Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : setembro 2013

A perfeita tragédia de Albuquerque: Breaking Bad e o poder das escolhas
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Ana Maria Bahiana

A definição aristotélica de tragédia é: uma narrativa dramática concentrada num grupo de personagens, em um lugar e período definidos, cuja ação é deflagrada pelas escolhas equivocadas de um protagonista complexo, com consequências que ecoam em todos à sua volta e fazem a plateia refletir sobre a condição humana.

Aristóteles teria adorado Breaking Bad. Possivelmente estaria, como eu, pulando do sofá ao final de mais de um episódio para aplaudir de pé (se a toga não atrapalhasse). E isso incluiria “Felina”, o episódio final,  exato em tom e conteúdo, que foi ao ar ontem pela AMC, e foi visto por mais de 10 milhões de espectadores, apenas nos Estados Unidos.

Vou tentar falar da série e do final com o máximo cuidado para evitar SPOILERS mas se você for ultra-sensível, pode parar aqui.

Como alguns colegas, eu também vi em “Felina” grande buracos de credibilidade. Não é a primeira vez: em muitos momentos dos 62 episódios de Breaking Bad Vince Gilligan e seus roteiristas armaram situações que desafiam a plausibilidade e/ou a lógica. Mas isso nunca me incomodou, nem na série nem no final porque:

1. A realidade consistentemente consegue ser mais absurda que a ficção, e quase tudo que se pode imaginar pode acontecer- e talvez já tenha acontecido.

2. Não é isso que importa na série. O que importa é a exatidão da trajetória de dois arcos exatos e opostos que se cruzam, se encontram e finalmente se separam: o de Walter White, o “homem bom” que nunca foi tão “bom” assim, e o de Jesse Pinkman, o “homem mau” que nunca foi tão “mau” assim.

Sempre coloquei os soluços de trama de Breaking Bad numa categoria entre a metáfora, o sonho e o “estado de fuga” – verdadeiro ou fake, não importa. Eles nunca me perturbaram porque o importante – a coerência interior do mundo criado pelas ações do protagonista, a clareza do traço da dupla trajetória de Walter e Jesse- sempre esteve lá. Breaking Bad sempre foi uma calma, clara, violenta, profunda, perturbadora, divertida e intensa meditação sobre certo e errado, bem e mal, legal e ilegal, o que nos faz feliz e o que nos faz sofrer, até onde nossa consciência e nossos desejos nos dizem o que fazer, e até onde nós seguimos essas ordens.

Quando  subiu o som de “Baby Blue”, do Badfinger (uma escolha absolutamente perfeita), nos segundos finais, enquanto a câmera deslizava lentamente para cima, naquele movimento amplo e eufórico conhecido como “o ângulo dos anjos”, Walter e Jesse haviam encontrado a meta justa da jornada que haviam iniciado 62 episódios atrás.

Jesse, o bandidinho de terceira, passara pelo crivo das reais provações da bandidagem em grande escala e perdera nesse fogo, camada por camada, a fina capa de safadeza que um dia achou que tivesse. Em seu lugar, às custas de muita porrada e muitas perdas irreparáveis, ele encontrou algo que nunca achou que tivesse: um firme centro moral, uma imensa compaixão, uma profunda humanidade. Jesse sempre foi o Grilo Falante do Pinóquio de Walter, esse boneco que ganhou vida ao quebrar a lei (“eu fiz por mim mesmo. Eu me sentia vivo”, ele diz no episódio final).

Walter, o bom sujeito classe média, fizera a escolha que, em outros mitos, já havia arruinado outros indivíduos brilhantes –como o favorito de Aristóteles, Édipo: optar pelo que não é permitido, arriscar-se pela sombra. E na sombra ele teve a sua provação, cada escolha sombria levando a uma mentira, cada mentira levando a uma nova, maior, escolha sombria, despertando nele o Outro com o qual, imagina-se, ele sempre dançara – seu Batman, seu Mr. Hyde, Heisenberg.

O x de Walter White está logo num dos primeiros episódios da série, quando ele diz “eu nunca tive controle sobre minha vida, nunca pude fazer minhas próprias escolhas.” O que não sabemos sobre o passado de Walter White é muito, mas o que importa é isto: ele foi parar em Negra Arroyo Lane, Albuquerque, e no laboratório de química do ginásio do bairro por escolhas que deixou de fazer. O que veremos a seguir é seu fantástico “erro de alvo”, tão caro a Aristóteles: as escolhas que ele, finalmente, fez.

Tudo se resolve, clara e elegantemente, em “Felina” – palavra que oculta “finale” e que referencia a personagem da canção “El Paso” do ídolo country/western Marty Robbins, que Walter acha no cassete de um dos carros do episódio,  e cujo refrão diz “acho que ganhei o que eu merecia”. A cada um a coerência de suas escolhas, inclusive os que foram tragados pelo redemoinho da progressiva divisão dos átomos de Walter White, partido entre Mr. White e Heisenberg.

Além da imensa satisfação de acompanhar uma obra tão excelente em todos os seus aspectos – roteiro, direção, interpretação, fotografia, música, som – Breaking Bad deixou grandes lições para a indústria do audiovisual. A Variety listou algumas, importantes, e concordo com todas – especialmente “nem tudo está no piloto” e “Netflix é um aliado, não um inimigo”.

A todos essas lições eu acrescentaria mais uma: confie na inteligência do público. Somos inteiramente capazes de acompanhar, entender e apreciar um drama complexo em tema e tom. 2438 anos atrás Aristóteles já sabia disso.


Emmys 2013: a TV morreu! Viva a “TV”!
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Ana Maria Bahiana

O host Neil Patrick Harris e Sarah Silverman no número musical dos Emmys 2013.

Se você não assistiu os Emmys, ontem, não perdeu nada. Aqui vai o mais importante: Behind the Candelabra e Breaking Bad saíram triunfantes (Breaking Bad com seu primeiro Emmy de melhor série/drama que, na minha imodesta opinião, lhe era devido faz tempo…). Modern Family levou os prêmios de comédia porque, como se sabe, os acadêmicos de TV não tem imaginação e/ou lutam com unhas e dentes para manter pelo menos alguns troféus na TV aberta. E, numa vitória histórica e pioneira, David Fincher levou para  casa um Emmy de direção por uma série que ninguém viu nem na TV aberta nem por assinatura: House of Cards, da Netlflix.

Imagino que o tom funéreo/retrospectivo do evento de ontem tenha surgido, na cabeça dos produtores, do desejo ser “sério” no momento em que os Emmys completam 65 anos. Ser levado a sério numa industria que , até recentemente, privilegiava a tela grande sobre a pequena, vista como um primo pobre do cinema, onde carreiras iam para morrer, está na raiz da fundação da Academia de Artes e Ciências da Televisão, em 1946.

A péssima escolha de tom tornou deprimente um espetáculo que poderia ser simplesmente chato, interrompendo os festejos a toda hora para ou memorializar alguém ou recordar um grande momento do passado da TV. A ironia suprema dessa escolha foi ancorar no passado, na saudade, na noção de  “somos importantes porque somos antigos” uma mídia que está passando por sua maior revolução desde que foi inventada e se tornou bem de consumo de massa em meados do século passado.

Como seus primos do século 20, o disco e o rádio, a TV surgiu primeiro como hardware, como uma novidade, um eletrodoméstico. E até o advento do videocassete, na década de 70, não se imaginaria separar hardware de software, conteúdo de suporte – a linguagem da TV era a da audiência com hora marcada, em narrativas interrompidas regularmente para uma mensagem dos nossos patrocinadores, com narrativas emprestadas do rádio e uma estética tirada, com grande simplificação e redução, do cinema.

E agora ,como seus parentes, a TV desencarnou. O que era indústria do disco hoje é indústria da música. A julgar pelos textos e a auto-importância do evento de ontem, a TV ainda acha que é TV, mas está cada vez mais se tornando um espírito livre, desacoplado da tela em que, por acaso e transitoriamente, está sendo visto.  Dêem mais uma década – talvez nem isso – e provavelmente haverá um novo nome para definir esse conteúdo portátil, volante, cuja história terá tanto a ver com os marcos solenemente descritos e celebrados nos Emmys quanto nós, hoje, com os pintores dos cavalos e bisões das cavernas.

Aqui nos EUA a ironia se tornava ainda maior porque, nos intervalos comerciais, entrava um anúncio de um novo televisor Samsung no qual uma familia via vários tipos de conteúdo – You Tube, Facebook, Netflix, Instagram – equanto a mãe mandava “parar de ver tanta TV”, e os filhos (e o marido) respondiam: “Mas não estamos vendo TV…”

Involuntariamente, a chatura saudosista da cerimônia de ontem ficou parecendo o in memoriam da própria TV.

O que não é de todo mau. Que se abram os caminhos para o que está por vir, para o que já está vindo, para o que já está.

 


Os filmes da temporada ouro: Gravidade
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Ana Maria Bahiana

A temporada-ouro começou. Mesmo sabendo que uma grande parte destes filmes só estrearão no Brasil em 2014, vou procurar manter vocês atualizados com resenhas dos títulos mais importantes da temporada.

Terra, Terra/ Por mais distante o errante navegante/quem jamais te esqueceria” – Caetano Veloso, “Terra”

 

Os primeiros minutos de Gravidade (Gravity, 2013) são tomados primeiro pela escuridão absoluta, depois por uma única imagem: o azul profundo do planeta Terra, coberta de nuvens como na canção de Caetano, girando lentamente no silêncio abissal do espaço. Nada mais é preciso para estabelecer a narrativa que vai  ocupar os próximos 90 minutos – certamente entre os mais rápidos na vida de qualquer espectadora ou espectador. É aqui que estamos: suspensos onde aquilo que torna possível nossa humanidade é algo distante, intocável, e o abismo está por toda parte, crivado de luz e ocasionais vestígios da passagem de nossa espécie.

A Terra, que ocupa quase todos os quadros deste elegantíssimo e absurdamente bem feito exercício em sci-fi filosófico, é, na verdade, o tema recorrente de sua trama. Suspensos  no vazio ao redor de um ônibus espacial, aquele azul imenso ao fundo, a engenheira médica Ryan (Sandra Bullock) e o veterano astronauta Matt (George Clooney) conversam menos sobre a tarefa que os ocupa e mais sobre o planeta acima do qual flutuam. O que ela, Terra, é, a gravidade com que atrai as vidas, emoções e desafios de seus filhos, tão doidamente distantes de seu abraço, são o que acaba nos prendendo completamente à trama, além da exatidão dos efeitos, além da estranha beleza desse cenário completamente novo.

Mesmo quando, em seu terço final, o filme ameaça flertar com o esquema “mais é melhor”, atirando todo tipo possível de obstáculo na direção da pobre Ryan, continuamos inteiramente comprometidos com ele por esse motivo simples: porque, com imagens poderosíssimas, ele nos dá a real dimensão de ser humano longe de casa.

Cuarón, fã de pesquisa espacial, confessa ser admirador fanático de 2001: Uma Odisséia no Espaço, a obra prima de Stanley Kubrick que, nos idos de 1968, nos deu pela primeira vez a real dimensão do que a vertigem do espaço representava para nossa espécie, em termos físicos, emocionais e existenciais. Cuarón também diz que evitou rever 2001 enquanto trabalhava em Gravidade por “puro medo. Não há comparação. O filme de Kubrick é um extraordinário ensaio filosófico. Eu ficaria completamente petrificado se sequer pensasse nele enquanto realizava Gravidade.”

E no entanto, os dois filmes têm muito em comum, começando pelo salto quântico que cada um deles trouxe para os efeitos visuais. 2001 foi diretamente responsável pela nova dimensão que os filmes de ficção científica tomaram a partir dos anos 1970. Gravidade mostra o que é possível fazer neste momento, na encruzilhada entre arte e ciência, entre o que a exploração espacial nos informou, o que a tecnologia digital realiza e o que um realizador imagina.

Mas isso seria um exercício frio se Cuarón, realizador sensível, não desse um coração profundamente humano ao seu filme. Matt e, especialmente, Ryan, tem tanto de cada um de nós que sua odisséia, seu naufrágio no oceano sem fim acima da Terra, nos toca e nos prende. Ficamos, como eles, pequenos, frágeis, desorientados, procurando o amparo da ciência e da tecnologia mas no fim descobrindo apenas uma coragem animal que, contraposta àquele imenso disco azul girando ao fundo, se torna radicalmente comovente.

Um dos grandes trunfos de Gravidade é seu uso do som. Como Kubrick, Cuarón mantem-se fiel à realidade de que, no espaço, não há som. O que ouvimos é o que captam os microfones nos trajes espaciais dos personagens – e, novamente como Kubrick, Cuarón usa a sonoridade e o ritmo da respiração como um recurso dramático da mais alta eficiência. O silêncio do espaço é quebrado apenas pela nossa presença, pela intrusão humana – mesmo a trilha musical é usada economicamente.

Considerando que Gravidade é um tour de force praticamente solo de Sandra Bullock e que em nenhum momento damos um passo atrás em nossa empatia com ela,posso dizer que aí está um caso raro em que a tecnologia digital não limitou, mas expandiu o trabalho humano. Mais um ponto: o excelente 3D, que não distrai, não interfere, apenas contribui para a completa experiência do filme.

E, no fim das contas, Gravidade – de novo como 2001, ou como Solaris, de Tarkovsky, que Soderbergh refez em 2002, com George Clooney – é sobre vida e morte. Mérito de Cuaron por realizar, com enorme precisão e delicadeza, o paralelo entre flutuar em  zero gravidade no ventre do espaço e flutuar em líquido amniótico no ventre materno, onde outros cordões nos prendem à sobrevivência, ao que tem peso, pulso, oxigênio, terra.

Gravidade estréia nos Estados Unidos dia 4 de outubro e no Brasil dia 11 de outubro.


Os filmes da temporada ouro: Blue Jasmine
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Ana Maria Bahiana

A temporada-ouro começou. Mesmo sabendo que uma grande parte destes filmes só estrearão no Brasil em 2014, vou procurar manter vocês atualizados com resenhas dos títulos mais importantes da temporada.

 

 

Eis o que admiro em Woody Allen: que em sua maturidade ele continue  correndo riscos. Sua fase aventuras-em-belas-cidades-ao-redor-do-mundo tem os altos e baixos que se esperaria de um jovem realizador cheio de ideias e indiferente à possibilidade de dar com os burros n’água.

E quando eu começo a suspeitar que parte dessa oscilação talvez tenha a ver mais com preguiça do que com inspiração, eis que vem um filme como Blue Jasmine e responde, alto e bom som: não. Aqui está o que Allen faz de melhor: compreender plenamente a complicada condição humana e encapsulá-la em duas horas de precisa dramaturgia.

Mais jovem, Allen comentava nossas falhas e fraquezas com o riso, seu humor neurótico afagando o neurótico em cada um de nós. Com a perspectiva do tempo, ele ficou mais comedido, mais exato, deixando o ridículo da divina comédia se expressar sem a necessidade de sublinhar.

Blue Jasmine é um riff woodiano em cima de Um Bonde Chamado Desejo, de Tennessee Williams. O bonde agora não se chama Desejo, estamos  não na Louisianna barroca mas entre duas costas, entre a dolce vita dos novos milionários de Nova York e o bravo mundo novo de San Francisco. Como Blanche Dubois, Jasmine (Cate Blanchett) inventou seu nome, perdeu uma vida de luxo por motivos que nem ela consegue articular bem e precisa viver “dependendo da gentileza de estranhos” – a começar por sua irmã  Ginger (Sally Hawkins), que mora num apartamento modesto , dá duro para criar dois filhos e agora abriga a fugitiva “em busca de uma nova vida”, mas sem a menor noção de como vivê-la.

Como em Bonde, há um homem bruto, dominador e sensual – aqui, o namorado de Ginger, Chili (Bobby Cannavale), vagamente ecoando o Kowalski de Marlon Brando na montagem original da peça, em 1948, e na sua adaptação  cinematográfica, em 1951. Ao contrário da obra de Williams, contudo, não é ele o catalisador do drama:  disso Jasmine em pessoa se incumbe, com seus modelitos Chanel e seus copos de uísque mal servindo de defesa contra uma realidade que nega enquanto pode _ até que ela, inevitavelmente, acerta o passo.

Nos seus anos dourados Woody Allen se tornou cada vez mais um dramaturgo, e a precisão do texto e a construção dos personagens são sua principal preocupação. Ainda bem que ele tem a colaboração de Javier Aguirresarobe na fotografia, captando as diferentes intensidades de luz de Nova York e San Francisco, Atlântico e  Pacífico, e esgueirando-se em torno de Jasmine/Cate, da poltrona de classe executiva no vôo que abre o filme ao banco de praça onde ela aterrissa, na última cena.

Sally Hawkins desincumbe-se brilhantemente de sua Ginger, e Alec Baldwin está perfeito num papel que é sua especialidade – o tubarão falso e insensível. O restante do elenco é repleto de nomes bons , alguns surpreendentes – Louis C. K.,  Andrew Dice Clay, Peter Sarsgaard. Mas a verdade é que o filme é Cate. Sem ela, seria um bom filme. Com ela, com sua profunda compreensão de quem Jasmine é,com  sua capacidade de traduzir ideias, memórias, dores e esperanças pela pele, pelos olhos, por um tremor de lábios, Blue Jasmine é um mergulho gradual , brilhante, sem amarras, no poço sem fundo das ilusões humanas.

Blue Jasmine está em cartaz nos Estados Unidos e estreia no Brasil dia 11 de outubro.

 

 


A Amazônia vira tendência em Hollywood …mais uma vez
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Ana Maria Bahiana

 

Cena de The Green Inferno, de Eli Roth

Numa semana paradona aqui em LA, espremida entre o feriadão do Dia do Trabalho norte-americano e o Ano Novo judaico e com metade da cidade espalhada pelos festivais de Veneza e Toronto, uma notícia se destacou para mim: depois de muitos anos de idas e vindas, acelerações e desistências, o projeto de The Lost City of Z vai andar.

Brad Pitt, que, em 2008, opcionou junto com a Paramount os direitos do livro de David Grann (que por sua vez expandia sua sensacional matéria de 2005 para a revista New Yorker), será apenas o produtor. Em seu lugar, no papel principal, do explorador inglês Percy Fawcett, entra Benedict Cumberbatch, o ator mais solicitado do momento (só neste fim de ano ele poderá ser visto em O Quinto Poder, 12 Years a Slave e August:Osage County. Sem falar no Star Trek do primeiro semestre e a nova temporada de Sherlock, que vem por aí…). James Gray assume a direção.

Percy Fawcett….

… e Benedict Cumberbatch.

Tenho acompanhado esse projeto por dois motivos.  Um, porque acho a história de Fawcett fascinante :obcecado em descobrir uma cidade perdida na Amazônia, possivelmente o mesmo Eldorado que enlouqueceu tantos outros exploradores, Fawcett desapareceu na Amazônia em 1925, deixando um rastro de mistério e controvérsias que ainda não terminou.

Dois, porque é uma dessas raras histórias  que permite uma real colaboração entre o Brasil e o cinema internacional em bases mutuamente produtivas.

Ainda não se sabe como essa produção vai ser tocada em termos práticos. Com um bom roteiro e as mãos de um diretor sensível como James Gray, pode ser uma grande história sobre o eterno caso de paixão, ilusão e rejeição entre europeus e a força absoluta da Amazônia, que tão raramente é bem capturada pelo cinema, onde as coisas acabam ficando mais para Anaconda do que, digamos, o Aguirre de Werner Herzog.

 

“Canibais” escolhem o lanche, em The Green Inferno

No outro extremo das minhas expecativas está The Green Inferno, de Eli Roth, que está em pré-estréia no festival de Toronto. Roth disse que sua principal inspiração foi o terror-trash/fake reality Holocausto Canibal (Ruggero Deodato, 1980), embora (palavras dele) “com o visual de um filme de Terrence Malick”.

Numa curiosa nota à parte, a produção exibiu Holocausto Canibal para a população do isolado vilarejo na Amazonia peruana que serviu de locação a Inferno. Segundo Roth, o pessoal local achou que era uma comédia divertidíssima.

Sendo Eli Roth, a história dos ativistas ecológicos que se embarafustam pela Amazonia adentro e acabam capturados por uma tribo de canibais já é mais ou menos previsível. O que achei interessante, aqui, foi a colaboração latino-americana em torno do projeto: o roteiro do uruguaio Guillermo Amoedo e do chileno Nicoláz López (responsáveis por Aftershock, que Roth estrelou e produziu) , as locações no Peru e no Chile. Um lugar onde, nas palavras de Roth “está havendo uma nova renascença no cinema, na música… é um dos lugares com mais energia, hoje.”


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