas apostas:

The Paperboy: o novo filme do diretor de Preciosa tem Mathew McConaughey e Zac Ephron como dois irmãos que tentam provar que John Cusack é inocente de um crime pelo qual foi condenado. Nicole Kidman é a apetitosa namorada do bandido.

Mud: Matthew McConaughey de novo (este pode ser seu ano, afinal…) neste drama com elementos fantásticos assinado por Jeff Nichols, diretor de uma sensação de Sundance, o ótimo Take Shelter.

 On the road: Tudo no projeto – a expectativa, o material de origem, a assinatura de Walter Salles, o elenco – promete. A IFC/Sundance Selects  pegou o filme para os cinemas nos EUA (HBO na TV) _ ano passado eles emplacaram Pina

Rust and Bone: Jacques Audiard em seu primeiro filme desde Un Prophete : um drama inspirado em fatos reais, sobre uma treinadora de baleias (Marion Cotilliard) envolvida num acidente medonho.

 

Beasts of the Southern Wild: a grande sensação de Sundance deste ano foi esta fábula mágica e quase abstrata sobre uma família numa comunidade isolada numa ilha da costa sudeste dos Estados Unidos. Ecos de Terrence Malick e muita promessa para o diretor estreante Behn Zeitlin

Killing them Softly: Brad Pitt volta a trabalhar com o diretor de O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford, Andrew Dominick, num policial sobre um caçador de recompensas com a máfia em seu encalço. Elenco da pesada: Ray Liotta, James Gandolfini, Richard Jenkins. Os Weinstein já puseram a mão e… já ouvi tanto zum zum sobre este filme que, espero, as expectativas não estejam altas demais…

 

Lawless: Outro que já está na mão dos Weinstein _ John Hillcoat (A Estrada) dirige Tom Hardy, Shia LeBeouf , Guy Pearce, Gary Oldman e Jessica Chastain num drama da época da Lei Seca nos EUA. Mais um que já tem zum-zum por aqui…

 Post Tenebras Lux : O novo cinema mexicano a todo vapor na mais recente obra de Carlos Reygadas (Luz Silenciosa, Batalla en el Cielo), um drama fantástico sobre universos paralelos.

 Cosmopolis: David Cronenberg adapta o livro de Don DeLillo sobre um  dia na vida de um jovem executivo (Robert Pattinson) enquanto ele atravessa Manhattan. Paul Giamatti e Juliette Binoche no elenco.

 

Antiviral: Brandon Cronenberg (sim, filho de David) estreia na direção voltando às raízes da familia com um thriller de terror sobre um  super vírus assassino.

Amour : Michael Haneke explora o que acontece numa familia sob o peso da idade avançada e da doença. Com Jean Louis Trintignant e Isabelle Hupert.

 

Agora é ver como esses (e outros..o melhor de Cannes são as supresas) títulos vão se comportar na Croisette e além dela…


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