Blog da Ana Maria Bahiana

Arquivo : julho 2011

Uma festa para caubóis, índios e ETs
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Ana Maria Bahiana

 

Aviso aos leitores mais sensíveis: o TÍTULO DO FILME é Cowboys & Aliens. Portanto, dizer que a trama inclui o aparecimento de aliens NÃO É SPOILER, certo?

Com esta questão devidamente esclarecida, vamos ao que interessa: não tenham receio de Cowboys & Aliens. É um delicioso filme-pipoca, bem concebido, planejado e executado, com  um coração que é alegria pura, tesão pelas possibilidades de encantamento do cinema e muito respeito pelos westerns.

Confesso: Não era absolutamente o que eu esperava. Acompanho este projeto há algum tempo, e a alta rotatividade de roteiristas – seis estão listados nos créditos- me fazia antecipar um desses filmes-por-comitê , tão comuns na temporada-pipoca, que no final não tem gosto nem cara de nada.

Certo, a história tem quase nada a  ver com a graphic novel do mesmo nome mas, na verdade, nem filme nem graphic novel tem as origens que se espera.

 

Antes que os dois –filme e graphic novel- existissem, existia o empresário Scott Mitchell Rosenberg, fã de quadrinhos e astuto homem de negócios. Nos anos 90, inspirado por um cartum da série The Far Side, Rosenberg registrou a marca Cowboys & Aliens e se pôs a vender o conceito – antes mesmo que houvesse algum produto baseado nele. Acabou na capa da Variety, depois de vender o pitch para a Universal por 500 mil dólares.

Quando, cinco anos depois, o filme prometido no acordo ainda não tinha se materializado, Rosenberg começou a pensar em seguir a ordem natural das coisas e criar uma graphic novel. Alguns times e mais cinco anos depois Cowboys & Aliens chegou às livrarias em 2006 com a assinatura de Rosenberg, Fred Van Lente e o brasileiro Luciano Lima no traço.

A complicada história de Cowboys & Aliens talvez ajude a entender por que o filme sobreviveu ao distanciamento da graphic novel e às muitas versões do roteiro_ porque ele é em primeiro lugar um conceito, flutuando no espaço da industria de entretenimento como… hum… uma nave alienígena em busca de pouso. Ou encarnação.

E esta encarnação do conceito, escrita por um bando de gente (boa, felizmente: entre outros Damon Lindelof, Roberto Orci, Alex Kurtzman,  Mark Fergus, com créditos que incluem Fringe, Lost, Alias, Homem de Ferro e Filhos da Esperança), funcionou. Caubóis, índios e ETs misturam-se harmonicamente numa trama que diverte e, ao mesmo tempo, faz referência aos cânones do western, adicionando uma pitada de tempero.

Nesta iteração do conceito, o herói (Daniel Craig, cuja semelhança com um Yul Brynner com cabelo não é coincidência) é lacônico como os pistoleiros-ícones de Clint Eastwood;  o anti-herói (Harrison Ford, agregando toda a sua carga pessoal de heróis passados) é um barão do gado que poderia estar num filme de John Ford; a paisagem é o imponente deserto do sudoeste, a porta do bar balança, há uma briga sobre o balcão, um tiroteio na rua principal, e chapéus são muito importantes.

Mas o mais divertido é como os ETs se incorporam a esse universo ,e como o seus signos – as naves, armas, abduções, objetivos – se encaixam no mundo do oeste norte-americano  de meados do século 19, quando ouro e prata substituíam o gado como impulso para a expansão, pequenas cidades nasciam aparentemente do nada e havia um vago esboço de lei e ordem.

E como este é um western escrito em parte pela turma de Lost e Fringe, os índios tem um papel importante – afinal, existem pinturas nas cavernas do Novo México que parecem mostrar seres gigantescos com capacetes. E este deve ser o único filme em que uma viagem xamânica em busca de um animal de poder se incorpora naturalmente a uma narrativa sobre ladrões, xerifes e seres malévolos de outro planeta.

Mais não digo – aí sim seria spoiler. Jon Favreau  (Homem de Ferro 1 e 2) mantem o ritmo animado mas não frenético, os efeitos convencem, o elenco de apoio é sólido, o som é impecável e, felizmente, ninguém tomou a decisão desastrada de enfiar um 3D furreca sobre a linda fotografia de Matthew Libatique.

 

Cowboys & Aliens estréia nesta sexta, dia 29, nos EUA, e dia 9 de setembro no Brasil.

 


A pré-corrida do ouro, parte III: estrangeiros, animação e o saldo do primeiro semestre
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Ana Maria Bahiana

 

O que falta no balaio dos candidatos a candidatos a prêmios na temporada ouro?

Ryan Gosling em Drive

 

Para começar, algumas incógnitas : Contágio, de Steve Soderbergh (setembro nos EUA,; outubro no Brasil) e Drive, de Nicolas Winding Refn (setembro nos EUA, sem data no Brasil) , tem fôlego para prêmios? ;  Inquietos (Restless), de Gus Van Sant, ( setembro nos EUA; outubro no Brasil) será cabeça demais para ser lembrado?; o que vai acontecer com Melancolia (agosto no Brasil, novembro nos EUA), depois que Lars Von Trier desatou a dizer besteira?; e o duelo das divas diretoras – Madonna com W. E., (dezembro nos EUA) e Angelina Jolie, com In The Land of Blood and Honey (dezembro nos EUA)- no que vai dar?

Depois, os filmes estrangeiros. Para estes, existem dois caminhos _ serem escolhidos por seus países para representá-los nas categorias Filme Estrangeiro dos prêmios (como Grécia e Polônia já fizeram) ou se arriscarem na grande arena dos lançamentos no mercado norte-americano o que, automaticamente, qualifica qualquer filme para concorrer aos principais troféus.

O francês L’Artiste (novembro nos EUA, sem data no Brasil) é, neste momento, o líder nesta sub-categoria de filmes não americanos com força (e campanhas) capazes de transformá-los em competidores com os anglófonos. Uma vantagem: é mudo. Outra vantagem: é uma deliciosa, poética homenagem à alvorada de Hollywood. Mais uma vantagem: é distribuído pela Weisntein Company. Quem será seu rival? Talvez La piel que habito (setembro no Brasil, outubro nos EUA), Almodovar ingressando pelo thriller de terror, uma linguagem que acadêmicos e companhia podem compreender.

Resta olhar para o que já entrou em cartaz até agora e estimar quem tem fôlego para uma arrancada na reta final de novembro-dezembro-janeiro. Na encolha, Árvore da Vida (Tree of Life, maio nos EUA,  agosto no Brasil), de Terrence Malick, vem sendo exibido e re-exibido para grupos profissionais aqui em Los Angeles e em Nova York. Lírico, altamente pessoal, poético e, às vezes, exasperante, Árvore da Vida pode ser um favorito ou um azarão na temporada ouro.

 


Meia Noite em Paris (Midnight in Paris, maio nos EUA, junho no Brasil) é a grande unanimidade da safra do primeiro semestre. Não apenas foi (merecidamente) elogiado pela crítica mas tornou-se o maior sucesso comercial dos  últimos 25 anos da carreira de Woody Allen. É um duplo triunfo que não passa despercebido pelos votantes.

 

A outra unanimidade do primeiro semestre foi o independente  (Focus) Beginners (junho nos EUA, sem data no Brasil). Segundo filme de Milke Mills (Thumbsucker, vários videoclipes), Beginners é uma exploração autobiográfica das relações entre pais e filhos – complicada, no caso de Mills, pela revelação, depois da morte da mãe, de que seu pai era e sempre tinha sido gay. Uma indicação para Christopher Plummer (o pai) é mais do que provável, mas eu gostaria de ver o sempre excelente e sempre esquecido Ewan McGregor  (o filho) ser nomeado, também.

O primeiro semestre viu dois filmões-pipoca que podem, sim, ir para a briga no final do ano: Super 8 e Harry Potter e as Reliquias da Morte II. O primeiro seria o reconhecimento do valor do cinemão comercial norte americano da geração Goonies; o segundo seria a última oportunidade para saudar todo o extraordinário ciclo de adaptações da obra de J.K. Rowling, seu elenco, diretores e equipe.

E, finalmente, animação? Seria este o primeiro ano sem Disney ou Pixar entre os indicados? Até agora os dois favoritos pertencem respectivamente à Paramount – Rango, de Gore Verbinski – e 20th Century Fox – Rio, de Carlos Saldanha. Agora é ver as chances de Happy Feet 2 , Arthur Christmas (da Aardvark) e Gato de Botas neste combate…


A pré-corrida do ouro, parte II: independents day
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Ana Maria Bahiana

Se formos julgar pelos últimos anos quem realmente dá as cartas e impõe o ritmo da Temporada Ouro são os independentes. Principalmente os chamados independentes-de-luxo, as divisões especializadas dos estúdios que trabalham com orçamentos baixos, levantam financiamento no exterior e realizam projetos de autor. Olhem os últimos vencedores do Oscar: nos últimos cinco anos, todos eles vieram de independentes de luxo. E mesmo Os Infiltrados, de 2007, foi realizado por um produtor independente de vastos recursos, Graham King; a Warner levou a láurea, mas entrou na festa lá pelo meio.

Este é um fato que dá muita dor de cotovelo à Academia, onde a maioria dos integrantes sonha com triunfos como os de Titanic, filmão de estudião levando um monte de estatuetas. E que revela um paradoxo interessante: parte substancial dos acadêmicos passa o ano fazendo um tipo de filme e, na hora de escolher, vota em outro tipo…

Por essas e outras é essencial acompanhar as escolhas dos independentes. Mais até que os grandes estúdios os independentes-de-luxo passam o pente fino em suas aquisições e produções, e pré-selecionam para o segundo semestre os títulos com mais chances de cair no gosto dos votantes. Grandes estúdios tem bolsos fundos e podem se dar ao luxo de gastar dinheiro até com filmes sem chance, apenas para agradar estrelas, diretores e produtores. Independentes, não: orçamentos restritos obrigam a uma seleção rigorosa, e só vai pro fogo do segundo semestre quem tem alguma chance de emplacar alguma coisa.

Eis como está o panorama indie:

A Fox Searchlight deu uma sorte danada em 2009 quando repescou Quem Quer Ser um Milionário das ruínas da falecida Warner Independent e levou-o até os Oscars. Este ano ela está colocando suas fichas do segundo semestre em  The Descendants (dezembro nos EUA, janeiro no Brasil). É um roteiro delicioso que tive o privilégio de ler, adaptando o livro de Kaui Hart Hemmings sobre um havaiano ha’ole (branco) em crise de meia idade. George Clooney lidera um ótimo elenco e o sempre bom Alexander Payne  (Sideways-Entre Umas e Outras,  As Confissões de Schmidt) dirige.  Bom pedigree.

A vitória de O Discurso do Rei, este ano, deu novo alento à Weinstein Company, que passava por apuros sérios. Os apertos financeiros continuam, mas Harvey Weinstein mostrou que não esqueceu seu talento de estrategista. O abre-alas da WC este ano é, sem dívida, The Iron Lady (dezembro nos EUA, sem data no Brasil), a cinebio da primeira e única Primeira Ministra da Grã Bretanha, Margareth Thatcher. Meryl Streep se dissolve na Dama de Ferro com o tipo de transfiguração que platéias e votantes adoram. Mais questionável é a diretora Phyllida Lloyd, cuja obra anterior é o felizmente esquecido Mamma Mia!

O segundo título da WC para o final do ano é outra aposta em anglofilia e interpretações carismáticas: My Week With Marilyn (novembro nos EUA, sem data no Brasil), a narrativa das tensas filmagens de O Príncipe Encantado, na Londres de 1957. Michelle Williams é Marilyn , Kenneth Branagh é Laurence Olivier e o diretor, Simon Curtis, vem da TV…. Como Tom Hooper…

A Sony Classics, veterana da corrida do ouro, tem  três apostas fortes para o páreo 2011. A primeira é Carnage (novembro nos EUA, sem data no Brasil) adaptação de Roman Polanski para a peça God of Carnage, sucesso de Paris a Londres, Nova York e Los Angeles). Como a peça, o filme é uma obra de câmara para quatro atores – Kate Winslet, Jodie Foster, John C. Reilly e Christoph Waltz – no papel de dois casais que resolvem conversar cordialmente sobre um incidente entre seus filhos…. Até , como em Em Quem Medo de Virginia Woolf, reverterem a um estado pré-civilização.

O outro peso-pesado da SC é A Dangerous Method (novembro nos EUA e no Brasil), com David Cronenberg analisando a relação entre Sigmund Freud (Viggo Mortensen) e Carl Jung (Michael Fassbender).

Michael Shannon e a onipresente Jessica Chastain estão no terceiro filme da SC, Take Shelter (setembro nos EUA, sem data no Brasil), um estudo de personagem que fez sucesso em Sundance e Cannes, sobre um pacato pai de familia que pode (ou não) estar enlouquecendo.

Outros independentes tem títulos de peso. A Roadside Attractions vem com Albert Nobbs (ainda sem data nos EUA e no Brasil), com Glenn Close repetindo o tour-de-force que lhe valeu prêmios no teatro: uma mulher que se faz passar por homem na Irlanda do século 19. Rodrigo Garcia dirige e o resto do elenco é de responsabilidade: Jonathan Rhys Meyers, Mia Wasikowska, Brendan Gleeson.

A Focus Features espera que a Academia reacenda seu amor por Colin Forth com O Espião Que Sabia Demais (Tinker Taylor Soldier Spy, novembro nos EUA, janeiro no Brasil), a adaptação de Tomas Alfredson (Deixe Ela Entrar) para a semi biografia dos primeiros anos de Ian Fleming, o homem que inventou James Bond, por John  Le Carré.

A Lionsgate aposta em outro sucesso de Cannes, Coriolanus (dezembro nos EUA, sem data no Brasil): Ralph Fiennes é o general renegado de Shakespeare e o diretor desta atualização da peça, transposta para um universo extremamente contemporâneo de mercenários e guerras lucrativas. Elenco de primeira: além de Fiennes, Gerard Butler, Brian Cox, Vanessa Redgrave e a onipresente Jessica Chastain.

Na parte III e final da nossa aventura, um apanhado dos filmes do primeiro semestre que podem chegar até a reta final.

 


Alegrias e mistérios dos Emmys 2011
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Ana Maria Bahiana

Peter Dinklage em Game of Thrones

 

Interrompo brevemente a sequencia de posts sobre os candidatos a indicados (nos próximos: os independentes e os filmes do primeiro semestre) para comentar as indicações para os Emmys, anunciadas hoje.

Para entender (ou tentar entender) algumas indicações e alguns desaparecimentos, é bom explicar um detalhe importante no modo como os Emmys são escolhidos: ao contrário dos Globos, que levam em consideração toda a temporada de uma série ou mini-série, os Emmys  baseiam suas escolhas em episódios específicos, que são submetidos pelos produtores  aos mais de 15 mil votantes. Eu, pessoalmente, sempre achei o sistema estranhíssimo, uma adaptação não muito adequada das normas da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. Um filme se expressa no espaço contido de seu tempo de tela. Um título de TV frequente se expressa ao longo de vários episódios, uma qualidade que a torna mais semelhante aos folhetins da literatura ou aos “serials” da primeira metade do século 20, com seus longos arcos de trama e a possibilidade de desenvolver personagens e situações ao longo de um tempo maior.

Com essa explicação, é possível pelo menos achar uma desculpa para a mini-série The Kennedys, bastante tosca, ter recebido quatro indicações, inclusive para melhor mini-série; Glee ter ocupado um espaço que poderia ter ido, com mais equilibrio, para Community (Gwyneth Paltrow por Glee? Jura?!! E nada de John Noble por Fringe? Mesmo?!) ; a falta de Nick Offerman (Parks and Recreation) ou mais gente de Mad Men. The Killing e Game of Thrones entre os atores e atrizes indicados;o  sumiço absurdo de Breaking Bad e a Bryan Cranston . (Ok, esta temporada não era elegível por questão de datas. Mas fica registrada minha indignação, de todo modo…) E a aparição da inacreditavelmente cafona The Pillars of the Earth entre as mini-séries só pode ser explicada pela idade avançada da média dos votantes da Academia de TV…

Agora vamos ao que gostei: a merecida lavada da HBO, com mais uma safra espetacular _ Mildred Pierce, Game of Thrones, Boardwalk Empire, Too Big to Fail, His Way, Cinema Verité. Terem destacado Peter Dinklage em Thrones, e registrado Mireille Enos por The Killing, Elizabeth Moss por Mad Men, Kate Winslet por Mildred Pierce, Katy Bates for Harry’s Law, e Cloris Leachman por Raising Hope.  A inclusão de Downton Abbey, uma perfeita gema do melhor da produção britânica tradicional.

E vocês, o que acharam?

 


A pré-corrida do ouro já começou: quem está no páreo para os prêmios 2011-2012, parte I
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Ana Maria Bahiana

Muito cedo para falar de temporada de prêmios? Não mesmo. A calmaria que reina sobre Los Angeles – crianças de férias, turistas pelas ruas de Beverly Hills, engarrafamento de ónibus de excursão – esconde uma atividade frenética: as primeiras movimentações que vão determinar quem está dentro ou fora da corrida do ouro 2011-2012.

De um lado, a Academia, que já anunciou as mudanças de regras para esta temporada, ungiu uma nova leva de integrantes e elegeu os diretores dos departamentos para  o próximo biênio. Todas medidas fundamentais para estabelecer o perfil de quem vai votar _ e como vai votar.

A preocupação com o a festa também está fervendo neste caldeirão oculto. O fiasco do ano passado ainda está muito presente na lembrança e na mídia, especialmente depois da entrevista de James Franco na Playboy norte americana deste mes, chamando os textos do evento “sem graça” e sua  própria atuação como “restrita, aprisionada pelos textos”.

Sim, Oprah Winfrey está no topo da lista dos candidatos a apresentador de 2012, e muita gente na indústria acha que seria a escolha certa, trazendo ao mesmo tempo classe e popularidade ao evento, e, possivelmente, aumentando sua audiência … e dando uma força à nova rede de TV de Oprah que, conta-se, quer transmitir com exclusividade os bastidores da festa, em troca da presença de sua fundadora/CEO na frente das câmeras.

Algumas das decisões mais importantes, contudo, estão sendo tomadas em ambientes menos glamourosos: as salas de reunião dos departamentos de marketing e distribuição dos estúdios e independentes. Eis a verdade dos prêmios: por mais que, individualmente, os votantes possam querer,em sua opinião pessoal, peneirar os melhores do ano, o voto médio será sempre influenciado pelo modo como os títulos são apresentados ao mercado. É um processo de pré-seleção que fica nas mãos dos distribuidores e produtores, e começa com a decisão de quais filmes merecem a (custosa) atenção extra que pode posicioná-los “para sua consideração”.

O primeiro passo dessa estratégia é determinar quando o filme será lançado. Só de olhar o calendário do segundo semestre já é possível fazer especulações razoavelmente informadas sobre quem está em campo, pelo menos.

Na primeira parte deste levantamento de quem está no listão da temporada-ouro 2011-2012 vamos ver quem, entre os lançamentos do segundo semestre, os grandes estúdios pré-escolheram para entrar na disputa:

The Help ( agosto nos EUA, entre setembro e novembro internacionalmente) Há um mês a Disney vem trabalhando incansavelmente este filme, adaptação do best seller de Kathryn Stockett sobre a vida diária no sul dos Estados Unidos durante a campanha pelos direitos civis. A aposta é menos no diretor de primeira viagem, Tate Taylor, e mais no conjunto de elenco, onde despontam Emma Stone, Jessica Chastain, Viola Davis, Mary Steenburgen, Octavia Spencer, Cicely Tyson e Sissy Spacek.

Anonymous (outubro nos EUA e no Brasil). A Columbia espera que os nomes “Roland Emmerich” e “Shakespeare” não se excluam mutuamente neste intrigante lançamento. O mestre dos arrasa-quarteirões apocalípticos explora a teoria de que “Shakespeare” seria meramente um pseudônimo, e o estúdio saliva com o elenco britânico e as possibilidades da anglofilia dos prêmios _ David Thewlis, Rhys Ifahns, Vanessa Redgrave (como a Rainha Elizabeth) e Joely Richardson.

J. Edgar (outubro nos EUA, janeiro no Brasil). Se você perguntar a qualquer pessoa do meio qual é o filme que ninguém viu mas é o favorito da temporada ouro, este título vai aparecer em 9 de 10 respostas. O pedigree é impecável: Clint Eastwood na direção, roteiro de Dustin Lance Black (Milk) , Leonardo di Caprio como J. Edgar Hoover, o complicado e controvertido criador do FBI. É a grande aposta da Warner neste segundo semestre.

The Ides of March (outubro nos EUA e no Brasil) O fracasso de um astro (Tom Hanks) comod diretor pode ser um mau presságio para o novo filme de outro astro – George Clooney- como diretor. Mas a Sony está posicionando esta comédia dramática sobre a perda da inocência como uma possibilidade de indicações, nem que seja apenas para o elenco de notáveis: Ryan Gosling, Paul Giamatti e o próprio Clooney.

Hugo Cabret (Hugo,  novembro nos EUA, janeiro no Brasil) Prestem atenção nesta dobradinha de datas – segundo semestre aqui, janeiro no Brasil. Isso é  sinal claro de que o estúdio – no caso, a Paramount- acredita firmemente que o filme vai para as cabeças. A estréia de Martin Scorsese no 3D é um dos mais aguerridos representantes do gênero fantástico na disputa deste ano (sim, Harry Potter e as Relíquias da Morte II é outro…)

Homens Que Não Amavam as Mulheres (The Girl With the Dragon Tattoo, dezembro nos EUA, janeiro no Brasil) A Sony vem elaborando cuidadosamente a campanha desta refeitura do filme sueco com a griffe vitoriosa de David Fincher. E a possibilidade de um filme comercial com credenciais para prêmios faz estúdio e Academia babarem. Meryl, Glenn, olho em Rooney Mara…

As Aventuras de Tintin: O Segredo do Licorne (The Adventures of Tintin: The Secret of the Unicorn, novembro no Brasil, dezembro nos EUA) A Paramount, que tem os direitos de distribuição nos EUA, acredita que Steven Spielberg pode concorrer consigo mesmo e levar alguma coisa do ouro. A Sony, que distribui Tintin internacionalmente, aposta mais no impacto do filme entre os fãs dos quadrinhos de Hergé.

Young Adult (ainda sem data) Será que a dupla Jason Reitman/Diablo Cody emplaca de novo? A Paramount está estudando as possibilidades antes de tentar um repeteco de Juno com esta comédia romântico-dramática estrelada por Charlize Theron e Patrick Wilson.

We Bought a Zoo (dezembro nos EUA e no Brasil) Será que Cameron Crowe recuperou seu mojo? A Fox sonha com o retorno do toque de midas que levou Jerry Maguire, uma raridade – uma comédia romântico-esportiva – aos prêmios em 1996.

War Horse (dezembro nos EUA, janeiro no Brasil) A peça é um sucesso estrondoso; Spielberg volta ao drama de guerra; a Disney precisa desesperadamente de prestígio e impacto na temporada-ouro..

Extremely Loud and Incredibly Close (dezembro nos EUA, sem data no Brasil) O prestígio do aclamado livro de Jonathan Safran Foer, a temática que mistura elementos de realismo mágico com o trauma do 11 de setembro, o elenco liderado por Tom Hanks e Sandra Bullock e a direção de Stephen Daldry garantem o peso que Paramount/Warner (co-distribuidoras) estão dando a este lançamento e campanha.

Moneyball ( setembro nos EUA,  novembro no Brasil) _ Filmes de esporte não costumam “viajar” bem, mas a Columbia está mais preocupada em emplacar com votantes e críticos norte-americanos  esta cinebio de Billy Beane, o cartola do time de beisebol Oakland As que trouxe os computadores para o esporte. O fato de Brad Pitt estar encabeçando o elenco faz a Columbia  sonhar com um Blindside só seu.

No próximo post, os independentes  – simples e de luxo – com esperanças de ouro.

 


No adeus de Harry Potter, o poder da vida e a magia do cinema
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Ana Maria Bahiana

 

 

A morte e os mortos tem um papel de destaque no derradeiro Harry Potter, parte II do último livro da saga concebida por J.K.Rowling, Harry Potter e as Reliquias da Morte. É um tema apropriado para o fim de um ciclo, a jornada de  mais de uma década de um herói que influenciou e povoou os sonhos de uma geração.

Como algumas gerações anteriores – as que cresceram à sombra do ciclo O Senhor dos Anéis, de J.R.R. Tolkien, obra que com certeza é uma influência no trabalho de Rowling – os contemporâneos da jornada de Harry foram levados a debater a importância das escolhas individuais, o sentido da amizade e da lealdade e, em última análise, a natureza do bem e do mal. Como Frodo em Senhor dos Anéis, Harry não é excepcionalmente forte, inteligente ou poderoso _ seu destino foi selado pela mão do acaso, e sua natureza heróica deve ser provada ou rejeitada pelas opções que fará nas encruzilhadas de sua trajetória. E, como Frodo, seu chamado não é para obter algo, mas para destrui-lo: a recusa de um tipo de poder para que se possa, amplamente, abraçar seu avesso.

Todos esses temas estão expressos e sintetizados em Harry Potter e As Relíquias da Morte – parte II, fecho perfeito para o ciclo de  oito filmes que, consistentemente, adaptou a obra de Rowling para a tela. Alguns foram melhores que outros,  mas mesmo o primeiro, Harry Potter e a Pedra Filosofal, que hoje parece ainda mais tosco, tem o mérito de ter escalado, brilhantemente, o elenco essencial que deu corpo a Harry, Ron, Hermione, seus colegas, adversários e mestres.

Reliquias II pode ser lembrado como um dos melhores. Mais uma vez, fãs do texto de Rowling podem estranhar as simplificações e liberdades que Steve Kloves –roteirista de sete dos oito filmes, escolhido pessoalmente pela autora – tomou com a obra. Mas é sempre bom repetir o mantra: livro é livro, filme é filme.

O essencial- o confronto entre Harry e Voldemort, que é, basicamente, o encontro de Harry com seu destino – precisa ser expressado visualmente dentro de um período limitado de tempo. Imagens e gestos precisam ser conjurados para concretizar o que, na página, são descrições e adjetivos.

Kloves e o diretor David Yates – que se desincumbiu bravamente dos quatro últimos títulos da série – ancoraram o episódio final de Harry Potter numa série de sequências de ação empolgantes, um contraste com o ritmo mais lento da primeira parte: a invasão das caixas fortes do banco Gringotts, o ataque a Hogwarts, o confronto final entre Harry e Voldemort.

O clima aqui é de urgência e resolução – com um poderoso interlúdio na estação de King’s Cross do metrô de Londres, perfeito em espírito e realização, que ilustra bem um outro ponte forte da série, a integração excepcional entre desenho de produção, fotografia e efeitos.

Este talvez seja o mais emotivo de todos os Harry Potters, provando o quanto vale a qualidade de um elenco de primeira linha, encabeçado por mestres como Alan Rickman (Severus Snape), Ralph Fiennes (Voldemort) e Michael Gambon (Dumbledore).

E no final estamos de volta a Hogwarts, encerrando um ciclo e começando outro, como a vida, que se estende sempre além da morte.

Precisava ter sido dividido em duas partes? Provavelmente não. Precisava ser em 3D? A não ser para espectadores que realmente apreciam cobras avançando em sua direção e objetos mágicos voando sobre as poltronas, não faz muita diferença. A magia de Harry Potter é obra de suas ideias e não de seus truques.

Harry Potter e as Reliquias da Morte Parte II teve pré-estreia  dia 7 na Grã Bretanha e entra em circuito mundial a partir de 14 de julho. Nos EUA e no Brasil,a estréia é dia 15 de julho.

 

 


Transformers X Tom Hanks: a batalha do 4 de julho
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Ana Maria Bahiana

 

4 de julho, o feriadão da independência norte-americana, é uma data muito importante no calendário hollywoodiano: é o auge da temporada-pipoca, o momento de ouro para lançar arrasa-quarteirões.Por isso mesmo é também um dos fins de semana mais concorridos – senão O mais concorrido – do ano, o campo de batalha onde se constroem reputações e se estabelecem tendencias.

Foi num 4 de julho há exatos 20 anos que James Cameron provou de uma vez por todas que era capaz de produzir mega-sucessos (Exterminador do Futuro 2, 31 milhões de dólares_ o que, em 1991, era um bocado de dinheiro). Foi em outro 4 de julho, cinco anos depois  que Roland Emmerich mostrou que vinha para fazer muita grana (Independence Day, mais de  50 milhões de dólares em 1996); e, seis anos atrás, Steven Spielberg demonstrou que ainda tinha mojo na área do super popular (Guerra dos Mundos, quase 65 milhões de dólares em 2005).

Nem sempre foi assim: na verdade, até 1975 e Tubarão, junho-julho era a época em que NÃO se lançavam filmes. A crença vigente era que ninguém ia ao cinema durante as férias de verão do hemisfério norte, preferindo praia, viagem e acampamento. Foi Lew Wasserman, presidente da Universal na época (e, por esse motivo guru de Spielberg durante toda a sua vida) que teve a sacada: um filme sobre um tubarão assassino tem muito mais chances de aterrorizar (e atrair) as pessoas se elas já estiverem pensando em praia e outros prazeres de verão. (Leiam o capítulo Nove: A Vingança do Nerd de Easy Riders, Raging Bulls, de Peter Biskind, onde esta saga é contada em detalhes).

Na verdade a analogia com Tubarão é apropriada para este momentoso 4 de julho de 2011: com todo o ruído de seus avanços tecnológicos, a indústria de cinema como um todo, na verdade, movimenta-se muito lentamentGrandes marcos de mudanças fundamentais no modo de conceber, fazer, distribuir e divulgar cinema são raros e espaçados _ e a invenção do blockbuster de  verão, entre 1975/Tubarão e 1977/Star Wars, Capitulo IV: Uma Nova Esperança, foi, por incrível que pareça, a mais recente. Levando em conta a evolução de gostos e tecnologia, os filmes-pipoca ainda são criados, feitos e vendidos do mesmo modo como eram em 1975.

Será que o 4 de julho de 2011 mostra, afinal, sinais de um desvio importante de curso? Talvez. Os indícios:

Um filme em que o conceito e os efeitos são importantes passou batido por um filme em que os atores são importantes. Dez anos atrás se alguem anunciasse um filme estrelado por Julia Roberts e Tom Hanks estreando no mesmo dia de qualquer outro sem Julia Roberts e Tom Hanks, ninguém na indústria pensaria duas vezes em quem seria o top do feriadão. Neste 4 de julho as criaturas CGI de Transformers 3 deram uma lavada em Larry Crowne, estrelado por Tom Hanks e Julia Roberts: 97 milhões de dólares do primeiro contra 13 milhões de dólares do segundo (isso só nos EUA; no mundo todo T3 está pra lá de 400 milhões de dólares de receita, em apenas quatro dias em cartaz). A goleada foi tamanha (T3 é, agora, o recordista do feriadão) que muita gente se perguntou se este feriado marcava o fim de mais uma era dominada por estrelas, e anunciava um novo período em que o conceito era o grande atrativo para o público.

Um filme em que o conceito e os efeitos são importantes recebeu críticas melhores que um filme sem efeitos, com atores e um diretor importantes. Larry Crowne foi escalado para o 4 de julho como uma opção de programação, visando o público mais velho, possivelmente desgostoso com o festival de porrada de Transformers 3. O previsível seria que T3 levasse uma surra da crítica,enquanto o filme “adulto”, encabeçado por dois ganhadores de Oscar (e dirigido por um deles, Hanks) ganhasse pelo menos o triunfo estético. Não foi o que aconteceu: T3 é uma pipocada divertida, seguindo a fórmula exata dos anteriores, e não decepciona porque não promete mais que isso; Larry Crowne é previsível e banal, decepcionando quem  esperava mais

O filme com grandes estrelas foi financiado independentemente. Cinco, dez anos atrás os nomes “Julia Roberts” e “Tom Hanks” seriam o suficiente para os estúdios abrirem as portas dos cofres. Mas para realizar Larry Crowne Hanks teve que usar recursos próprios, complementados por financiamento de terceiros, como qualquer independente. Os 195 milhões de dólares de T3 foram inteiramente cobertos pela Paramount/Dreamworks. “É incrível sequer pensar nisso, mas o filme de Tom Hanks é o pequeno filme independente”, me disse um escolado soldado da indústria. “Não há mais lugar para esse tipo de projeto na matemática dos estúdios.”

O 3D ganhou novo fôlego. Nas semanas anteriores ao 4 de julho Michael Bay fez um verdadeiro apostolado do 3D, comparecendo a eventos, dando palestras e entrevistas (muitas delas ao lado do messias do 3D, James Cameron) com o fervor de um recém-convertido à técnica. Não sei se foi o papo ou a qualidade da produção, mas a verdade é que T3 reverteu a tendência do ano, que vinha mostrando um declínio veloz do consumo de ingressos para salas 3D: 60% dos ingressos para o novo Transformers veio de exibições em 3D, trazendo nova energia para o segmento.

E vocês, o que acham?  A era das estrelas acabou mesmo? O 3D veio para ficar?

 

 


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