Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : março 2012

The Killing, Game of Thrones: o tormento e delícia das segundas temporadas
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Ana Maria Bahiana

 

 

Segundas temporadas , como o segundo ato do roteiro de um longa, são sempre um desafio. Como o segundo ato de um roteiro,  o impacto da novidade já passou, os personagens são conhecidos, suas ações são previsíveis. Algo precisa acontecer de forma ao mesmo tempo surpreendente e coerente, empurrando a narrativa adiante no ritmo certo, sem atropelo mas também sem monotonia. O perfil dos personagens precisa ser aprofundado, as tramas tem que se complicar.

Num filme, o segundo ato pavimenta o caminho para a conclusão, o clímax, a resolução. Na TV, é bem mais complicado. A segunda temporada é , sim, parte do segundo ato de uma série: a grande história que, em tese, está sendo contada temporada após temporada, para ser resolvida (ou não…) no episódio final. Mas isso é apenas parte de algo mais complexo : a estrutura de cada episódio e de cada temporada, cada uma delas impulsionando a história e os personagens de um modo diferente.

Amanhã, domingo, aqui nos EUA, duas séries super cultuadas estarão testando as águas da temporada número 2: The Killing (AMC)  e Game of Thrones (HBO). E os resultados não podiam ser mais diferentes.

Se você, como eu, se sentiu absolutamente ludibriada pelo final da primeira temporada de The Killing, prepare-se para respirar fundo, fazer yoga, tomar ervas, tarjas pretas, seja lá o que for que funciona para você: a segunda temporada NÃO resolve o assassinato de Rosie Larsen. Pior: a roteirista e showrunner Veena Sud teve a cara de pau de anunciar que o crime só será resolvido no FINAL desta segunda temporada, e que os fãs deveriam “aproveitar a jornada”.

Eu não sei o que vocês acham (me contem…) mas para mim isso é abuso: da paciência, inteligência e investimento emocional das espectadoras e espectadores numa série que tinha tudo para ser excelente.

Com todo o seu climão existencial, The Killing é, essencialmente um procedural _ um drama de crime centrado na tentativa de descoberta de quem fez o que , como e por que. Negar à platéia a resolução daquilo que foi usado para prender sua atenção – e desenvolver todos os personagens – cheira a embuste. Há um limite para o número de pistas falsas que um roteirista ou autor pode colocar no caminho de uma espectadora ou leitora sem perder  sua confiança e fé. The Killing aproxima-se rapidamente do limite absoluto.

O que é super, mega pena: a fotografia e a direção (Agnieska Holland no episódio de estréia) continuam de primeríssimo nivel, o desempenho dos atores permanece absolutamente sensacional. A dinâmica entre Mireille Enos e Joel Kinnaman, alterada pelos eventos do final da primeira temporada, está ainda mais interessante, e é um prazer ver como os dois estupendos atores se desincumbem da tarefa).

Mas a insistência em prolongar além do plausível a busca do assassino da adolescente está prejudicando seriamente o que poderia ser uma lufada de ar fresco (e muito chuvoso) na cansada fórmula policial da TV.

 

Falta de tramas é um mal do qual Game of Thrones não padece. Quem leu os primeiros cinco livros da saga A Song of Ice and Fire, de George R.R. Martin, que inspira a série (revelando meu lado super nerd, eu confesso: eu li. Várias vezes.) sabe que o problema para a adaptação não é a falta mas a abundância de tramas, intrigas, personagens.

Além do profundo respeito que a ambição da produção de Game of Thrones me inspira, não cesso de ter admiração pelo trabalho de David Benioff e D.B. Weiss como roteiristas. Nesta temporada, baseada no segundo livro da saga, A Clash of Kings, o universo da série se expande espetacularmente (dica: prestem atenção a cada abertura de episódio – os  lugares naquele maravilhoso mapa/brinquedo mudam de acordo com  o avanço da história por novas terras…) Benioff e Weiss, contudo, mantem a mão firme no leme da narrativa, simplificando, condensando e, em alguns casos, acrescentando elementos que ajudam quem não leu a se envolver e compreender perfeitamente o que está acontecendo.

Se a primeira Game of Thrones nos apresentava a proposta da luta pelo poder, esta segunda complica e amplia a discussão, envolvendo religião, economia e, cada vez mais, desejos e frustrações completamente pessoais na sangrenta disputa pelo trono dos Sete Reinos, muito fragilmente ocupado pelo jovem psicopata Joffrey (Jack Gleeson). É um prato cheio para os atores _ e agora, sem a carismática figura de Sean Bean para centralizar as atenções da platéia, é a vez de Peter Dinklage brilhar plenamente, com seu cada vez mais fascinante Tyrion Lannister instalado no olho do furacão da corte de King’s Landing.

O premiado Dinklage não está sozinho _ esta é uma temporada onde mulheres são essenciais, e a  fabulosa Cersei de Lena Headey encontra excelente companhia na Melisandre de Carice van Houten, a Margaery de Natalie Dormer (que foi Anna Bolena na saudosa The Tudors), a Yara Greyjoy de Gemma Whelan e, sobretudo, Gwendoline Christie como uma das personagens, para mim, mais fascinantes da saga, a guerreira Brienne of Tarth.

A produção é numa escala como não me lembro de ter visto na TV, e a direção e montagem mantem o ritmo preciso entre o revelar e o ocultar, dando tempo para conhecermos os personagens e nos envolvermos com eles.

Um banquete.


Mad Men, quinta temporada: a vida no formigueiro, antes da enchente
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Ana Maria Bahiana

Aviso: como estou falando de uma temporada que só estreia no Brasil mês que vem, há risco de SPOILERS. Tomo todo cuidado para evitar, mas ALGUM elemento tem que ser mencionado, certo?

A primeira vez que vi o episódio de abertura da esperadíssima quinta temporada de Mad Men eu fiquei meio decepcionada. Era como se alguma coisa estivesse faltando, ou não estivesse certa, ou não fosse exatamente como eu lembrava. Mais ou menos como quando você revê um velho amigo depois de uma longa ausência e, embora o calor da amizade ainda esteja lá, alguma coisa parece fora de ordem.

Com pessoas, em geral a estranheza é porque os dois mudaram. Mas quando revi “A Little Kiss”  eu tive uma epifania: Mad Men continuava exatamente o mesmo, eu é que tinha um ano e meio de televisão mais ou menos arquivada nas minhas retinas e no meu cérebro. Um ano e meio de um tipo de narrativa em que rápido é sempre sinônimo de melhor e apenas quando “os riscos são imensos” (jargão para “quando alguém morre , de preferência violentamente”) a história “vale a pena”.

Tinha me esquecido de que podia esperar, na minha (não tão) telinha, o mesmo deleite que me prende na poltrona do cinema quando um grupo de personagens usa bem seu tempo, suas falas, suas presenças para me dizer quem eles são, o que querem e para onde vão.

Don é quarentão. Dick também.

Vendo “A Little Kiss” pela terceira vez notei que Matthew Weiner, o criador e showrunner de Mad Men, também tinha levado em consideração o possível estranhamento do público depois de uma pausa de 18 meses entre o apressado, desesperado pedido de casamento de Don Draper para sua secretária Megan, no último episódio da quarta temporada, e o confuso despertar de sua filha Sally no luxuoso novo apartamento do papai, onde paredes vazias e caixas de papelão pelos cantos indicam uma mudança recente.  Uma grande parte das duas horas do episódio de abertura é dedicada a re-apresentar os personagens e a época aos espectadores, trazer-nos de volta ao longínquo (e tão presente, ainda hoje) ano de 1965, e às vidas dos publicitários e secretárias da Sterling Cooper Draper Pryce, seus amigos, famílias e amantes.

E então me lembrei de tudo _ de como Mad Men é sobre o complexo universo emocional e existencial de um grupo de pessoas vivendo seus dias numa época de visceral, violenta mudança, sem saber que todo o mundo à sua volta vai ser virado pelo avesso. São pequenos passos, cada qual minúsculo e imenso ao mesmo tempo.

A poderosa Peggy e sua equipe

Don faz 40 anos. Peggy é líder de um time de criativos e tem um namorado jornalista de “jornais underground” (que delícia!). Roger não tem o que fazer. Peter sonha com um escritório maior, uma piscina e, talvez, a possibilidade de não ser mais quem ele é – o jovem pai de familia bem sucedido enfurnado nos subúrbios. Joan descobre-se, para sua surpresa, uma mulher que ama seu trabalho. Fuma-se maconha na varanda de uma luxuosa cobertura. Há passeatas pelos direitos civis onde só estão “negros, policiais e padres”. Uma banda de iê iê iê anima uma festa.

São pequenos passos num universo imenso, e somos convidados a ver cada um deles de perto, muito de perto, quase como ontomologistas observando um formigueiro onde as formigas tem alma e desejos. E sabendo que em breve haverá uma enchente.

Então está tudo certo _ a excelência em televisão ainda é possível. E mais de três milhões de pessoas concordam comigo.

Tags : mad Men


Jogos Vorazes na tela: bem-vindos a Panem
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Ana Maria Bahiana

Gosto muito da trilogia Jogos Vorazes. Por um milhão de motivos que não cabem aqui tenho especial interesse no que se produz para o público adolescente, em livro, cinema ou TV. Chama a minha atenção, imediatamente, quando um título trata o adolescente como o adulto que ele já é, sem insultar sua inteligência ou menosprezar sua capacidade de compreender as complicações do mundo à sua volta. E é exatamente por isso que tenho especial predileção e carinho pela obra de Suzanne Collins.

Collins garante que a inspiração para sua obra veio de uma noite em que ela viu na TV, em rápida sucessão, jovens competindo num reality show e jovens lutando no Oriente Médio. Mas vejo raízes ou pelo menos paralelos claros entre Jogos Vorazes e outras obras literárias e cinematográficas: o mundo totalitário do livro 1984, de George Orwell; o reality show onde os participantes tem que matar-se mutuamente do filme indie Series 7:The Contenders, de 2001; e principalmente o japonês Battle Royale, de Kinji Fukasaku onde, num Japão dilacerado do futuro, adolescentes são anualmente encerrados numa ilha e obrigados a combater até a morte. Lançado em 2000, Battle Royale provocou tamanha controvérsia no Japão e em vários outros países que sua exibição foi suspensa ou mesmo vetada (para felicidade dos cinéfilos, Battle Royale acaba de ser lançado em DVD/Blu-ray. Vale conferir.)

Quem, como eu, gosta dos livros, não vai se decepcionar com o filme de Gary Ross, que estreia no EUA, no Brasil e no mundo nesta sexta feira, dia 23. Com todas as dificuldades que fazem parte do processo de adaptar uma obra literária para a tela, Jogos Vorazes é um dos filmes mais fiéis ao texto original desde, pelo menos, Onde os Fracos Não tem Vez, dos irmãos Coen, em 2007.

O que, em si só, não é pouca coisa. Para quem passou os últimos dois anos em Marte: Jogos Vorazes (e seus dois livros seguintes), passa-se num futuro não muito distante, em Panem, o país totalitário que restou da América do Norte depois de uma série de desastes ecológicos e guerras civis. O governo, ditatorial e riquíssimo, controla uma população mantida em estado perpétuo de carência e fome. E, todos os anos os “tributos”, dois jovens de cada um dos 12 distritos de Panem, são escolhidos por sorteio para lutarem entre si até a morte, diante das câmeras de um reality show assistido em todo o país _ os Jogos Vorazes do título.

Um dos principais desafios do livro de Suzanne Collins é sua narrativa na primeira pessoa. O leitor só sabe o que a heroína Katniss Everdeen – um dos “tributos”  do paupérrimo Distrito 12 – sabe, só vê o que ela vê, só sente e percebe as emoções dos outros à sua volta pelo prisma de seus sentimentos e emoções. Num filme  que, além de outras coisas, espera atrair para o cinema pessoas que não leram e não conhecem o livro, isso é um problemão _ é preciso achar um modo de explicar e contextualizar um monte de coisas que impulsionam e justificam a ação.

O roteiro – da própria Suzanne Collins com Ross e  Billy Ray (A Guerra de Hart, Intrigas de Estado) – resolve perfeitamente a questão, tomando pequenas mas eficientes liberdades. Não estamos mais, como no livro, dentro da cabeça de Katniss, mas o seu ponto de vista é o que impera. E Jennifer Lawrence, que praticamente fez uma prévia do papel em outra sobrevivente indômita, a Ree de Inverno da Alma, é mesmo a escolha perfeita para viver Katniss.

Ross (Seabiscuit, Pleasantville)  imprime ao roteiro um ritmo perfeito, abrindo espaços para o contexto do medonho mundo de Panem, com pequenos mas importantes detalhes adicionais como (SPOILER !) uma sequência de insurreição filmada, em segunda unidade, por seu amigo Steve Soderbergh. É um modo de  deixar claros, com este e outros detalhes, os elementos que levarão a história mais adiante.

Os 80 milhões de dólares do orçamento parecem muito comparados com filmes independentes, mas na verdade são um custo modesto para uma produção com esta amplitude. E olhos espertos poderão notar que, embora a direção de arte seja impecável, informada tanto pelos Estados Unidos da Grande Depressão dos anos 1930 quanto pela França totalitária e dividida de Luis XVI e Maria Antonieta, os efeitos digitais flertam com o desapontamento. Talvez por isso não fiquem muito tempo na tela _ porque um pouco mais de tempo e eles não segurariam o impacto.

Como no texto de Collins, a violência de Jogos Vorazes nunca é gratuita ou sem consequências. A simples existência da violência na história é um comentário sobre seu uso perverso como instrumento de opressão. Ao sadismo de uma sociedade entusiasmada pelo espetáculo de jovens se matando o filme, como o livro, propõe a dignidade da caçadora Katniss, que sabe o valor da vida porque, diariamente, precisa decidir sobre ela _ matar o animal na floresta ou permitir que sua familia morra de fome?

Ross abrandou a violência em Jogos Vorazes, colocando alguns momentos mais sangrentos fora da câmera e detendo-se o mais breve e delicadamente possível sobre algumas mortes essenciais. Violência não é diversão, seu filme diz. Violência tem um custo e um peso.

Onde tenho mais respeito e admiração pelo trabalho de Ross é por isso, por sua integridade em manter o compromisso do livro com  temas complicados e espinhosos: o poder do indivíduo e da consciência, a violência institucionalizada como método de controle, o interminável sacrifício da juventude no altar do jogo de poder.

São ideias que se encontram também nas obras que citei lá em cima, mas a oportunidade e a precisão com que elas foram expressas por Collins em seus livros explica porque eles se tornaram um sucesso tão imenso _ porque num mundo em que adolescentes são exterminados diariamente em guerras, atentados, tiroteios, na miséria, no abandono, recrutados como bombas humanas, aviões do narcotráfico, vítimas de guerras civis, enfiados em escolas sem professores, familias fraturadas, cidades doentes, a história de Katniss e seus companheiros de mortandade de Jogos Vorazes faz muito sentido, real e imediato.

 


Como o realismo (e o baixo astral) acabaram com Luck
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Ana Maria Bahiana

É extremamente raro eu comentar uma série e , no post seguinte, ter que tecer considerações sobre seu cancelamento.

Mas este é o destino da ironicamente intitulada Luck, que tanto me empolgou em sua primeira temporada. E que, por motivos que exploramos a seguir, foi suspensa no meio das filmagens do que seria a segunda temporada.

A morte de um terceiro cavalo foi o estopim do cancelamento, mas os problemas da série vem de antes, e nem todos envolvem quadrúpedes. Desde a filmagem do primeiro episódio – que foi ao ar nos EUA, como uma preview/ teste em dezembro – pessoas ligadas à produção me diziam que havia uma tensão palpável e muitas vezes explosiva entre o criador David Milch e o produtor Michael Mann. Milch tem a reputação de ser temperamental, teimoso e arrogante _ uma combinação que não é incomum na indústria, mas nem por isso torna as coisas mais fáceis.

David Milch, Dustin Hoffman e Michael Mann na estréia de Luck, em Los Angeles

Dustin Hoffman –que, além de protagonista, também é produtor de Luck – ficava de fiel da balança,  ponto de equilíbrio. Hoffman é queridíssimo por colegas atores e técnicos da equipe, que muitas vezes sofriam com o pavio curtíssimo de Milch. Antes da morte do terceiro cavalo, durante as filmagens desta semana, já havia um clima de quase guerra no set, entre Milch e  Mann, e entre Milch e a equipe. Parte do acordo do showrunner com a HBO incluia a previsão de que ele dirigisse episódios no caso de haver uma segunda temporada. Milch, me contam minhas fontes, não tem a paciência necessária para lidar com os imprevistos, prazos apertados e mudanças rápidas que são comuns numa produção. Muito antes do cavalo sofrer a bizarra queda que levou ao seu sacrifício, Milch já havia demitido pessoas chave da equipe, criado animosidades irrecuperáveis e, num incidente reportado pelo Los Angeles Times, ameaçado Michael Mann com um bastão de beisebol.

O baixo astral da morte dos dois primeiros animais em curto espaço de tempo já era uma nuvem desconfortável pesando sobre a produção. “Eu mesmo fiquei na dúvida se poderíamos ou mesmo deveríamos ir em frente”, Hoffman me disse numa entrevista quando a segunda temporada começava a ser filmada. “A morte dos dois cavalos foi muito triste. Ninguém gosta de sacrificar um animal, ainda mais esses que considerávamos como colegas de elenco.”

Os dois acidentes, ocorridos durante a filmagem de cenas de corrida, fizeram com que a Humane Society, que monitora o tratamento de animais no cinema e TV, retirasse seu endosso a Luck durante vários episódios. A PETA, mais vocal ativista dos direitos dos animais, vinha liderando protestos contra a série desde então, alegando que os cavalos usados não tinham mais idade ou condições físicas de participar das árduas cenas de páreos, principalmente porque, como em todo projeto, as tomadas precisavam ser repetidas várias vezes.

Tanto a Humane Society quanto a PETA haviam sugerido à produção que usasse material documental, filmado durante verdadeiras corridas de cavalos e /ou efeitos digitais. Milch, contudo, insistia no realismo das tomadas, feitas exclusivamente com cavalos recrutados nos serviços que alugam animais para cinema e TV.

Some-se tudo isso a críticas divididas e audiência baixa, e temos  a sentença de morte de Luck.

Ainda bem que Mad Men não tem cavalos. Ou David Milch.

 

 


Sorte, história, memória: as boas ofertas da nova temporada da TV
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Ana Maria Bahiana

Jeffrey Dean Morgan em Magic City

Dustin Hoffman em Luck

As ofertas desta época do ano, no cinema, são anoréxicas. Vê-se por honra do ofício, mas, sinceramente, é melhor passar batido. Já na TV… cada vez melhor, e a segunda de Game of Thrones e a quinta de Mad Men ainda nem começaram.

Há alguma coisa no arco longo da narrativa televisiva que oxigena a história, dá espaço para conhecermos os personagens sem a pressa e a enxurrada de clichês que o cinema (principalmente o cinema estritamente de mercado), comprimido em suas duas horas de tela, joga em cima da gente.

É um formato que cada vez mais atrai vida inteligente – em grande parte, ainda, por conta do verdadeiro big bang que foi Familia Soprano, que criou e depois espalhou pelo mercado uma nova geração de roteiristas, diretores e show runners.

Duas estréias me chamaram especialmente a atenção:

Magic City (Starz, estréia 6 de abril) é a resposta do canal Starz à febre-saudade deflagrada por Mad Men. A Starz tem um perfil interessante _ começou como canal pago só de filmes e hoje abriga, entre outras, a bem sucedida Spartacus (a fraca e cara Camelot não teve tanta sorte…) Seu atual diretor é o mesmo Chris Albrecht que deu o ok para Sopranos na HBO ; e , pelo que me contam  as cabeças coroadas da cidade, voltou, com a Starz, a ser um dos mais ativos armadores meio de campo do jogo de conetúdo de qualidade para telas menores (e portáteis).

O criador e show runner Mitch Glazer, que nasceu e cresceu em Miami, criou um universo que é metade história, metade memória _ e quando Magic City funciona, ela está exatamente no perfeito ponto de equilíbrio entre as duas coisas. A história, condensada no universo do fictício hotel Miramar Playa, é a soma das forças que definiram o perfil da cidade de Miami: glamour tropical, hedonismo, crime organizado, imigração. A época é cuidadosamente escolhida: Magic City começa na noite de ano novo de 1958 para 1959, com um show de Frank Sinatra, a revolução cubana reportada na TV, piquetes de greve nas ruas, e os tentáculos da Mafia misturando-se com a expansão da indústria do turismo. Há também muita praia, charutos, cha cha cha, twist e um concurso de miss, completando o clima.

No papel de Ike Evans, o dono do Miramar, Jeffrey Dean Morgan (mais conhecido como o  Comedian de Watchmen ou o namorado eternamente moribundo de Izzie em Grey’s Anatomy) ancora um elenco repleto de gente bonita espetacularmente bonita . Uma grande parte desse povo não tem muito que fazer além de caras, bocas e muito sexo (mas esse é o clima da série, de todo modo).   Felizmente o filé da narrativa é o tango entre Ike e Ben Diamond (Danny Huston, ótimo), o cappo mafioso que é ao mesmo tempo seu aliado e seu inimigo.

É no ambiente – que, como Glazer explica, é tanto um trabalho de reconstrução quanto de memória afetiva – que Magic City triunfa mais rapidamente, transportando o espectador/espectadora imediatamente para um mundo muito além da Miami nova-rica de hoje. É um dos grande trunfos de sua competição mais clara, Mad Men. Mas,ao contrário de Mad Men, Magic City ainda não encontrou a segurança de ritmo e a profundidade psicológica que pode leva-la além de uma deliciosa excursão turística aos trópicos made in USA. Mas promete _ vale dar tempo ao tempo.

Confesso que fiquei passada quando as primeiras críticas de Luck (HBO, no ar desde 29 de janeiro) foram mornas ou negativas. Eu me apaixonei de cara pela série criada e escrita por David Milch (NYPD Blue, Deadwood e outra que acho que só eu gostei, John From Cincinnati) e produzida por Michael Mann e Dustin Hoffman. E não é só porque pega completamente o jeito, o gosto e a aura de Los Angeles e explora com precisão a subcultura das corridas de cavalos e seus habitantes: amei porque imediatamente fiquei intrigada por todos os personagens, curiosa para saber mais sobre eles, de onde eles tinham vindo, como tinham chegado aquela encruzilhada da vida, para onde iriam.

Como a agência de Mad Men ou o hotel de Magic City, Luck tem um universo preciso: Santa Anita Park, em Arcadia, a leste de Los Angeles, que existe mesmo e é considerado (com justiça) um dos mais belos hipódromos do mundo. Com as vidas entrelaçadas às de seus habitantes mais importantes, os puro-sangues (e dois deles são, de direito e de fato, personagens principais da série),um universo de jóqueis, apostadores, treinadores, agentes, funcionários e proprietários oscila na maré entre sorte, escolha e destino, onde cada pequeno passo pode mudar tudo.

Nenhum personagem é pequeno demais. O arrogante treinador Escalante (John Ortiz, excelente), os jovens jóqueis ambiciosos (Kerry Gordon e Tom Payne), o quarteto de apostadores tão viciados que mora num motel ao lado do hipódromo (Kevin Dunn, Jason Gedrick, Ritchie Coster, Ian Hart) são todos igualmente importantes e fascinantes.

Mas estou particularmente impressionada por um quarteto de homens de meia idade interpretados por mestres, cada sutileza de suas interpretações um testemunho do poder da maturidade: o agente de jóqueis Joey Rathbun (Richard Kind), uma bomba existencial prestes a explodir; o treinador Walter Smith (Nick Nolte), curvado sob o peso de uma culpa imensa, capaz de criar laços de verdade apenas com seu cavalo; e a sensacional dupla de amigos e confidentes Chester Bernstein (Dustin Hoffman) e Gus Dimitrou (Dennis Farina), cujos planos e estratégias são o motor da trama (embora só eles mesmos saibam como).

Espero que Luck dure muito. A cada novo episódio ela me vicia mais…


E agora com vocês… os Oráculos do Oscar 2012!
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Ana Maria Bahiana

Foi uma batalha, entre os torpedos da “melhor montagem” e sucessivas contagens e recontagens noite adentro… Mas valeu: aqui estão, em toda a sua glória, os Oráculos do Oscar 2012! Palmas para eles!

(Dê “refresh” regularmente- novos nomes serão acrescentados à medida em que eles aparecerem aqui neste Hollywood & Highland virtual…)

Fazendo honra às oráculos da antiga Grécia, Nathally da Silva Carvalho, 25 anos, de Macaé, RJ,  foi a única mulher na tropa de elite dos acertadores. Cinéfila desde a adolescência, Nathally estuda Ciências Sociais na Uenf.

Sou cinéfila desde o começo da minha adolescência, quando minha percepção se tornou mais aguçados para a sétima arte: queria saber mais sobre os atores, suas filmografias, os diretores, e como os filmes eram feitos.

A partir de então comecei a pesquisar sobre a indústria, a alugar 4, 5 até 6 filmes por fim de semana e a ver com as grandes premiações como o Globo de Ouro e o Oscar. Fiquei muito feliz em saber que estou entre os Oráculos 2012. Fiz minhas apostas observando muito as críticas, (principalmente as categorias ‘bombas’ como documentário e curta), já que não tive muito tempo para ver os filmes indicados esse ano. Como disse uma grande amiga, acho que meus 20 acertos são creditados muito a um misto de sorte, instinto e conhecimento sobre o Oscar (muito pelas dicas que a própria Ana dá, todos os anos, de como são os mecanismos de votação). Acho que meu grande trunfo esse ano foi apostar sem ressalvas na Meryl Streep como Melhor Atriz, tinha certeza que esse ano era dela!

Gostaria de agradecer a Deus pela dádiva de ser uma cinéfila; a Ana pela oportunidade de exercitar minha paixão pelo cinema, não só vendo – e lendo sobre a sétima arte, mas também participando do Oráculo do Oscar; agradeço a Jairo Souza meu grande amigo cinéfilo, com quem troco grandes experiências e dicas sobre cinema e séries (minha vitória é sua também!) e agradeço a Nathália Fernandes que acompanhou a noite do Oscar comigo, via internet, e vibrou com cada acerto meu. Agradeço a todos os grandes homens e mulheres da indústria, que trabalham com afinco para trazer um mundo de sonhos, reflexões e aprendizado para todos aqueles que se propõem a ver no cinema muito mais do que algumas horas de diversão.

Parabéns a todos os outros oráculos de 2012, e que 2013 tenha uma safra de filmes encantadoramente surpreendentes.”

 

 

O advogado Francisco de Assis Nóbrega, 28 anos, é recifense mas mora em Caruaru, PE, onde é Defensor Público Federal.

“Desde criança adoro ir ao cinema e colecionar filmes. Antes videoteca, atualmente DVDoteca, tenho filmes de todos os gêneros, estilos e nacionalidades, atualmente são mais de 600 títulos. Vidrado no Oscar, desde o ano 2000 organizo um bolão para amigos e faço uma pequena festa para receber os mais cinéfilos e loucos pelo Oscar feito eu, já é tradição! A estatueta em miniatura ao lado da TV dá o toque especial da festa! rs Após chegar perto em várias edições, estou muito feliz em ser um dos oráculos deste ano! Muito obrigado por organizar com tanto carinho o oráculo!”

Lucas Lôbo Takahashi é, na verdade, colega de Angelina Jolie  e George Clooney : todos eles trabalham para a mesma entidade,a Agência para Refugiados das Nações Unidas. A diferença principal é que Lucas está em Brasilia,DF, onde também estuda Relações Internacionais.

Eu nasci e cresci em uma cidade pequena, que não tinha cinema. Quando eu ia pra capital, assistia quatro ou cinco filmes no mesmo dia, e nunca me cansava. Sempre fui apaixonado por cinema, e o Oscar era umas das únicas maneiras de ter contato com aquele mundo, em uma época em que internet não era tão popular. Assim, vejo a cerimônia desde os sete ou oito anos, e nunca deixei de ver. Por isso, mesmo depois ter deixado de achar que o Oscar é um parâmetro de qualidade, eu ainda me importo com ele. E ganhar esse bolão e todos os brindes que você está dando me traz muito satisfação!  Obrigado! Espero lhe conhecer um dia!

Eduardo Azeredo Salgado, 31 anos, de Pindamonhangaba, SP, trilha o caminho de muitos realizadores ilustres: desde os 14 anos trabalha numa locadora de filmes. E mesmo não tendo cinema na cidade, não perde sua paixão pela Sétima Arte:

“Cinema sempre fez parte da minha vida, a primeira lembrança que tenho de ver um filme quando criança foi o filme A Missão com meus pais e de lá pra cá essa paixão pela Sétima Arte só aumentou. Por isso já faz muito tempo que vejo o Oscar e dou meus palpites, que desta vez deram resultado!”

Rodrigo Santiago,  23 anos, doutorando de Ciência Política em Recife,PE, é fã de Meryl Streep… e de Bette Davis também.

“É um prazer ser um Oráculo 2012! Há algum tempo, as atuações da Bette Davis e da Meryl Streep fizeram-me ver o cinema como uma forma de arte que vai além do entretenimento. A força das atuações dessas atrizes, bem como a direção e filmes do Ingmar Bergman, transformaram-me em um ávido apreciador da sétima arte. A partir do momento que tive contato com essas figuras, em especial, tornei-me um leigo que busca ler sobre a temática e, que de vez em quando, arrisca escrever algumas críticas sobre películas. Acho que essa bagagem, juntamente, com o acompanhamento das temporadas de premiação ajudaram a alcançar esse posto (o que não é fácil, principalmente, quando se tenta prever as categorias técnicas, documentários e curtas). Em síntese, eu agradeço ao cinema, por ele ser capaz de transformar a fantasia em realidade, e, ao mesmo tempo, mostrar as várias facetas do caráter humano. O cinema, quando nos faz refletir, cumpre o seu objetivo mais fundamental enquanto arte, ele propicia ao espectador o sentimento de estar vivo. “

Rafael Susin Baumann, 19 anos, estudante de arquitetura em Caxias do Sul, RS, participou pela primeira vez do Oráculo e já saiu na dianteira:

“Gostaria de lhe agradecer pela oportunidade, agradecer a aqueles que ainda suportam ir ao cinema comigo e, claro, agradecer a todos que tornam o cinema algo possível. Desde os 9 anos lembro de ir atrás de informações relacionadas ao cinema, principalmente comprando revistas relacionadas ao assunto. As idas à locadora e ao cinema tornaram-se frequentes e comecei a fazer uma lista com todos filmes que assistia (e até hoje não deixei de marcar). Aos poucos, já não havia mais lançamentos para alugar e comecei a ir atrás do cinema de verdade. Foi aí que descobri diretores como Hitchcock (meu favorito). Assim, o cinema tornou-se indispensável.  Não lembro exatamente a partir de que ano comecei a acompanhar o Oscar, mas lembro perfeitamente de Chicago ganhando como melhor filme (e tenho que admitir, não considero uma injustiça como a maioria acredita ser). Quanto ao Oscar desse ano, a maior surpresa da noite para mim foi montagem para Millenium. Uma mistura de satisfação (por ser realmente o filme merecedor do prêmio, e, na verdade, merecia uma indicação para melhor filme) e tristeza (por ser um ponto a menos nas apostas). Foi difícil conciliar favoritos com as apostas na hora da torcida, mas, fiquei satisfeito principalmente com roteiro para Meia-Noite em Paris, Rango como animação e os prêmios para Hugo.”

 Lucas Mateus, 27 anos, é pedagogo em Natal, RN e não perde uma premiação desde que Steven Spielberg ganhou com A Lista de Schindler:

É uma honra poder ter superado tanta gente boa no Oráculo do Oscar 2012. Acompanho a festa do Oscar desde criança, nos tempos em que Steven Spielberg ganhara seu tão aguardado prêmio de Diretor em 1994 por Schindler’s List. Desde então, não tenho perdido uma premiação, sempre testemunhando as vitórias e as injustiças que fazem parte do espetáculo. Acredito que o cinema seja a forma de arte que melhor retrata uma era da sociedade e o Oscar expõe, de alguma maneira, essas transformações que nós protagonizamos de tempos em tempos.”

Rafael Melo Feitosa, 23 anos, é carioca e blogueiro:

“É clichê, mas palavras não podem definir a minha relação com o cinema. É algo extremamente sensorial e que existe desde que me entendo por gente. O Oscar tem, para mim, a importância de uma Copa do Mundo. Sinto-me envolvido como se fizesse parte da indústria cinematográfica… torço, vibro, reclamo, discordo. Meu obrigado: à minha mãe por ter me apresentado ao Oscar quando eu tinha 7 anos; aos cineastas brilhantes que mantêm sempre acesa a minha paixão pelo cinema; e àqueles que disponiblizam os filmes na Internet, que fazem com que a cultura não tenha mais barreiras e que nos possibilitam assistir a todos os indicados. E, claro, muito obrigado à Ana Maria Bahiana por nos propiciar essa promoção espetacular com prêmios maravilhosos.


Temos Oráculo!
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Ana Maria Bahiana

Lisbeth Salander massacrou muita gente boa: a categoria “melhor montagem” foi a responsável pelo maior número de erros, mais até do que a habitual carnificina de curtas e documentário. Muita gente torceu pelo Brasil com seu voto, com tristes consequencias. E, é claro, Meryl Streep fez um belo estrago….

No final, vocês bateram um recorde : 587 apostadores do Japão ao Maranhão, do Canadá a Curitiba. A média de acertos foi alta – 17 das 24 categorias- e 8 acertaram 20 categorias: Lucas Mateus,  Rafael Melo Feitosa (que, sabiamente, incluiu abraços para Isis e Lady Orlando; não sei se elas tem tamanho poder, mas enfim…) Francisco Nóbrega, Nathally Carvalho, Eduardo Azeredo Salgado, Lucas Takahashi, Rodrigo Santiago e Rafael Susin.

Na prata, com 19 acertos ficaram  Michel Moraes, Renato Verizini, Guanali Taquini Deolindo, João Paulo, Breno Ricardo, Joseilton Lima Filho, Vinicius de Oliveira,Heyda Corado, Rodrigo Santiago, Paulo Debom,Alexandre Anan, Bruno Litvak, Bells Aleixo, Patrick Muraro, Nilson Jr., Ana Mary P.Lima e Daguito Rodrigues.

E, vocês sabem: não sou a Price Waterhouse… se você enviou seu voto, votou em todas as categorias, acertou 21, 20 ou 19 delas e seu nome não está aqui, dispare um email para uma recontagem. Isis e Lady Orlando estão a postos!

Parabéns aos novos Oráculos, que receberão as devidas honras e emails de desculpas pelos meus repetidos erros. Não é mole contar quase 600 votos (acho que vou demitir Isis e Lady Orlando e contratar a Price Waterhouse, ano que vem).

E, sobretudo, muito obrigada a todos vocês que participaram! Sem vocês esta brincadeira não faria sentido…

 


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