Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : agosto 2011

Uma conversa com Andy Serkis: “Nunca me importei com minha cara, quero me perder nos personagens”
Comentários Comente

Ana Maria Bahiana

Quando, nos idos de 1998, os avanços da tecnologia digital de imagem se encaminhavam para o inevitável – a manipulação do desempenho dos atores a serviço da criação de personagens virtuais – a maioria da classe ficou entre o pânico e a fúria. Na contramão da revolta, Andy Serkis, inglês de origem armênia com uma longa carreira no cinema e TV britânicos (inclusive no ótimo Topsy Turvy-O Espetáculo, de Mike Leigh), resolveu investigar o suposto monstro.

“Eu compreendo que muitos atores não tenham gostado e ainda não gostem dessa opção”, Serkis diz numa manhã de verão em Los Angeles, claramente cansado de tanto promover Planeta dos Macacos-A Origem, mas igualmente animado ao discutir seu trabalho nele. “Para eles, ter seu rosto na tela é essencial para o trabalho que fazem, é como eles se expressam. Mas eu nunca me importei com minha cara, e sim com os personagens que interpreto. Ter mais uma ferramenta para me perder nos personagens me pareceu irresistível.”

Três anos depois Serkis estava na tela, irreconhecível, como Smeagol/Gollum no primeiro filme da trilogia O Senhor dos Anéis, de Peter Jackson. Foi o início de uma colaboração tão produtiva que Serkis mudou-se parcialmente para a Nova Zelândia, mantendo uma casa em Wellington só para ficar próximo do quartel general da WETA Digital _ para quem continuaria sendo Gollum e, em 2005, o Kong do King Kong de Jackson. A mais nova colaboração de Serkis com a WETA, o Capitão Haddock de Tintin e o Segredo do Licorne, estreia mundialmente em dezembro.

Com Planeta dos Macacos- A Origem nas telas brasileiras  é mais fácil conferir o enorme de talento de Serkis como Caesar, o chimpanzé que, aos poucos, adquire inteligência e sensibilidade humanas  (ou ,seria melhor dizer, uma alma?). Aqui, o ele tem a dizer sobre a experiência, os macacos e viver plenamente um outro ser.

 


Você teve uma inspiração individual para Caesar?

_ Tive. Além de toda a pesquisa que venho fazendo com primatas desde King Kong eu me inspirei diretamente em Oliver, um chimpanzé que foi muito popular nos anos 1970 porque andava sempre em duas patas e exibia uma série de comportamentos que podíamos chamar de humanos. Na época ele foi promovido como “o elo perdido”  e a própria comunidade científica acreditou nessa possibilidade e submeteu Oliver a várias experiências. Quando se comprovou que ele era apenas um primata inteligente e, possivelmente, treinado, ele foi abandonado e posto numa jaula. Para mim ele é o centro do personagem Caesar: um inocente que, gradualmente, toma consciência do mundo à sua volta.

 

Existe alguma técnica específica para o trabalho com captura de desempenho (mocap)?

_Muitos atores ainda acham que é preciso ser exagerado, fazer uma performance carregada, uma pantomina, para render bem em mocap. Minha experiência me diz o contrário: a tecnologia é perfeitamente capaz de captar os movimentos mais sutis dos músculos, dos nervos. O desempenho precisa ser o que todo desempenho deve ser: sentido de dentro para fora, com integridade absoluta, fiel à verdade do personagem. Com mocap não dá para fingir. Se existe uma técnica específica para o desempenho em mocap é ser preciso. A precisão rende os melhores resultados.

 

Como a técnica em si evoluiu nessa década em que você trabalhou em mocap?

_ Eu me lembro que no Senhor dos Anéis o trabalho teve que ser em duas etapas: uma primeira em que trabalhei contracenando com outros atores num set normal, e depois a parte da captura, que foi separada, num estúdio menor. E no fim tivemos que refazer várias tomadas onde havia closes de Gollum, para que a sincronicidade fosse perfeita. Era mais um trabalho de animação, e os animadores tinham que criar expressões faciais para o Gollum a partir do que havíamos filmado. Em King Kong já tínhamos marcadores faciais, e eram eles que guiavam a “marionete digital” _ todas as expressões faciais de Kong eram, literalmente, as minhas expressões, direto do meu rosto.

No Planeta do Macacos todos os equipamentos estavam mais leves e portáteis e a tecnologia muito mais ágil. Podíamos trabalhar como um grupo de atores, contracenando, inspirando-nos pelas atuações dos outros, respondendo aos movimentos, interagindo, e tudo era captado. Mais que isso: podíamos usar o mesmo processo em sets vivos, em locações, dando muito mais campo para trabalharmos com objetos, com reações diretas ao ambiente.

 

Seu trabalho como ator muda de um filme “normal” para um filme mocap?

_Não… ser ator é ser ator. Não tem diferença para mim. Ser ator é conscientemente se perder em outra pessoa, outro ser. Não faz diferença se esse outro ser é (o punk rocker) Ian Dury (que Serkis interpretou em Sex and Drugs and Rock n Roll, de 2010) ou Caesar em Planeta dos Macacos-A Origem. O trabalho é sempre achar a verdade do personagem, entrar em sua mente, procurar sua fisicalidade e construir emocionalmente o personagem, de dentro para fora. Nunca faço distinção entre  um trabalho ao vivo e um trabalho mocap.

 

Deveria haver uma categoria nos prêmios para atuações mocap?

_Não sei. No fim das contas, todas as interpretações são interpretações humanas, conduzidas pelo ator. Se a interpretação é mostrada, em última forma, realistica ou estilizadamente, isso não altera o essencial, que é o trabalho do ator. Animação, mocap são apenas ferramentas. O que as anima é o espírito do ator.

 


O vampiro mora ao lado: por que o novo Hora do Espanto é melhor que o original
Comentários Comente

Ana Maria Bahiana

Colin Farrell e Imogen Poots no novo Hora do Espanto...

Chris Sarandon e Amanda Bearse, no Hora do Espanto de 1985

Quando A Hora do Espanto passou pelos cinemas nos idos tempos de 1985 confesso que não me impressionou muito. Não era – sem trocadilho – de se espantar: os primeiros anos 1980 foram uma era de fartura de excelentes filmes de terror, começando pelo impossivelmente profundo e apavorante O Iluminado, de Stanley Kubrick e incluindo várias outras adaptações de Stephen King – Cujo, Christine, Colheita Maldita; o lançamento de franquias como A Hora do Pesadelo, Sexta Feira 13 e Halloween; George Romero continuando sua saga zumbi com O Dia dos Mortos, Sam Raimi dando o seu troco com Evil Dead. Steven Spielberg escrevia e produzia Poltergeist para Tobe “Massacre da Serra Elétrica” Hooper dirigir, e a fronteira entre riso e grito era amplamente explorada por filmes como Um Lobisomem Americano em Londres, No Limite da Realidade (ambos de John Landis, que também dirigiria o histórico curta/clip Thriller, de Michael Jackson) e Gremlins, de Joe Dante.

Era uma safra e tanto e, olhando em perspectiva, ali estavam os fundamentos do slasher e do terror modernos, empurrando tanto os limites do que era permissível mostrar quanto a profundidade do mergulho psicológico. Efeitos digitais ainda eram um sonho distante, mas os efeitos físicos, principalmente próteses, robótica e animatronics davam um salto quântico nas mãos de uma geração de jovens técnicos criados pelos filmes B dos anos 60: Rick Baker, Chris Walas, Richard Edlund, Greg Nicotero, Stan Winston.  Parceirados com uma nova geração de realizadores com as mesmas influências – Landis, Hooper, Dante, Raimi, mais Wes Craven, John Carpenter – eles realizavam a proposta de, ao mesmo tempo, mais realismo e mais fantasia, o impossível tornado mais aceitável e, por isso, mais assustador.

Com tanta fartura não é de estranhar que A Hora do Espanto tenha passado batido pela minha memória. Vampiros não eram muito comuns nessa safra, e os sofisticados, sexy habitantes de Fome de Viver, de Tony Scott (Catherine Deneuve, Susan Sarandon e David Bowie!!!!) eram muito mais memoráveis. A encruzilhada comédia/terror também não era novidade, assim como não era a inclusão do extraordinário (e extraordinariamente terrível) no cotidiano mais banal (Stephen King era e ainda é mestre nesse setor).

Revisto hoje, A Hora do Espanto de 1985 aparece mais como uma ideia – adolescente tem certeza de que seu vizinho é um vampiro, contra a descrença de todo mundo- não inteiramente resolvida, com um elenco  em grande parte fraco, mais aqueles cabelos e ombreiras absurdas dos anos 80. O que fica são exatamente os efeitos de Richard Edlund, impressionantes até mesmo 26 anos depois, e a presença calmamente aterrorizante de Chris Sarandon como o vampiro que mora ao lado (apesar das lapelas e echarpes…)

Refeito agora em (desnecessário) 3D por um jovem diretor – Craig Gillespie- muito bem escolado na TV (United States of Tara) e cinema independente (A Garota Ideal), o novo A Hora do Espanto é um desses raros casos em que a segunda tentativa ficou melhor que a primeira. Um espertíssimo roteiro de Marti Noxon ( bem treinada na TV: Buffy, A Caça Vampiros, Grey’s Anatomy, Mad Men) enfatiza o principal charme do original, a incrivel banalidade da situação em volta dos inesperados vizinhos. E resolve vários problemas do primeiro filme, principalmente os três personagens secundários (mas importantes): a namorada, a mãe e o melhor amigo. Uma boa escolha de elenco, a excelente fotografia de Javier Aguirresobe (Vicky Cristina Barcelona, A Estrada, A Better Life) e uma combinação impecável de efeitos físicos e digitais se incumbem do resto.

O assustadiço adolescente agora é o ótimo Anton Yelchin, que mora com a mãe (Toni Collette) nos subúrbios que mais crescem nos Estados Unidos: os de Las Vegas, surreais em si mesmos como comprova a sensacional imagem de abertura , um retângulo de luz perdido numa vastidão de nada, com a silhueta psicodélica da Strip de Las Vegas à distância. Para a casa ao lado, tão genérica quanto qualquer outra do condomínio, muda-se  o misterioso Colin Farrell, sedutoramente arrogante como pede o papel  ; a namorada é a inglesinha Imogen Poots (V de Vingança, Extermínio II), autoconfiante e despachada; e o melhor amigo, especialmente mal resolvido no filme original, agora é Christopher Mintz Plasse como mais um nerd oprimido pela espetacular mediocridade das turminhas de ginásio. (Numa alteração substancial e eficiente, neste Espanto é o amigo quem primeiro desconfia do vizinho _ porque,como bom nerd, ele possui vasto conhecimento da mitologia vampiral, e nutre especial repulsa pelos vampiros bonzinhos da série Crepúsculo).

Outra transposição muito bem feita foi a do “caçador de vampiros” Peter Vincent (o nome uma homenagem a dois grandes do horror clássico- Peter Cushing e Vincent Price).  Em ambos os Espantos seu papel na trama é representar  o passado do mito do vampiro na nossa cultura pop e a possibilidade de verdade atrás das histórias que contamos para nós mesmos. No primeiro filme ele era um apresentador de TV (Roddy McDowall) relegado ao horário da madrugada, apresentando filmes B, C e Z para impressionar adolescentes insones. Como a TV hoje não tem mais esse poder, o novo Peter Vincent (o inglês David Tennant) é um astro de Las Vegas na linha Criss Angel, rock n roll, gótico, cheio de atitude. Seu posto na narrativa continua o mesmo: seus truques recriam cenas clássicas dos filmes de terror, relembram as regras do mundo vampiresco, reancendem seu poder em nossa mente… e na dos impressionáveis adolescentes lidando, possivelmente, com um vizinho sinistro.

Se você não viu o filme de 1985, mais não contarei (a não ser alertar para a presença de Chris Sarandon numa ponta saborosa…) . Digo apenas que a mesma mistura de riso e susto está presente aqui, muito melhor expressada e resolvida, com um  aceno de respeito à trajetória da mitologia. E, muito importante, com vampiros como os dos bons tempos, famintos, cheios de dentes, sem dar a mínima para nós, pobres mortais. Se você quer um passatempo bem feito para uma noite de sábado, não há como errar.

A Hora do Espanto está em cartaz nos EUA e tem estreia prevista no Brasil para dia 7 de outubro.

[uolmais type=”video” ]http://mais.uol.com.br/view/11963266[/uolmais]

 


No final da temporada pipoca, a festa da Disney. Mas onde está Tonto?
Comentários Comente

Ana Maria Bahiana

Dez dias no Brasil e , na volta, encontro Los Angeles na habitual modorra do final do verão. Toronto e Veneza já anunciaram sua programação, mas ainda falta o mais importante: Telluride, o pequeno que satisfaz  _ e que este ano tem Caetano Veloso como diretor convidado. Com uma curadoria rigorosa e apaixonada e uma seleção de primeira, mas limitada pelo tamanho do evento – quatro dias- Telluride tem-se tornado o melhor indício de quem realmente está com bala na agulha para a temporada ouro (quem passou por Telluride 2010? Uns filminhos: O Discurso do Rei, Cisne Negro, 127 Horas… No passado? Sangue Negro, Benjamin Button, Quem Quer Ser um Milionário?..).

Mas não adianta ficar ansioso:  fiel à sua tradição, a programação 2011 de Telluride só será anunciada dia 1, véspera da abertura do festival.

Resta o rescaldo da temporada pipoca: três dias de delírio nerd (ou melhro: disnerd..) à sombra do castelo da Bela Adormecida em Anaheim, subúrbio ao sul de Los Angeles, na segunda edição da Expo D23. Recapitule-se: a D23, mega fã clube oficial de tudo o que se relaciona ao mundo Disney, foi criado em 2009 pelo presidente do conglomerado, Robert Iger. No mesmo ano o D23 (D de Disney, 23 para 1923, seu ano de fundação) lançou a primeira versão de sua Expo, uma espécie de Comic-Con particular dedicada exclusivamente à Disney.

Em 2010, sacudida por mudanças corporativas, a Disney não organizou uma Expo. Este ano, contudo, a temporada pipoca foi encerrada extra-oficialmente neste fim de semana, com barracas temáticas, personagens Disney ambulantes e, principalmente, apresentações dos próximos projetos Disney, aí incluídos os títulos Pixar e Marvel.

É um momento sensível para tanta festa. A toda poderosa Pixar está atravessando um ano pálido à sombra da inesperada concorrência da Fox (Rio) e Paramount (Rango); a última animação tradicional do estúdio, A Princesa e o Sapo, não brilhou como esperado na bilheteria; e um verão abarrotado de super-heróis de desigual desempenho está levando os estúdios a reavaliarem as franquias comix.

Robert Downey Jr, Chris Hemsworth e Scarlett Johansson na D23 Expo

Mesmo assim, os fãs aplaudiram entusiasmadamente os grandes anúncios do fim de semana:

  • O elenco completo de Os Vingadores, mais quatro minutos de cenas do filme que tem estréia marcada para 4 de maio de 2012 no mundo todo.
  • As novas produções da Pixar e da Disney Animation : Planes, filhote da franquia Cars, com Jon Cryer (2 ½ Men) dublando o protagonista; Wreck It Ralph, que tem as vozes de Sarah Silverman, Jane Lynch e John C.Reilly; Monsters University, prequel de Monsters; e, mais importante, dois longas de animação ainda sem título, um sobre o dinossauros e outro sobre o cérebro humano.
  • A versão longa do curta stop-motion Frankenweenie, de Tim Burton, com a assinatura do mestre (para outubro de 2012)
  • Dois longas de fantasia que tem ao mesmo tempo promessas e problemas: Oz The Great and Powerful, dirigido por Sam Raimi, traz James Franco como o Mago que acaba se instalando em Oz  tornando-se o centro do clássico O Mágico de Oz, de 1939 (promessa: expandir a visão de um mega-clássico; problema: é possível?); e John Carter, adaptação de  um livro de Edgar Rice Burroughs sobre um veterano da Guerra Civil que tem uma vida paralela em Marte, planeta verdejante habitado por nativos de quatro metros de altura, verdes da cabeça aos pés (promessa: um sci fi diferente do que temos visto ultimamente; problema: Avatar? – mas pontos extras para o trailer ao som de “My Body is  A Cage”, do Arcade Fire, cantado por Peter Gabriel)

Ao mesmo tempo, várias perguntas importantes ficaram sem resposta. Por exemplo: a animação tradicional vai voltar ou esté encerrada de vez? Tron Legacy continua ou não? O que são os “Projetos Sem Título” da Marvel para 2014? E por andam Zorro/O Cavaleiro Solitário e Tonto _ o projeto foi cancelado mesmo?

Enfim_ os tempos não estão fáceis nem para um mega- super- conglomerado de entretenimento…

 


Por que os macacos ainda nos fascinam?
Comentários Comente

Ana Maria Bahiana

 

Os anos 1960 foram importantes para os grandes símios. Em 1963 o francês Pierre Boulle, um ex-soldado e ex-agente secreto dos aliados na Ásia durante a Segunda Guerra Mundial que se tornara autor de sucesso  em 1952 com o livro A Ponte do Rio Kwai (transformado em filme ganhador do Oscar em 1957) lançou uma obra de ”ficção científica clássica, repleta de suspense e inteligência satírica”(segundo um crítico) : La Planete des Singes ou, no título da primeira tradução em inglês, Monkey Planet.

4 anos depois outro autor europeu, o zoólogo e antropólogo inglês Desmond Morris, lançou um dos maiores best sellers da década, O Macaco Nu, uma popularização das diversas teorias que aproximavam seres humanos e seus primos primatas.

Ao mesmo tempo, vários centros de pesquisa desenvolviam programas para estudar as funções cerebrais dos símios, especialmente os chimpanzés. Os dois mais bem sucedidos, da Universidade de Columbia em Nova York e da Universidade de Nevada em Reno, envolviam a criação de dois chimpanzés – o macho Nim e a fêmea Washoe, respectivamente – em ambientes humanos, com o objetivo de “evoluir” seu potencial cognitivo  e de comunicação. Washoe foi o primeiro primata a usar a lingugem de gestos para se comunicar, e Nim  atingiu níveis ainda mais altos. Ambos, contudo, sofreram muito – Nim morreu aos 26 anos de um ataque do coração, como uma pessoa estressada e angustiada. Sua história pode ser vista no excelente documentário Project Nim.

Mas antes de tudo isso havia o chimpanzé Oliver, apresentado em circos e parques de diversão, desde 1960, como o “macaco humano”. Oliver tinha o hábito de andar apenas em duas patas, era extremamente inteligente e demonstrava preferência por mulheres e não fêmeas de sua espécie.

É interessante manter esse pano de fundo na cabeça quando se pensa em O Planeta dos Macacos, o primeiro filme a adaptar o livro de Pierre Boulle e um dos grandes sucessos de 1968 . Um sucesso tão imenso que gerou várias continuações (todas inferiores ao primeiro), uma série de TV , quadrinhos e uma tentativa de reboot em 2001, com Tim Burton. Numa era de imensas transformações – os anos 1960 – não eram tanto os símios que nos interessavam, era o mistério de nossa própria humanidade – o que ela tinha de específico, o que ela tinha de adquirido, o que ela tinha de imprevisível- que nos intrigava.

Numa era de mudanças ainda maiores – a segunda década do século 21- voltamos ao mito dos macacos pensantes trazendo, agora, novas inquietações. O preço de nossa irresponsabilidade com o meio ambiente –raiz do “suspense e inteligëncia satírica” do livro original- está muito mais claro e urgente. Nossa nova fronteira cognitiva somos nós mesmos: como ampliar nosso cérebro, como impedir seu envelhecimento. O pano de fundo tornou-se mais complexo e por isso o novo Planeta dos Macacos- A Origem (estréia mundial hoje)  consegue ter o mesmo impacto que o primeiro gerou, 43 anos atrás: porque coloca a questão de novo, numa linguagem que nós, os passageiros do século 21, entendemos perfeitamente: o que nos faz humanos? e que responsabilidade carregamos juntamente com essa humanidade?

Tenho grande admiração pelos filmes de puro entretenimento que usam plenamente a capacidade metafórica do cinema. Planeta dos Macacos-A Origem é exatamente assim, o drama de Frankenstein – criatura X criador, o terror da responsabilidade  traída – realizado na era digital, onde o imenso talento da Weta e de um grupo atores liderado por Andy Serkis, é capaz de colocar o humano literalmente dentro do símio.

Vejam – é o melhor filme da temporada pipoca 2011.

 


Na saída de Frank Darabont, o outro lado do paraíso criativo da TV
Comentários Comente

Ana Maria Bahiana

Por que Frank Darabont saiu de The Walking Dead? Por que abandonou a série que vem desenvolvendo há tantos anos, agora que conseguiu tudo o que queria _ sucesso de público e crítica, segunda temporada emplacada com 13 episódios, série líder em audiência no canal?

Vai demorar para conhecermos todos os motivos, e Darabont possivelmente é o único que realmente sabe. Mas uma possibilidade real, que se comenta aqui em LA, é que Darabont, ao contrário de outro responsável por um grande sucesso da AMC – Matthew Weiner, de Mad Men – vem do cinema. Sua única passagem anterior pela telinha foi a direção de alguns episódios de The Wire _ uma experiência bastante diferente da responsabilidade e estresse de um showrunner.

Teria sido essa diferença no estilo de fazer as coisas que levou Darabont a demitir todos os roteiristas, no final da primeira temporada?

O processo de criar uma série de TV difere bastante do de um filme, exigindo uma produção veloz, em massa, de roteiros. O showrunner precisa ter uma mistura exata de pulso – para manter intacta sua visão, o conceito da série – e confiança – para permitir que a equipe produza com facilidade, adicionando seu talento à “bíblia” da série, a coleção de perfis e elementos narrativos que compõem seu coração.

Scorsese não parece estar tendo problema algum com Boardwalk Empire, mas Scorsese, como produtor executivo, tem uma relação mais distante com a série, com o experiente Terence Winter (The Sopranos) atuando como showrunner.

Um segundo elemento do dilema pode ser a pressão vinda de cima, em duas frentes: conceitual e financeira.

Na véspera da estreia, ano passado, Darabont se desmanchava em elogios, aqui mesmo no blog, em cima da liberdade criativa que estava recebendo. Mas naquele momento a série era uma incógnita, seu risco maior era existir.

Uma segunda temporada é outra conversa. Há que segurar o público inicial, e há que expandi-lo. Já se comentava há algum tempo que Darabont não estava aceitando os comentários e recomendações dos executivos da AMC para as tramas da nova temporada. Aqui mesmo no blog Darabont mencionou o quanto ele gostaria de incluir The Governor na adaptação dos quadrinhos de Robert Kikman para a telinha. Em várias apresentações para diversas plateias –da Comic Con à Associação de Críticos de TV, esta semana – os chefões da AMC enfatizaram que o Governor não seria “de modo algum” um personagem da série e que, de comum acordo com Kirkman, Walking Dead começaria, a partir de outubro, a “divergir do material dos quadrinhos.”

E ainda há a questão financeira. A TV é um grande refúgio para a criatividade porque não tem as exigencias de grande retorno, imensas bilheterias num final de semana. Mas também trabalha com orçamentos menores.

Isso, para começar. Para culminar, a Cablevision, nave-mãe da AMC, acaba de criar uma divisão só para seus canais:  AMC, IFC, WE e Sundance Channel. O objetivo da recém criada AMC Networks é, obviamente, achar um comprador com bolsos bem abastecidos. Para isso, além de sucessos, há que se mostrar saudávels planilhas de custos e retornos. E um modo certeiro de aumentar os retornos é diminuir os custos…. Lembram da briga entre Weiner e a AMC, meses atrás? Era exatamente por conta disso: cortes de orçamentos que poderiam afetar a qualidade da série…

De todo modo, The Walking Dead já tem um novo showrunner: Glen Mazzara, segundo no comando da série até agora, e calejado homem de TV. Agora, só esperando para ver…

 

 


< Anterior | Voltar à página inicial | Próximo>